Naquela noite eu tinha um forte sentimento de que algo iria mudar, mas não tinha ideia do que seria.
O vento forte que passava pelo vão da janela fazia minha cortina balançar, o quarto estava todo escuro e mal conseguia enxergar os velhos moveis que estavam ali. Mesmo que tudo estivesse escuro eu não conseguia pregar os olhos, a chuva forte deveria me acalmar como sempre fizera desde que eu era pequena, mas não tinha efeito algum. Talvez eu não conseguisse dormir justamente por estar muito escuro.
Um forte clarão tomou conta do quarto me fazendo ficar sentada no mesmo instante, olhei para a janela – pela parte não coberta pelo tecido da cortina – e tudo estava escuro. Não tinha chances de ser um raio, não com tanta claridade. Foquei meus olhos na paisagem escura e mais uma vez outro forte clarão, deixando-me sem visão por alguns segundos.
Meu coração estava acelerado devido ao susto que levei com a claridade, resolvi me levantar e fechar a cortina definitivamente. Andei em silencio até a janela, meu coração começou a acelerar mais ainda deixando minha respiração descompassada. Não tinha mais idade para ter medo do escuro. Na verdade, eu nunca tive medo do escuro minha mãe sempre me dizia, quando eu era mais nova, “Não tema a escuridão, tema aqueles que reinam nela.” e assim eu fazia. Estiquei minha mão tremula até o pano branco, esperava que algo acontecesse ao tocar nele, mas por sorte nada aconteceu. Ao menos ainda. Fechei os olhos e respirei fundo contando até cinco em minha mente. “Um... Dois... Três... Quatro... Cinco”, era como se eu estivesse esperando algo acontecer no fim da contagem, porém novamente nada aconteceu. Balancei minha cabeça para os lados afastando meus pensamentos bobos enquanto voltava para a cama.
Antes mesmo que eu me aproximasse da cama ouvi um barulho muito alto vindo do andar debaixo, e pela minha teimosia quis ir ver o que era. Coloquei uma camiseta larga, já que estava vestindo um pijama muito curto, que estava jogada sobre a cadeira de madeira, ao lado do meu guarda roupas também de madeira. Meu quarto todo era decorado desta forma, a cama era modelo velho, pertencia a minha irmã quando ela ainda morava conosco que antes pertencia ao antigo dono da casa, e para não ficar um quarto muito sem noção, meus pais encomendaram tudo no mesmo estilo de madeira, desde o guarda roupas até a mesinha perto da janela onde deixava meus livros e notebook.
Ao me aproximar da porta procurei rapidamente com os olhos meu taco de beisebol – minha mãe me deu uma bronca quando comprei este taco dizendo “Você mora em um país onde este esporte não tem muito reconhecimento, pra que você quer isso?” – para minha sorte, meu momento de estrear ele não demorou a chegar. Mesmo no escuro total pude localizar onde ele estava, já que desde que o comprei não saiu dali. Apertei firmemente a madeira em meus dedos e abri a porta com a outra mão livre, aos poucos e devagar para não fazer barulho.
O corredor estava mais escuro que meu quarto, o que seria um grande problema, poderia tropeçar em alguma coisa e me machucar, eu precisaria ter muito cuidado. Ao menos o corredor não era tão grande, era apenas largo, continha quatro portas contando com a minha, uma levava ao quarto dos meus pais, a do lado ao quarto abandonado da minha meia irmã, e o outro era como um escritório que minha mãe se trancava ali quando eu era mais nova, dizia que estava trabalhando e eu nunca tive permissão para entrar. Estufei o peito após criar coragem e caminhei na ponta do pé, em silencio. Enquanto me aproximava da escada um grande clarão, diferente daqueles dois anteriores, tomou conta do andar inferior o que me deixou mais alarmada, desisti de fazer silencio e corri escada abaixo.
A sala estava completamente vazia e silenciosa o que, claro, seria ótimo se alguns segundos atrás eu não tivesse visto aquela forte luz.
Minhas pernas estavam tremendo devido ao medo que sentia e a cada passo era como se eu seguisse para um precipício. Fechei meus olhos e tentei pensar em coisas alegres, relembrei de bons momentos que tive com meus pais e respirei fundo. Precisava de coragem, ainda mais se tivesse alguém ali em casa, meus pais estavam dormindo e eu não podia deixar nada atrapalhar o sono deles – os dois trabalham tanto o dia todo, precisam de descanso – e com este pensamento segui em frente.
“Não é nada, foi só um barulho” “Deve ser o gato do vizinho que entrou escondido de novo” pensava enquanto balançava levemente a cabeça para os lados na tentativa de afastar meus pensamentos ruins.
Tinha finalmente atravessado a escura sala, e por sorte sem esbarrar em nada, estava indo até a passagem para nossa cozinha quando notei uma fraca luz vinda de lá “Será que eles se esqueceram de apagar a luz?” pensei, mas a luz era fraca demais para vir de uma lâmpada. Meu coração acelerou e fui tomada por um medo que quase me fez paralisar, algo me dizia que não devia olhar.
Eu estava encostada na parede da sala, ao lado da porta, mordi meu lábio inferior e apertei os dedos no taco de beisebol e mais uma vez contei em minha mente “um... dois... três” chegando ao fim da contagem virei meu corpo para o lado e vi algo que jamais deveria ter visto.
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