Miranda engoliu seco, ela lentamente pegou uma das cadeiras e puxou para si mesma, dando espaço para que ela pudesse se sentar, ela colocou uma perna depois a outra, e sentou.
As duas a encaravam com um olhar frio e sério, Miranda já podia sentir uma gota de suor escorrendo por seu rosto, fazendo um curto caminho até seu pescoço.
— Miranda Mirasol Nunes de La Cruz. — Sua mãe chamou por seu nome, seu tom não mudou, mas ouvir aquele nome fez com que Miranda ficasse mais encolhida.
— Sim?… — Ela disse baixinho.
Dona Regina respirou fundo, a sua avó a encarava com olhos de águia, Miranda se sentia como uma presa que a qualquer movimento brusco poderia ser comida por duas predadoras famintas.
— Parabéns! — A mãe de Miranda chegou do lado dela e a abraçou, sorrindo orgulhosa.
A sua vó batia palmas, senhora Dormalwinda não era muito de falar, na verdade, faziam anos que ela não havia dito uma sequer palavra, ela havia uma doença que fazia com que ela não ficasse sem voz mas que ela ficasse simplesmente sem vontade para falar. Foram diversos tratamentos que falharam tentando fazer com que sua voz voltasse, mas ela nunca voltou.
— Tu é muito foda menina. — Wilma disse sorrindo, sua voz era fraca mas todos a escutaram.
Sem saber se elas ficavam surpresas por ela ter falado ou pela primeira coisa que ela disse depois de anos ter sido uma frase com “foda”. As duas se encararam, e encararam a senhora de volta incrédulas.
— Mãe! — Dona Regina exclamou. Abraçando sua própria mãe, a avó de Miranda. — Que bom que você voltou a falar. — Ela a apertava ainda mais.
Lágrimas escorreram do seu rosto, era um momento alegre para ela, depois de tantos anos sem ouvir a voz da sua própria mãe que estava bem a sua frente.
— Tu também é foda querida. — Wilma acariciou a cabeça da mãe de Miranda, ao contrário de seu vocabulário ela tinha um carinho que só uma avó e mãe poderia dar.
As duas ainda não haviam se acostumado com sua “nova forma de falar” mas ainda estavam felizes por ela estar conversando com elas.
— Então, mãe… A senhora já sabe do que aconteceu? — Miranda encarava o chão e empurrava um dedo contra o outro.
Regina voltou para o foco da conversa, seu rosto esbanjava positividade e ela não conseguia tirar um sorriso bobo da cara. Regina segurou as mãos de sua filha firmemente.
— Filha a mãe está muito orgulhosa de você, e eu e sua avó decidimos que vamos pagar sua viagem para você ir até o cozinheiro Jackson. — Dona Regina continuou. — E não se preocupe, nós vamos conseguir cuidar do restaurante. — Ela disse de forma calma.
— Mas nenhum deles sabe cozinhar… — Miranda disse apreensiva, querendo recusar a oferta, mesmo que esse fosse o sonho dela, ela nunca iria abandonar a família para naufragar em alto mar.
— Escuta, Miranda! Eu já disse que a gente vai ficar bem! Seu avó tinha o mesmo sonho e ele morreu feliz com o sonho realizado! Seu Ernesto, siga os passos dele e conquiste seus sonhos. — Dona Regina exclamou colocando sua mão sob os ombros de Miranda.
Miranda ainda estava relutante, mesmo sabendo que as duas a encorajavam algo nela dizia para ela não abandoná-las. Ela pensou por um momento, se elas realmente iriam ficar bem, principalmente com o que havia ocorrido naquela tarde que mostrou a incapacidade dos outros cozinheiros de tomar conta da cozinha.
— Mas quem vai tomar conta da cozinha? — Miranda olhou para sua mãe que fez uma cara surpresa e desentendida.
— Eu e sua avó é claro! Quem você acha que era chefe de cozinha depois de seu avô e antes de você? — Regina sorria como se tivesse ganhado um prêmio.
Mas aquela conversa iria pra mais longe, de uma hora para outra, Miranda se lembrou de algo, extremamente importante.
— Mas e o dinheiro? — Ela cruzou os braços e olhou para cima ponderando como elas poderiam arranjar dinheiro para ela poder ir viajar.
A avó e a mãe também pensaram, o restaurante estava indo bem mas eram tantos ingredientes e contas para pagar que não sobrava muito para lazer, além disso elas não tinham o costume de andar de avião ou ir para um lugar muito distante.
— Porra! Lembrei! — Dona Dormalwinda gritou, ela apontou para um armário velho, que a muito tempo elas não abriam.
As duas se assustaram com os gritos, para alguém que há muito tempo não falava ela tinha uma voz bem aguda.
— O que foi mãe, o que a senhora quer nesse armário antigo? — Regina se preocupava com o bem-estar da mãe, pensando se ela já estava caduca.
Miranda se levantou e andou até o armário, havia muito pó no exterior dele, ela lentamente abriu a porta, e lá dentro haviam muitas.
— Vó?! — Miranda pegou um pouco das notas. — O que a senhora fez? — Ela disse chocada enquanto pegava mais e mais dinheiro do armário.
Eram muitas cédulas, tantas que pensar que a senhora de idade tivesse cometido um crime era viável, Miranda não conseguia decidir se ficava feliz ou chocada, sua avó, alheia a tudo aquilo, apenas a olhava sorrindo.
— É isso? Quer dizer que a senhora guardou tudo isso sem nos contar? — Regina estava boquiaberta, ela olhava para o dinheiro e para a sua mãe.
Dona Wilma apenas sorriu, enquanto Miranda guardava de volta as cédulas que havia pegado.
— Eu não posso aceitar… — Miranda parou em frente do armário com a cabeça abaixada.
As duas ficaram incrédulas, a mãe de Miranda se levantou e começou a dar um cascudo na cabeça dela bagunçando seu cabelo, Miranda tentava sair mas a sua mãe era uma mulher forte.
— Escuta aqui! Da próxima vez que alguém te oferecer água, você aceita! A água do planeta não vai acabar! — Dona Regina segurou os braços de Miranda firmemente.
Ela ficou tocada com aquela frase, mais ainda pela mãe dela estar a encarando como uma águia. Ela acenou com a cabeça concordando com a fala dela.
— Tudo bem! Eu vou me preparar e depois de amanhã eu saio! — Miranda colocou ambas as mãos na cintura.
— Mas já?! — Ambas a mãe e a avó disseram, incrédulas.

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