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Marca da Vontade

Capítulo 20 (Parte 2) – Dias Vazios

Capítulo 20 (Parte 2) – Dias Vazios

Sep 15, 2025

Por mais que alguns minutos tivessem passado como segundos, Aiyra demorou para se situar sobre o momento em que voltou a si, fugindo de uma imersão em suas lamentações. Seu cabelo ficou ainda mais desarrumado que antes. Seus olhos marejados, pouco avermelhados, só eram vistos quando o garoto afastava o rosto dela.

Na perspectiva de Ivair, tudo parecia o oposto. Ainda assim, ele não se incomodava em sacrificar seus minutos para ser o aconchego de uma amiga sofrendo, mesmo que não desempenhasse esse papel com tanto afinco quanto Raissa, acostumada com toque físico e indiferente às aparências.

Contudo, diante da notável ausência da menina mais carinhosa, considerou tomar aquele lugar sem hesitar, como uma moeda de troca para toda a confiança que a menina de olhos verdes depositara nele, especialmente defronte a insistência da cacheada em compreendê-lo realmente.

— Vamos entrando, sim? — sugeriu Ivair gentilmente, ao mesmo tempo que limpava as lágrimas dela.

Aiyra assentiu tão sutilmente quanto, ainda permanecendo em silêncio.

A atmosfera estava taciturna, marcada pela ausência dos gritos e da baderneira que antes contagiavam o ambiente, quando estivera ali pela última vez. Não era surpresa alguma, considerando o silêncio que se perpetuou no grupo de mensagens do trio após o Festival de Katharos. E com toda repercussão do assassinato cometido por Raissa nos noticiários, estava claro — principalmente contando com as reações exageradas da menina Nadiu — que Aiyra tinha um envolvimento direto no incidente.

“Minha desconfiança não pode ser à toa…”

Ela sentou-se na ponta do sofá com uma postura rígida, meio aérea.

Por outro lado, Ivair não hesitou em também se sentar ao lado dela, tampouco em oferecer suas coxas como um travesseiro, para que ela se deitasse tal como uma criança carente de afeto.

Com o olhar confuso, a jovem ergueu as pupilas para firmar o cruzamento de olhares com seu querido amigo. Naquele instante, ela falou pelos olhos, traduzindo seus pensamentos de um jeito quase mágico.

“Você realmente não se incomoda?”

— Pode se deitar, sem problemas. — Ivair reafirmou o convite com alguns tapinhas na perna.

Prontamente, Aiyra venceu sua insegurança, submetendo-se aos cuidados do seu amigo assim como fazia com sua companheira Raissa. Estava em frangalhos, mas completamente segura para expor todas suas dores.

— Não consegue falar, não é?

— E-e…

Antes que gaguejasse em sua tentativa frustrada, o belo menino tapou a boca dela com três dedos unidos. Ele havia sacramentado que a garota ainda não estava em condições de seguir com uma conversa verbal. E pelos motivos que teorizara, isso era plenamente compreensível.

Não tendo alternativas, a garota assentiu com a cabeça, fitando o companheiro com brilho em suas pupilas assim como fogos de artifícios em um réveillon.

— Tá tudo bem, viu? — disse Ivair, enquanto passeava com os dedos no cabelo dela.

Aiyra sorriu com doçura, um pouco sem graça, retribuindo o afago que sempre considerou raro em suas relações. A última vez que vivenciou algo do tipo foi quando Raissa queimou a largada, confortando-a com seus braços fortes.

— Olha, para te animar… Só queria saber se posso encher sua cabeça com tagarelices sobre a vida. Eu meio que nunca contei sobre mim. E sempre foi por falta de oportunidade. — Ivair semicerrou os olhos quase como um felino, enquanto abria um sorriso singelo. — Me permite ou seria chato demais da minha parte?

— Está bem.

Ela quebrou o silêncio com sua voz mansinha.

“Apenas ele para conseguir me trazer essa tranquilidade quando ela não está. Eu sou uma imprestável, esquecendo daquele outro que sempre esteve aqui com a gente…”

Sua reflexão expunha sua hipocrisia à sua maneira de observar o mundo desde sempre. Fazia parte de sua essência sentir mais do que refletir. Aprendeu com sua família que a melhor maneira de demostrar era absorvendo a completude do terreno e as relações ao seu redor.

Em contrapartida, essa forma de ver o mundo provocou as reações externas que configuram essa figura introspectiva que está longe de se firmar em qualquer argumentação detalhada de quem a menina era.

Aiyra, na verdade, era tão sorridente e expressiva quanto alguém como Raissa. O que as afastava conceitualmente, era a intimidade. A filha dos Nadiu sempre necessitou de tempo para revelar sua real face às pessoas. Ela simplesmente não nutria simpatia para pessoas que nem queriam se dar o trabalho de entendê-la.

 

De todo modo, Ivair sabia que a conexão entre eles havia um enorme potencial para criar um laço de irmãos, por todo passado de perseguição que compartilhavam. Ainda que eles tivessem abandonado suas raízes para adentrar novas convicções e dogmas, não podiam ignorar as raízes dos povos originários que ainda estavam presentes na larga vegetação que os moldavam por dentro.

Cada ensinamento era como uma folha naquela larga árvore da vida. Porém, Ivair estava próximo daquele ponto de interseção que caracterizava o início de uma selva fechada.

— Você sabe que sou um Nadiu, assim como você se tornou. Na real, fiquei surpreso por compartilharmos a mesma raiz. Minha antiga tribo se firmava em Araci, sabe?

— A minha também…

— Caramba, sério? Muito legal saber que somos do mesmo ambiente. É diferente de trocar ideia com alguém que acha tudo isso meio alienígena.

— Uhum…

— Queria mesmo ter passado mais tempo por lá, só que após meus pais serem introduzidos às convicções do Rei Naya, minha vida mudou de cabeça pra baixo. Tanto que me mudei para Dioégiusto e eventualmente, por influência do meu coroa, acabei parando aqui em Jardim dos Desejos.

Ivair esboçava um sorriso nostálgico. Lidar com memórias pouco refletidas com uma sobriedade sempre se caracteriza como uma autodescoberta. Ainda mais, ter o privilégio do espaço para compartilhar esse momento com outra igual. Não tinha preço.

— Deixa eu conferir se tenho a mínima lembrança de como era o ambiente… — indagou Ivair, tentando acessar um lugar nebuloso, porém marcante. — Se eu não me engano, era alguns quilômetros da rodovia, não é isso?

— Sim.

— Então, cruzávamos uma passagem distante dos caminhos tanto para a praia quanto para as montanhas, meio que numa terceira via.

Concentrada naquela reconstrução, Aiyra acompanhou o menino, sinalizando com a cabeça que ele estava chegando lá.

— Atravessando o portal natural… constituído de árvores… quer dizer, de galhos circulares. Isso! Dávamos de frente com a aldeia, né? Se não me falha a memória, numa área circular e com casas de…

— Casas de madeira com teto de sapé.

— Isso! Nossa… eu até lembro que meu pai atormentava meu irmão dizendo que cupins invadiriam a casa para morder a bunda dele.

— Como é? Haha!

A menina saiu da inercia, deixando transparecer um pouco do seu humor habitual.

Além disso, sabia que essas histórias normalmente eram contadas para crianças travessas que davam trabalho aos seus pais, visto que ela nunca foi um alvo desses absurdos surreais. Pelo contrário, colaborava com essas histórias pois ajudava Taiane, sua tia e também cuidadora a colocar os pentelhos na linha.

Mesmo assim, não conseguiu evitar o riso frouxo, provocando Ivair a continuar com o relato.

— Cê está rindo, é?

— Haha! Claro que eu estou. Surpresa que você não diz ter ficado com medo também.

— Desde lá eu já não acreditava muito no que os adultos contavam, dado que uma infestação de cupins daria um trabalho sério para a aldeia.

— Aham… Vou acreditar no senhor cupim, sim.

— Você acha mesmo que eu teria medo de algo tão idiota?

— Acho…

Aiyra deixou escapar outra risada, fazendo o garoto desdenhar daquela reação com um estalo nos lábios.

Ao mesmo tempo, para Ivair, aquele som era tão reconfortante que chegava a triscar na nostalgia que o envolvia como um abraço apertado. Observando o brilho daquele sorriso vibrante da garota em seu colo, foi impossível não recordar das manhãs tediosas com seu irmão, quando tentava entretê-lo.

— Você rindo assim me lembra um pouco meu irmão, sabia?

Naqueles breves segundos, Ivair teve um vislumbre da silhueta dele, e seu coração se acalmou ao ver aquela linda garota compartilhar um leve vestígio de felicidade.

— Sério? — recuperando a compostura, Aiyra alternou de um sorriso brilhante para um mais singelo.

— Estou falando sério, pô. Quando éramos pequenos, nós dois tínhamos o costume de nos sentar assim como estamos agora, aproveitando para contar as fofocas da aldeia. — Ivair tensionou os ombros, mas não cessou seus movimentos com a mão, sem deixar de confortá-la, independente do peso de suas próximas palavras. — Mas eu realmente me empolgava quando fantasiávamos sobre nossas futuras trajetórias como adultos, sabe?

A infância era uma etapa muito injusta, especialmente quando você perdia o contato com pessoas que dela pertenciam. Mesmo com a mãe de Ivair ainda presente, praticando a fé ao seu lado, ele sentia que tanto seu pai quanto seu irmão eram como fantasmas que haviam deixado seu norte naquela aldeia em Araci.

Dessa forma, sua tristeza se intensificava, principalmente em relação a Sami por não o ter alcançado quando teve chance. Dominado por esse sentimento, Ivair deixou que uma parte de si, até então ocultada, fosse revelada à sua amiga.

— Hoje eu realmente sinto por ser fraco… Não só fisicamente como em minhas convicções.

“Você não é fraco…”

Aiyra retrucou com uma nota mental, seguida de um carinho atrás da orelha de Ivair, envolvendo-o com seus braços. Ainda assim, pouco verbalizou, pois não gostaria de ser uma pedra no caminho que o impedisse de desabafar.

— Tipo assim, Aiyra, eu falhei em resgatá-lo daquela vez. Mesmo assumindo a culpa pelo que ele fez, tendo-o na minha frente, fracassei e ele escapou das minhas mãos novamente.

Ela o compreendia como ninguém, pois também sentiu aquela impotência ao estender as mãos aos céus em plena corrida, numa tentativa de apaziguar o conflito distante que pensava ser sua culpa. Carregava o luto como um enorme peso sobre os ombros. E ao observar a posição de seu companheiro, nutriu um pensamento que logo se transformou em um mantra que jogava o rótulo de egoísta que forçava sobre si mesma para longe.

“Ele não pode sentir o mesmo que eu senti.”

— Podemos descobrir onde ele está e ir atrás dele.

Aiyra se levantou, virando-se frente a frente com seu amigo.

Aquela força também emergia de uma impaciência em se resguardar, na esperança de impedir que o vírus da melancolia o contaminasse. Não era uma solução definitiva, mas poderia evitar que outra pessoa a fizesse acompanhasse no fundo do poço. Era, no fundo, uma tentativa de encontrar um desfecho diferente daquele que viveu com seu falecido amado que também estava tomado pela violência desse embate sem sentido que o irmão de Ivair estava.

— Mas tudo isso é arriscado, Aiyra. E também não quero te atrapalhar, você acabou de passar por um momento difícil, saca?

— Ivair. Olha para mim. — Aiyra pegou a mão esquerda do jovem e a envolveu com as suas, fitando-o com um sorriso de conforto. — Eu quero ajudá-lo. Me dê essa chance, por favor.

Seus olhos esmeraldas expressavam sua determinação com o brilho de joias recém polidas. Era impressionante como aquela garota assimilava pouco a dor, permanecia intensa e caminhava rumo a um novo desafio. Talvez fosse parte da essência dela ser uma pipa avoada sem ponto certo para pousar.

Entendendo que ela insistiria mesmo diante de uma recusa, Ivair partiu para uma nova investida de conter o ímpeto dela em solucionar o problema do amigo de forma tão prática.

— Como você sugere que façamos isso, então? — questionou Ivair diretamente, após soltar sua mão daquele aperto, desviando levemente o olhar da garota. — Pois, mesmo nos templos de oração a Naya, não há nenhuma forma de se comunicar com aqueles radicais.

A condição atual dos Seguidores de Naya era bastante diferente do pensamento hiperbólico dos Fiéis a Sândalo — no qual, estava caminhando para se tornar hegemônico graças aos discursos públicos feitos pelos atuais líderes — visto que eles não estavam todos unidos pelo fanatismo em busca de uma utópica subversão do poder como pensavam.

Na verdade, muitos cultistas como Ivair e sua mãe — ainda que fossem minoria — não gostavam de ser confundidos com aqueles radicais, evitando qualquer mínimo contato que pudesse gerar desconfiança.

Essa conclusão não deixava de ser surpreendente, especialmente diante do movimento oposto dos seus atuais inimigos naquela linha de frente — os Fiéis a Sândalo. Esses, por sua vez, se uniam para reafirmar seu ponto de vista em cada lugar que chegavam, como um tsunami que destruía qualquer pensamento divergente ao seu alcance, criando regras sedutoras e invisíveis que perpetuavam aquele jeito de pensar a todo custo.

— Conheço uma pessoa que com certeza deve ter informações sobre o movimento que seu irmão está. E, bem… tenho alguns pontos com ele, por assim dizer.

Aiyra, confiante, piscou o olho para seu amigo e, logo em seguida, sugeriu um aperto de mão para consolidar aquele objetivo.

Ivair não podia recusar uma proposta feita com tanta assertividade. Por isso, aceitou o pedido, completando o gesto.

 

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Autor: O Thi (@othi_oficial) - Ilustrador: Rren (@rren_san)
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