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Marca da Vontade

Capítulo 20 (Parte 1) – Dias Vazios

Capítulo 20 (Parte 1) – Dias Vazios

Sep 08, 2025

Um dia depois…

 

Tudo se tornou pesado. Fazia apenas dois dias que Aiyra havia presenciado o pior momento de sua breve vida. O fardo de reviver aquele instante, repetido incessantemente em sua mente, era ensurdecedor. Ela só encontrava um mínimo de paz ao se cobrir dos pés à cabeça no edredom, encolhida em posição fetal.

A verdade era que a sensação de impotência doía quando acontecia uma tragédia diante de seus olhos. No entanto, havia algo mais visceral, capaz de revirar o estômago de qualquer um: a culpa de estar plenamente envolvida a ela.

Não importava se a causa era negligência, uso indevido das palavras — como Aiyra pensava que era o caso — ou uma contribuição indireta que empurrasse alguém para o abismo. O que permanecia era a sensação de ser uma cumplice para além de sua própria dor, mas também a um buraco impreenchível no coletivo.

Raissa Buloke, sua melhor amiga, havia assassinado um líder religioso altamente influente que servia como uma referência para quem buscava ser melhor dia após dia. E não podia ignorar que a cacheada fora influenciada pelo pedido de socorro de Aiyra, feito quando decidiu ser egoísta.

No final das contas, parte da razão por não ter comido direito e ter faltado à escola no dia seguinte ao incidente era a falta de coragem de assumir um pecado que a consumiria pelo resto da vida. Aiyra sabia que havia terceirizado o ódio que sentia por si mesma, depositando-o sobre sua melhor amiga. Isso tornava a situação ainda mais drástica, porém, era inevitável sempre que a imagem voltava à mente.

Mesmo assim, estava tudo bem em perder apenas um dia de aula. Afinal, decidir por continuar a rotina com aquela fisionomia apática era tão útil quanto sua ausência. Até porque ninguém sabia do seu luto. Seu relacionamento com Gabriel era secreto. Logo, os colegas voltariam a vê-la com aquele ar de metida, concedido por suas roupas pretas que diziam sobre seu humor mesmo quando essa não fosse a intenção.

E, como se não bastasse, ainda havia o agravante dela ter sido amiga de duas figuras que se envolveram em controvérsias publicamente: Ivair com sua expulsão após o ataque a Paschoal Oslo e Raissa com o escândalo no Festival de Katharos. Obviamente, Aiyra não tinha culpa pelas amizades que escolheu, tampouco podia prever no que elas se envolveriam. Entretanto, sob a lógica enviesada de terceiros, a concepção construída era “se os dois não eram flor que se cheire, então a outra menina do trio também não é.”

O que era justificado por ser uma instituição que sempre foi renomada por evitar conflitos e manter sua imagem intacta. O próprio incidente com Ivair e seu irmão fora mantido em contenção, longe da mídia, para que a tempestade não respingasse no prestígio do Sandalismo. Só que, os alunos ainda comentavam o caso sem filtro algum, tanto que Aiyra notou certos olhares atravessados já nos dias seguintes à expulsão do amigo.

Havia uma única pessoa que não se importava com boatos, aquela que se aventurava a estender sua mão à pessoa mais julgada possível, pois o que verdadeiramente importava era quem era ela no presente. Essa característica levou Aiyra a regar um sentimento proibido que se expandiu como raízes de uma árvore inconveniente em uma via urbana. Porém, essa mesma pessoa, radiante como o sol de meio-dia, havia escurecido o mundinho de Aiyra.

Então, esse torrencial de tristeza alagava o interior da garota de olhos verdes, vazando em lágrimas pelos seus canais oculares já enfraquecidos, ocasionando um choro de agonia, baixinho, mas pior do que um berro de uma criança em sofrimento. Sofrendo por uma dor que não podia ser ignorada, por mais esforço que ela fizesse…

“Droga… Ela fez tudo isso para me proteger dele. Não é justo falar algo tão cruel para ela. Eu sou uma desgraçada sem rumo!”

Parte de sua autodepreciação vinha da noção interna de que, não importava o quão longe chegasse na construção de um laço, ele sempre seria partido de forma brutal. Sentia-se como a cobra do símbolo de Ouroboros, ou seja, tudo que vivia era uma ilusão para se convencer que não morderia seu próprio rabo, fosse com sua família adotiva, com Gabriel ou com seus amigos do primeiro ano do ensino médio.

Às vezes, pensava que tinha sido amaldiçoada pelos seus pais biológicos, ou até pior, que ela fosse considerada desde seu nascimento como um sinal de infortúnio, visto que a abandonaram em uma cesta próxima a uma região que estava sob ataque. Então, mesmo sem uma lógica muito aprofundada, devido ao provável desconhecimento de que havia um grupo de Nadius no local, a garota continuava se autossabotando. No final das contas, Aiyra seguia como uma refém dos “e se”.

“E se eu não tivesse aberto a merda da minha boca? Ele estava tão ferido pelas minhas duras palavras… Sempre estrago tudo que toco!”

— Me odeio, me odeio, me odeio, me odeio!!

Aiyra agarrou o lençol com as unhas, quase rasgando-o com tamanha brutalidade. Seus olhos permaneciam fechados durante todas essas reclamações. Pensava em si mesma como uma garota reclamona, mas achava que tinha o direito de se isolar depois de um choque tão grande.

— E-eu… eu queria que ele vivesse em paz dali para a frente, droga… Só queria ficar como era antes. Esquecida na chuva. Sozinha. Isso é tão injusto, inferno. Haaaaaaa!

Aquele grito rasgou sua garganta.

Ela não conseguia parar de se remexer na cama, ora tapando o rosto impulsivamente, ora agarrando os tecidos do lençol que fazia parte do ambiente mais confortável que poderia acessar — seu quarto. O mais doloroso daquelas palavras era o que as acompanhava. O belo rosto de Gabriel ainda era montado com precisão nas peças do quebra-cabeça de sua mente. Os olhos verdes-claros. A repartição de seu cabelo loiro. Sua pele clara banhada de suor enquanto sorria. Mas já não podia envolvê-lo em seus braços finos.

Mesmo que tudo isso fosse uma ilusão, devido à inconformidade que o levou a ameaçá-la, dando um soco na parede com toda força do mundo, tratando-a quase como os inimigos dele em suas batalhas pelas madrugadas, Aiyra permanecia com aquela hipótese em mente, pois a sequência de eventos foi ligeira demais para a própria conseguir computar minimamente.

Apesar de reforçar mentalmente que Raissa fez tudo aquilo para evitar uma agressão por parte do loiro, a imagem que Aiyra tinha dela naquele instante se aproximava mais de uma figura vilanesca e irracional do que a imagem de uma heroína imbatível, como naquele beco escuro perto da Ice Cherry.

“Não sei como eu reagiria com ela na minha frente. Mas, cacete, eu não consigo odiá-la totalmente! Haaaaaaa!”

Além disso, ela olhava com repulsa para seu próprio corpo, que reagia com saudade daquele abraço apertado, no qual teve a melhor noite de sono do último mês. Aquele calor ainda era perceptível. Odiava essa sensação mais do que tudo. Por isso, impôs um decreto a si mesma:

— Eu só não quero ver ninguém por um bom tempo nessa merda…

Só que, como uma ação inconveniente do destino, o desejo de Aiyra foi traído pela sua campainha, que subitamente tocou. Com um leve susto, a garota se arrepiou e posteriormente soltou um resmungo, irritada.

“Ah… Hoje não, por favor…”

Cobriu o corpo com um cobertor e ansiou para que a pessoa desistisse. Então, deixou tocassem quanto mais. Porém, não cessava.

“Caramba, não cansa! Não é possível que seja algum entregador, não pedi nada.”

Indagando-se mentalmente, teve a certeza de que, fosse quem fosse, a pessoa tocaria o dia todo sem parar. Logo, vencida pelo cansaço, saiu de seu casulo, lutando contra a forte gravidade que empurrava seu corpo para baixo. A razão daquela fraqueza era desconhecida, principalmente porque havia inúmeras possiblidades, como: tempo demais sem comer, falta de contato com o Sol, ou mais um sinal de que suas pernas não queriam caminhar rumo a novos horizontes. Uma parte dela havia morrido com seu ex-namorado.

Levantou-se mesmo contra sua vontade, arrastando-se até a porta do quarto. O corredor parecia mais curto do que realmente era. Assim, deu passos curtos, preparando-se para o impacto de uma eventual surpresa. Entretanto, quando vislumbrou o primeiro andar — sua sala — respirou fundo.

Era refém das suas memórias que a acorrentavam aos últimos momentos antes de tudo se tornar um completo pesadelo. Havia uma possibilidade que só veio à tona quando limpou a poeira em sua mente: a pessoa do outro lado da porta poderia ser Raissa Buloke.

Mas a realidade dos fatos era uma só. A garota não estava pronta para conter os impulsos de raiva ao rever aquele rosto adorável. Entendia os motivos, mas não tinha desenvolvido maturidade para fazer a mea-culpa daquelas ações. Sabia que estava sendo desagradável. Sabia que deveria parar com sua tempestade em copo d’água por alguém que provavelmente salvou sua vida.

Mesmo assim, era uma covarde, ingrata, que tinha selado sua alma no abismo.

O suor escorreu por seu pescoço enquanto partia rumo à porta da frente. Estendeu a mão até a maçaneta e começou a virá-la, com o medo estampado no rosto.

“Não seja, não seja, não seja, não seja…”

Tão importante quanto o Sol, que serve como uma fonte de energia e garante a estabilidade da Terra em orbita, é a Lua que estabiliza o eixo terrestre e move os oceanos, promovendo o equilíbrio costeiro que sustenta a maior parte da vida no planeta.

Dessa forma, ainda pela manhã, era como se Aiyra voltasse aos eixos ao ver dois olhos como pedras de amazonita, que ressaltavam ainda mais a beleza na pele âmbar-clara que o tornava reconhecível em qualquer ocasião.

— I-Iva-a…

— Oi, Aiyra. É seu delinquente favorito.

Aquele sorriso foi o suficiente para desmoronar as barreiras que a afastavam da saudade daqueles momentos que possivelmente não voltariam mais. Querendo ou não, o garoto transmitia um certo conforto para o coração da menina.

Aiyra, por sua vez, reagiu com um misto de melancolia e alívio, pois não conseguia esconder a falta que sentia da terceira integrante daquele trio.

Por isso, seu corpo permanecia imóvel, completamente assolada pela tristeza. Estava incapaz de qualquer ação.

Porém, comovido pela expressão atônita de sua querida amiga, o garoto decidiu consolá-la, tentando amenizar um pouco dor que ela estava sentindo.

Sem hesitar, Ivair a envolveu com seus braços.

O abraço desencadeou um choro escandaloso, numa maneira que não havia chorado desde o dia do ocorrido. Despejava a culpa que pesava seu coração naquelas lágrimas. E, de algum modo, sentia-se confortável o bastante para não pensar, se permitindo encharcar os ombros da camisa dele.

“Foi tudo culpa minha, droga. Talvez se eu não me envolvesse com ela naquela manhã, ignorando-a na sala de aula… Eu não seria tão hipócrita e injusta com ela. E talvez, se eu não buscasse abrigo da chuva naquela doceria, ignorando aquela sugestão… Ele ainda viveria bem sem mim. Com esses movimentos, provavelmente nenhum dos dois brigaria. Mas, eu trago o caos por onde passo. Sou uma pecadora imunda que sentencio todos que cruzam meu caminho…”

E foi assim, do jeito patético como se via, que Aiyra permaneceu enquanto seu amigo passava a mão em seus cabelos, em silêncio, apenas deixando o tempo correr. Como quem dizia, mesmo sem soltar palavra alguma, que ela não estava sozinha.

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Autor: O Thi (@othi_oficial) - Ilustrador: Rren (@rren_san)
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