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Jinkan - A Perdição da Estrela

Bhaz I

Bhaz I

Nov 29, 2025

A  trilha de terra batida se estendia diante dele em uma cicatriz clara sobre o solo, desenhando curvas pelo chão até desaparecer na borda de um campo vasto de capim dourado. Cada haste se movia ao ritmo do vento da manhã, produzindo um suave marulho que lembrava ondas quebrando em uma praia distante.
O sol — imenso, generoso, absoluto — banhava tudo em um brilho quente, quase líquido, derramando ouro sobre a paisagem. Não havia nuvens suficientes para ofuscar sua luz; apenas um céu azul contínuo, amplo o bastante para engolir um mundo inteiro.

Lá longe, onde a terra se unia ao horizonte, erguia-se Bruvi. Silhuetas de torres, telhados e muralhas dançavam sob o calor do ar, distorcidas como miragens. Ainda levaria horas até chegar lá, mas isso não era obstáculo para Bhaz. A distância não o intimidava. A monotonia do caminho tampouco.

Bhaz prosperava sob o sol.

Ao contrário da maioria dos viajantes, que cerrariam os olhos e buscaram sombra, ele endireitou a postura, abriu o peito e deixou que o calor se espalhasse livremente por sua pele escamada. O brilho do dia ressaltava cada tom do seu corpo — verdes profundos, marrons terrosos e reflexos umbra que dançavam a cada movimento. Era como se o próprio sol aprovasse sua presença ali, beijando-o com um calor que para ele não queimava, mas confortava.

O calor atravessava as escamas, esquentava o sangue, e o fazia soltar um suspiro grave e satisfeito, mais semelhante ao ronronar profundo de um felino gigante do que a qualquer som humano.

Para Bhaz, a luz não é apenas bem-vinda.
És alimento, lava a alma e era um lembrete silencioso de que, enquanto o sol estivesse acima dele, nada poderia detê-lo em direção ao seu destino.

Carregava consigo apenas uma pequena bolsa de couro — gasta pelo sol, marcada pelo tempo, macia pelo uso constante. A abertura era fechada por uma única corda fina, amarrada num nó simples que também se estendia, despretensioso, formando a alça. Dois de seus dedos seguravam-na por cima do ombro direito, num gesto tão habitual quanto relaxado, como se aquele peso diminuto fosse parte natural do seu corpo.

Dentro dela, não havia muito.
Na verdade, quase nada.

Um par de roupas dobradas de qualquer jeito, algumas poucas moedas que fariam mais barulho do que diferença, e um pedaço de carne seca tão velho que Bhaz se perguntava se ainda poderia chamar aquilo de comida — ou de arma. Já havia considerado atirá-la na estrada e deixar que algum pombo decidisse seu destino… mas o estômago roncando insistia em lembrá-lo de que talvez não fosse o momento de tanto desapego.

O ronco veio de novo, profundo, fazendo seu peito vibrar por dentro das escamas.

Bhaz suspirou, olhos estreitos voltados para o horizonte.

Se não encontrasse algo decente para comer logo, o velho pedaço de carne teria um fim menos filosófico e mais inevitável.

Vários metros adiante, algo capturou sua atenção: um trecho do riacho avançava sobre a margem, deixando a terra encharcada e cintilante sob o ceú. A água, cristalina e inquieta, corria com doçura, e Bhaz ergueu as sobrancelhas reptilianas, tomado por um súbito entusiasmo. Ali, talvez, morasse um peixe gordo o suficiente para salvar seu dia — e seu estômago.

Aproximou-se da beira com a precaução de um predador e a expectativa de uma criança, inclinando-se para observar o pequeno mundo submerso. Era um reino à parte, vibrante, luminoso, onde criaturas se moviam como se voassem.

Um peixe magnífico — talvez um bagre — deslizando com elegância, o corpo robusto de quase vinte centímetros balançando como seda líquida. Um banquete ambulante.

O estômago de Bhaz respondeu antes da mente.
Um ronco poderoso.
Quase poético.

Matutou uns instantes como faria para pegá-lo, avaliando o desafio enquanto a água ondulava em reflexos dourados. Até que a solução veio como um estalo: a carne seca. Claro. Finalmente encontrara um propósito digno para aquela coisa que carregava há dias.

Revirou a bolsa com as garras, puxando o pedaço de carne ao alto como quem ergue um tesouro redescoberto. Ainda cheirava a sal e a velhice — perfeito para atrair alguma criatura incauta. Usou uma das garras para recortar um pequeno buraco no meio. 

Lembrou de sua mãe o lhe dizendo às seguintes palavras, tantos anos atrás:
“Se estiver sem vara, use o rabo. Ponha a comida na ponta e balance na água. Eventualmente, algo com fome será mais burro que você.”

Útil, além de cômico.

Com um sorriso torto, Bhaz amarrou a carne na ponta da cauda — sua “vara natural improvisada” — e a mergulhou na água. Movimentou-a em leves círculos, deixando que o aroma salgado fizesse seu trabalho.

Não demorou muito.

Um puxão súbito.
A água se rompeu num espirro prateado.
E Bhaz, triunfante, ergueu o bagre chacoalhando ao sol, escamas cintilando como moedas recém-polidas.

— Aí está você — murmurou, orgulhoso de si mesmo.

Finalmente, algo melhor — muito melhor — para comer.

O bagre, por sua vez, não gostou de ser enganado. Debatia-se nas mãos de Bhaz, o corpo úmido torcendo-se num desespero instintivo. Escorregadio como sabão, quase se livrou dos dedos do maedrago — mas Bhaz foi mais rápido. Encostou o peixe contra uma pedra plana à beira da água e, num movimento firme e sincero, desceu a garra. A ponta atravessou a cabeça do animal, e o corpo, antes inquieto, desfaleceu em silêncio.

— Obrigado — murmurou.

Feliz com a captura e com o estômago já reclamando, Bhaz juntou algumas pedras planas e construiu um pequeno altar, simples, mas montado com cuidado. Colocou o bagre sobre ele, alinhando-o com respeito, como se fosse uma oferenda e não apenas alimento.

Ajoelhou-se.

A postura mudou.
Os ombros relaxaram.
O peito abaixou-se num gesto reverente.

E então, tocando duas garras sobre a pedra mais alta, Bhaz fez o que sua mãe lhe ensinara desde pequeno — algo que nenhum viajante perceberia à primeira vista, mas que para ele era parte indispensável do ciclo da vida:

agradecer a Fusei.

A voz saiu baixa, grave, quase um sussurro que se misturava com o correr da água.

— Fusei, Senhora do Último Caminho…
— Receba este espírito que retorna para ti.
— Ele nadou sob a luz, e agora repousa na tua noite sem dor.
— Que encontre paz na travessia, e alegria onde minhas mãos não podem seguir.

Pousou as palmas sobre o peito, num gesto aprendido desde a infância.

— Que esta morte honre a vida.
— E que a vida que ele me dá… não seja desperdiçada.

O vento soprou leve, movendo as hastes de capim ao redor como se respondessem ao ritual. Bhaz permaneceu quieto por alguns instantes, respeitando o silêncio que sempre vinha depois da oração — o momento onde, segundo sua mãe, Fusei escutava.

Só então ele se levantou, respirou fundo e retirou o peixe do altar.

Era hora de comer.

Não havia muito o que preparar. Maedragos, em certos aspectos, eram mais resistentes que muitos povos que precisavam de brasa e paciência para cozinhar o próprio sustento. O estômago desses répteis era uma fornalha viva, capaz de lidar com quase tudo que a natureza lhes oferecesse — desde que estivesse fresco o bastante. Bastava retirar os órgãos do peixe, e o resto seria bem-vindo ao corpo.

Com prática quase automática, Bhaz abriu o bagre, limpou o interior com a ponta das garras e lavou-o rapidamente no riacho. Em seguida, sentou-se sobre uma pedra aquecida pela luz e abocanhou a primeira mordida.

O sabor se espalhou de imediato.

A carne macia, ainda quente do próprio corpo, se desfazia entre seus dentes.
A fina camada de gordura estourava na língua como pequenas bolhas de sabor, deixando a boca untada de um jeito profundamente satisfatório.
Não era sua melhor refeição — longe disso — mas também estava muito distante de ser uma ruim. O peixe tinha o frescor da manhã, a pureza do rio e o peso ideal para calar o estômago reclamão.

Devorou cada pedaço com calma, saboreando a simplicidade do momento.

Quando terminou, limpou as mãos na própria coxa, bateu a poeira das vestes e ajeitou a bolsa de couro sobre o ombro. O sol ainda brilhava alto, a estrada seguia clara à sua frente, e Bruvi estava lá — firme, distante, aguardando.

Bhaz esticou o pescoço, soltou um suspiro satisfeito e retomou o caminho com passos ritmados, deixando para trás o riacho, o altar improvisado e o peixe que agora fazia parte dele.

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