A segunda-feira chegou como um soco no estômago de Júlio. Era começo de mês e as coisas haviam se acalmado no escritório, ainda assim, voltar ao trabalho depois de um fim de semana tranquilo e preguiçoso com seus dois namorados, tornava seu café ainda mais amargo. Massageou a ponte entre o nariz na tentativa de aliviar o estresse e deixou o saguão do prédio, mas antes que pudesse descer a rua em direção ao restaurante onde costumava almoçar, ouviu uma voz ligeiramente familiar.
“Sr. Júlio!”
Seus olhos seguiram na direção da voz. Atravessando a rua vinha a moça que havia ajudado outro dia. Júlio forçou um pouco a mente, na tentativa de lembrar o nome. Isabela…? Ele tinha quase certeza de que não era esse, mas também não se prendeu a isso, teria a oportunidade de descobrir, pelo visto.
A garota usava a mesma saia azul e camisa social branca do outro dia e Júlio não deixou de reparar no crachá preso ao bolso da camisa, assim que ela se aproximou. Seu nome era Isadora. E ela trabalhava na Daylight Tech, assim como ele.
“Sr. Júlio, que coincidência! O senhor também trabalha aqui?” A voz de Isadora era doce e animada, muito melhor do que os murmúrios roucos do outro dia. Por mais que não parecesse, Júlio estava feliz em encontrá-la numa situação mais agradável. Apesar de ser uma segunda-feira. Ele assentiu positivamente em resposta a pergunta dela.
“No prédio um”
“Ah sim! Está saindo para o almoço?!” ele concordou outra vez “se não for um incômodo, podemos almoçar juntos?”
Ele acenou positivo novamente, seguindo rua abaixo com Isadora em seus calcanhares. Júlio podia perceber que ela parecia incomodada com o silêncio no percurso, mas não tinha assunto para puxar e pelo visto ela também não.
Em poucos minutos de caminhada os dois chegaram ao restaurante familiar, sendo recebidos com um caloroso bom dia do atendente que já conhecia Júlio. Como ainda era cedo, o restaurante estava praticamente vazio e o garçom os guiou até uma mesa reservada no fundo. O garçom entregou o cardápio apenas para Isadora.
“Sr. Júlio, vai querer o de sempre, certo?”
“Sim” o moreno não costumava fugir de sua rotina, principalmente quanto ao que dizia a alimentação. Em sua cabeça, ele precisava compensar o excesso de café e o sedentarismo.
“É a primeira vez da senhorita aqui? Gostaria de uma recomendação?” Isadora concordou com um aceno tímido e o garçom virou a página do cardápio. “O prato do Chef hoje é filé de lombo suíno com molho de laranja. Acompanha arroz, grão de bico temperado com especiarias e salada ou batatas fritas.”
“As batatas fritas daqui são ótimas” Júlio encorajou, com a voz baixa.
“Eu vou querer esse então” O garçom anotou o pedido e saiu.
“Sr. Júlio…” Isadora começou, na tentativa de puxar assunto, mas o rapaz a interrompeu.
“Você pode me chamar apenas de Júlio”
“Ah, certo. Então... você trabalha na Daylight Tech também.”
“No departamento de contabilidade” Ele respondeu com um aceno positivo, apreciando que Isadora trouxe o assunto em comum de volta, embalando a conversa.
“Eu comecei semana passada no departamento editorial”
“Hm. Péssima época para te pegarem. Fim de mês essa empresa vira o inferno.”
“Sim! Foi realmente estressante.” Isadora concordou com um sorriso tímido. “Eu fiquei bastante surpresa quando te vi saindo do prédio. Na verdade, quase não reconheci, principalmente por causa das roupas.”
“Este é o que normalmente uso para trabalhar” Em comparação com a roupa que usava para ir à boate, o terno azul-escuro era extremamente sóbrio, mas ainda elegante.
A conversa foi brevemente interrompida quando o garçom retornou com a comida. O prato de Isadora parecia saboroso, o filé suíno era dourado e brilhava com o molho, o aroma enchendo o ar ao redor deles fez a mulher salivar. Já o prato de Júlio era completamente diferente. Consistia em legumes cozidos, um pouco de arroz salpicado de gergelim e uma tigela bem grande de salada.
“O senhor-” Isadora se corrigiu ao perceber o olhar carrancudo do homem. “Você é bem saudável”
“Estou apenas compensando” sua resposta foi simples e ele deu a primeira garfada. Isadora não perdeu tempo, o imitando. Assim como a aparência e o cheiro, a comida realmente era saborosa e ela mal conseguiu conter um gemido de satisfação.
“Naquele dia, você estava saindo do trabalho?” Júlio foi quem puxou o assunto desta vez, tentando não deixar o silêncio constrangedor tomar conta do ambiente. Ele não era muito bom em interagir com pessoas que não conhecia, mas não queria parecer frio ou rude com Isadora.
“Sim. Eu não queria fazer hora extra até tão tarde, porque sabia que era perigoso voltar pra casa. Mas minha chefe insistiu.” Ela explicou, olhando para baixo. “Como estou em período de experiência, não pude recusar e, já que ainda não recebi, não queria gastar com táxi”
“Da próxima vez, é melhor priorizar sua segurança. Eu poderia não estar lá para te ajudar.”
“Eu aprendi minha lição. Muito obrigada, de verdade”, sorriu envergonhada, encolhendo os ombros.
“Hm.” Ele acenou, voltando a se concentrar na comida.
Os dois terminaram a refeição sem trocar mais muitas palavras e Júlio pediu para o garçom fechar a conta.
“Deixa que eu pago! Em agradecimento-”
“Não precisa.”
“Mas eu-”
Júlio a encarou com seu olhar estreito, sentindo a irritação começar a subir por sua garganta. “Você precisa dizer o que te incomoda, ou a outra pessoa não vai ter como saber” lembrou das palavras que Lucas havia lhe dito, pouco tempo depois de começarem a namorar. Respirou fundo.
“Eu te ajudei aquele dia porque eu quis, não por algum tipo de retribuição. Além disso, você já me agradeceu. Se insistir, eu vou ficar irritado. Cada um paga a sua parte e tudo certo.”
Isadora murchou um pouco em seu assento, mas cedeu. Júlio podia ver que ela tinha ficado chateada, mas era melhor isso do que brigar com alguém que acabou de conhecer.
Eles pagaram e saíram, caminhando outra vez em silêncio, lado a lado. Ao chegar em frente ao complexo de prédios que formavam a Daylight Tech, Júlio puxou um cartão do bolso de seu terno, oferecendo-o a Isadora.
“Pegue, pra quando fizer hora extra até tarde de novo. Pode me mandar mensagem, só não ligue, eu não vou atender.”
Ele deu as costas, sem esperar por uma resposta, mas ainda conseguindo um breve vislumbre do rosto iluminado de Isadora.
“Tenha uma boa tarde, Júlio!” Ela gritou em resposta, voltando a se animar.
Ele apenas acenou, fingindo não sentir o calor que se acumulava em suas bochechas.

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