"Por que isso acontece todo dia? Por que não posso voltar para casa? Meus pais disseram que iriam voltar mais tarde.."
Eu pensava comigo mesma, enquanto dias e dias se passavam dentro daquela "instituição". Eu não compreendia, não entendia. As refeições da manhã eram sem sabor e frias, não existiam brincadeiras. Crianças problemáticas não merecem brincar, não merecem fala mansa, são tratadas como adultos disfuncionais pelos responsáveis de lá.
- o que você pensa que está fazendo?! Sua peste mal agradecida!
Uma mulher de quarenta anos gritou enquanto estapeou uma garotinha pequena no rosto, a derrubando no chão.
O motivo? Ela estava chorando, mesmo com "teto" para dormir e "comida" para comer. Era uma blasfêmia com Deus estarem chorando com tudo isso. Não podiam, deveriam ser gratas, deveriam ser gratas, deveriam ser gratas, DEVERIAM SER GRATAS!
A garotinha se encolheu no chão, sua tigela de sopa caiu com a queda. A sujando, dando trabalho para todos. Sujando o chão do refeitório. Horrível! horrível! horrível! feia! feia! feia!
- m-me desculpa.. s-senhorita Elison..
A garotinha balbuciou entre soluços intensos do choro dela, a menina já sabia que estava marcada. Tinha cometido um erro, tinha sido "ingrata". Era um incômodo. Mesmo com tanto trabalho duro e "bondade" das pessoas de lá para "levá-la ao caminho certo", com orações matinais, limpezas das vidraçarias da igreja, estudo teológico e ensino de "boas maneiras". Mesmo com todas essas atividades maravilhosas, ainda existiam crianças ingratas como a pequena garotinha chamada Meifu.
"Eles vão me botar lá de novo.. não quero voltar para lá, por favor não.. por favor.. não... não.."
A menina agarrava os próprios cabelos enquanto segurava o seu choro e desespero dentro de sua garganta, fechava os olhos para prender suas lágrimas lá dentro. Não queria retornar para lá, não! Era horrível lá. Era horrível no "Quarto da reflexão".
※ ※ ※ ※ ※ ※ ※ ※
De nada adiantou seus protestos silenciosos. A mulher grosseiramente arrastou Meifu na direção de uma escada velha, ela levava para o andar do subsolo da instituição. O cheiro era angustiante, é claro, esse andar não era mostrado para visitantes da instituição. Não era necessário limpá-lo de forma alguma. O local era um enorme corredor metálico com lâmpadas fluorescentes fracas, em cada ponto das paredes havia uma porta com chapas de ferro, algo que nem mesmo um adulto iria arrombar com facilidade, muitos quartos.
"Vão me deixar sozinha.. vão me largar aqui por dias de novo.. eu.. eu não quero ficar sozinha.. tenho medo de ouvir aquele zumbido.. porque simplesmente não me batem como sempre? Por favor!.. tudo menos isso novamente.."
A mente da garotinha a assustava. Esse era o pior castigo para ela. reflexão, fome, sede, O cheiro, o silêncio.
E lá estava ela. O baque da porta de ferro fechando selava sua prisão lá dentro. Um quarto pequeno, sem janelas ou iluminação. A pequena fresta de luz que passava por debaixo da porta era a única exceção. as paredes de metal faziam as noites serem mais frias ainda, os lençóis finos de nada ajudavam.
- eu não quero ouvir.. por favor, fique quieto.
Meifu sussurrava em tom de ordem. Estava sozinha naquele quarto, porém não em sua cabeça. Aquele zumbido pútrido aumentava exponencialmente, ora era estática de televisão ora era ondas do mar, porém tinham horas que eram vozes. Sussurros, não qualquer voz. Sua própria voz.
- você é um incômodo...
- a mamãe e papai jogaram você fora.. como o lixo que você é..
- ingrata, egoísta, mimada. Nojo! Nojo! Nojo!
A garota se apertava contra seus joelhos em posição fetal na pequena cama que tinha. Não queria ouvir aquilo, não havia como escapar, afinal, em qualquer lugar que ela fosse, a mesma sempre estaria lá. Talvez sumir seja a única opção-
O barulho escandaloso da porta metálica abrindo tira Meifu de seu transe, o zumbido para. Seus olhos se focam nas duas figuras paradas na entrada do quarto escuro em que estava.
Elison: - e vê se aprende algo com isso! Vou te deixar aí até amanhã, sua...
A mulher joga uma garota no chão do quarto e fecha a porta rapidamente, a batendo forte. Meifu ficou olhando a forma caída da garota no chão, parecia ser um pouco mais velha que ela. Após alguns segundos a garota se levanta completamente. Sim, ela estava com um semblante determinado no rosto. Mesmo após ter sido jogada lá. Ela era..
Meifu: - radiante..
Sussurrou Meifu, lentamente abrindo seus olhos. Se dando de cara com um teto mofado e estranho, porém rapidamente alguém sobrepõe o teto com seus cabelos amarelos.
Sara: - Meifu! Você finalmente acordou! Que bom..
Sim, a garota câmera havia caído em um sono profundo após o intenso confronto com Gilbert. Aquelas eram apenas memórias do passado. Meifu estava com a cabeça apoiada no colo de Sara, que habilmente a carregou para um cômodo pequeno da mansão. O local era fracamente iluminado por uma vela no chão perto das duas.
Meifu: - Sara... o que aconteceu com você? Quando eu voltei você não estava lá..
A garota perguntou, ainda dolorida olhando para Sara com os olhos meio fechados. Seu corpo pequeno não estava de forma alguma acostumado a relaxar tanto.
Sara: - Foi assustador..uma espécie de bicho apareceu e tentou me comer, eu corri dele. Porém ele conseguiu arranhar meu braço. Porém estou bem, eu juro! Você está bem pior...
Sara dizia enquanto passava sua mão gentilmente nos cabelos de Meifu, com preocupação, olhando para os diversos machucados pelos braços, rosto e pernas de Meifu. Recentes e antigos. Conseguia sentir a respiração lenta dela, com um pouco de dificuldade.
Após anos em uma instituição cruel, Meifu é jogada em uma mansão esquecida por Deus.
Fria, fanática e armada com um canivete, ela inicia sua caçada contra o sobrenatural.
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