A madrugada havia chegado. Meifu escolhe deixar Sara dormir pacificamente, ter uma garota estabanada e barulhenta acordada na hora da atividade dos vampiros não é uma ideia lógica. Meifu se levanta e espia por uma das rachaduras na madeira de uma das paredes. Era possível ver um pouco do corredor do lado de fora.
"Isso é um pouco estranho. As coisas parecem quietas demais. Isso não bate com o perfil que montei de Gilbert, sua impulsividade iria o guiar a correr pela mansão me caçando. Lulibel deve ter o instruído de alguma forma."
A garota Concluiu a idéia em sua mente. Fazia sentido lógico. Tinha embasado sua teoria com fatos sólidos e observáveis. tinha ouvido algo sobre "o dia do renascimento" na primeira vez em que ouviu os dois vampiros conversando. Se lembrava perfeitamente do tom sério de Lulibel sobre isso, sobre uma suposta cooperação necessária de Gilbert para tal dia.
"Eu preciso de mais informações sobre esse dia do renascimento. Me arrependo de ter deixado meus sentimentos atrapalharem na minha missão anteriormente."
Meifu se castigou em pensamento por ter destruído aquele livro herege em seu primeiro dia na mansão. Sim, ela tinha que ter frieza o suficiente para estudar seus inimigos minuciosamente, tramar planos elaborados para agarrar suas fraquezas críticas e finalmente esmagar. Só então naquele pequeno momento, ela sentiria a satisfação de ter obliterado os inimigos de Deus. A garota câmera andava silenciosamente na direção da pequena entrada apertada do cômodo secreto onde ela e Sara estavam. Pretendia sair para fora.
"Se estagnar na segurança vai me impedir de conseguir chances reais de obter essas informações. Não devo ter muito tempo até que Gilbert termine de ajudar Lulibel nos preparativos para o dia do renascimento. Vou agarrar essa brecha."
Ela adicionou em sua conclusão mental.
Antes de finalmente deslizar para fora do quarto, Meifu olha uma última vez para a forma encolhida de Sara, adormecida.
"Não somos nada. Ela não precisa fazer parte disso, iria me atrapalhar."
Mesmo pensando nisso, Meifu sabia que muito dificilmente qualquer ameaça iria chegar em Sara naquela sala escondida. Estava tudo bem em se despedir sem dizer nada. A garota não iria morrer por culpa de Meifu, isso a deixava mais leve de forma inconsciente.
※ ※ ※ ※ ※ ※ ※ ※
Os olhos de Meifu varriam o espaço constantemente, ela se arrastava lentamente pelo corredor escuro da mansão. Na madrugada o lugar era mergulhado no total silêncio noturno. O zumbido na cabeça de Meifu tomava conta de seus ouvidos. Naquela noite em específico estava mortalmente quieto, sem corujas, sem o caminhar dos ratos na parede, sem goteiras. Era como se o ambiente estivesse prendendo a respiração junto de Meifu, que a cada virada de corredor sentia o pressentimento da morte certa. Um golpe certeiro tão rápido que nem saberia quem o fez. Afinal, estava na total escuridão. A adaptação ocular dos olhos humanos ao escuro tinha um limite. Tatear as paredes ásperas e mofadas dos corredores era uma das únicas opções que ela tinha para se orientar. A garota já havia passado alguns dias naquela mansão, já tinha um pequeno mapa mental do lugar, mas sentia a estranheza sutil da estrutura. A forma como os corredores e cômodos eram suavemente movidos de posição. Poderia ser pura paranóia de sua cabeça. Ou não..
"Esse lugar eu nunca vi."
Meifu pensa consigo mesma enquanto sente uma textura metálica do contorno de uma porta. Era grande, pareciam duas grandes portas que nunca havia visto em nenhum outro momento durante o dia ou noite em que residiu na enorme mansão pútrida. Ela empurra as portas lentamente para frente, dando passos medidos no lugar desconhecido. Era enorme. Corredores e corredores de estantes de livros. O espaço que aquela sala ocupava não fazia sentido físico. Era grande demais, Parecia se distorcer infinitamente para frente, Uma biblioteca interminável com uma luz verde fraca que surgia do teto não visível. Quando Meifu dá um passo macio para frente, algo soa em sua cabeça. Uma voz andrógina.
- "o que tu buscas? Incinerar teus inimigos?"
A garota ficou paralisada no lugar. Tentou ver de onde vinha a voz, não achou a fonte. Então responde a pergunta.
Meifu: - Sim..
Ao dizer isso, um vento quente passa pela garota, fazendo seu cabelo curto se mexer. Formava uma trilha, um caminho, indicava para onde ela deveria ir. Meifu se vê induzida a seguir o caminho. Ela tinha certeza..
"É Deus! Deus está falando comigo? Meu amado Deus me guiará para as respostas que faltam? Claro! Sim! Sim!"
A racionalidade da garota havia sumido. Sua fé e devoção a guiavam a seguir pelas estantes de livros da enorme e infinita biblioteca. A brisa quente a levou para uma estante específica. A voz soa novamente na mente de Meifu.
- "pegue aquele. É teu agora."
A garota já sabia do que a voz se referia. Um livro com uma capa branca na estante. Sem detalhes aparentes. Sentia que era aquele, sim. Era ele com toda certeza. As mãos pequenas de Meifu envolvem o livro, o pegando com firmeza. Quando o fez sentiu o ambiente em volta escurecer. A luz fraca verde murchava subitamente, a jogando lentamente no escuro com o livro em mãos. A voz andrógina fala uma última coisa.
- "agora tens o que precisa. Agora vá, agora tu és instrumento, agora tu és fogo."
As prateleiras mais afastadas da curvatura do infinito, na neblina verde do ambiente se torceram, como se aquele lugar estivesse se esvaindo rapidamente, a sensação de estar acordando, como se tudo perdesse a coerência lógica. Livros saíram voando como se fossem pássaros, em grandes bandos. Um ruído empesteou toda a biblioteca.
Após isso tudo fica escuro em um segundo, e no outro, Meifu se vê em pé, tonta, como se acabasse de ser sacudida abruptamente de um sono rem para realidade. encostada naquele mesmo corredor onde havia encontrado a porta metálica, o livro estava com ela. Porém a porta havia sumido. Como se tivesse sido um mero sonho, sua ida à biblioteca infinita se esvaiu como o orvalho da manhã. Existiu naquele instante e depois se esfarelou pelo ar como um sonho ou delírio. Meifu abraça o livro contra seu peito, tanto com ternura quanto para confirmar a existência real do objeto em seus braços finos. E era, estava lá.
"Eu preciso voltar para onde Sara está. Lá é a sala secreta mais próxima daqui."
Meifu afirma para si mesma na sua mente. No fundo ela só queria voltar e conferir a garota. Talvez influenciada pela euforia do momento, ou talvez pela formação inconsciente de um vínculo com Sara.
※ ※ ※ ※ ※ ※ ※ ※
Porém, quando finalmente chegou no cômodo, estava vazio. As paredes estavam danificadas com cortes obscenos de garras bestiais. Meifu ficou um tempo parada, olhando o espaço vazio onde Sara estava dormindo antes dela sair. Com os olhos focados em um ponto fixo. No chão, havia gotículas de sangue seco e fiapos de tecido branco.
Após anos em uma instituição cruel, Meifu é jogada em uma mansão esquecida por Deus.
Fria, fanática e armada com um canivete, ela inicia sua caçada contra o sobrenatural.
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