Falar sobre si mesmo nunca é algo confortável, mas fazemos isso todo início de ano na escola, ou quando conhecemos pessoas novas. Claro que na escola parece uma espécie de ficha, mas é o gostinho do ensino.
Começando pelo básico, meu nome é Dagda Falls, e eu tenho 19 anos; logo 20 daqui a uns dias. Eu morava no estado de Montana, nos Estados Unidos, em uma cidadezinha chamada Dillon bem perto de onde fica o Parque de Yellowstone. É um lugar com muito verde e ursos, consequentemente. Aquela cidade é maravilhosa assim como as pessoas, mas eu possuo o mesmo complexo de todo jovem de uma cidade menos badalada: sair. Sair de Dillon era meu sonho até eu saber que não iria para a Califórnia nem para Nova Iorque, eu iria para Westport Galway, na Irlanda fazer faculdade. Eu iria mudar de país, continente. Confesso que cheguei a pensar em deixar de fazer Dracologia, mas pior seria eu ficar o resto da vida em Dillon. Embarquei no avião o mais rápido que pude.
Eu morava com meus pais, óbvio e tinha uma ótima relação com os dois, mas eles também sentiram quando eu disse que iria embora. Há outras faculdades mais perto que ensinam Dracologia, mas eu não esperava passar para a melhor e quando eles ficaram sabendo, me encorajaram e disseram que eu não poderia deixar essa chance passar. A minha mãe sempre foi muito compreensiva e eu não lembro de uma só vez que ela sequer levantou a voz comigo ou com papai, ela sempre foi muito calma e isso deixava a casa silenciosa, mas gostosa de viver na tranquilidade com seus incensos e gatos gigantemente gordos espalhados pelo carpete. Papai também é calmo mas é por causa de seu vício em fumar. Quando meus pais se conheceram, ele já era usuário de maconha mas isso não atrapalhou a relação dos dois. Ele usa por causa "dos nervos" e se eu um dia já levei bronca, foi pela boca dele. O que eu admito, me impediu de virar uma pessoa mimada e sem limites. Mas ao mesmo tempo me fez ter horror às drogas. Cada família sabe o que se passa nela, já dizia vovó. Eu não tenho irmãos mas tenho muitos primos, quais considero melhores amigos e amigas. Morava numa rua sem saída com a família Falls inteira ocupando a rua. Do lado da placa da rua que diz "Bear Aisle" hoje tem uma placa feita com giz de cera colorido "Falls Aisle" e os tios ajudaram envernizando para que a chuva constante não levasse o legado dos Falls. Aquele foi um dia bem legal.
Na escola, eu não era a garota popular. Nem eu nem ninguém, a única escola particular de Dillon, não tinha muitos alunos o que fazia todos deles bem populares. Todos sabiam quem era quem e era bem difícil alguém ousar fazer uma fofoca. Por um lado, era bom, por outro, bem monótono. A única vez que houve algo de interessante, foi uma briga dentro da minha sala com dois meninos estúpidos, o que leva diretamente ao meu namorado: Sean. Eles brigavam porque a irmã mais nova de Sean estava namorando escondido um menino da minha sala. Na cabeça dele, até hoje ele acha que foi um motivo digno. Sean não veio comigo para a Irlanda, teve de ficar em Montana. Pelo menos foi pra capital cursar Universos Paralelos, alguma coisa sobre controlar a barreira do mundo mágico dos outros. Combinamos de continuar o relacionamento a distância já que namoramos desde os 13 anos e ele nunca me deu nem motivo para desconfiança. Nossos planos eram de ir para Los Angeles e cursar a faculdade na mesma universidade, mas... Surgiu a minha oportunidade e ele também me apoiou em ir. Disse que me visitaria todas férias possíveis e feriados também. Disse que ligaria, mandaria mensagens e continuaria a me fazer surpresas. Como se nada tivesse mudado, e eu espero que seja assim até finalmente noivarmos e casarmos. Planejar uma vida e sofrer uma mudança de curso como essa não é fácil a não ser que você tenha a melhor família do mundo e o Sean, que é o meu caso.
***
A faculdade é incrível, a recepção foi incrível e as pessoas parecem incríveis. É o lado bom de ter o privilégio do conhecimento desse mundo mágico. Não há palavra que melhor descreva a atmosfera desse lugar: mágica. Eu tinha visto a foto da UUO nos folds, mas eu não imaginava que fosse tão linda. É um hotel reformado da Idade Média e foi ampliado com a mesma base arquitetônica. O mais impressionante, é que não há nada escuro ou gótico. As paredes são de um bege limpo e a mobília é de uma madeira clara e os lustres são de cristais enormes. Tudo é tão alto e tão amplo... E os funcionários foram cordiais me guiando até o meu quarto, e as minhas malas já lá dentro. Eu dividiria o quarto com mais uma menina, e o nome na plaquinha dizia: Felicia. Igual a torturadora de gatinhos, que meigo. Logo depois que saí do meu quarto, vi pelo vitral calouros passando pelo "trote". O que pude observar, é que os alunos eram pintados como dragões, com a barriga amarela e as costas vermelhas e eles tinham que fazer malabares com bolinhas pegando fogo. Eles deixavam as bolinhas caírem e todo mundo caía na gargalhada, os calouros sequer tocavam direito nas bolinhas. Depois eles andavam em fila e era posto sobre eles o que parecia uma fantasia de dragão chinês que precisava de várias pessoas para que o dragão tivesse personalidade. Era lindo ao mesmo tempo que eu não queria participar. Apenas sorri e continuei admirando o lugar.
Quando cheguei aos jardins, com suas moitas cortadas em formas lindas de diferentes animais e formas fluidas, e flores que eu nunca havia visto em Dillon, eu vi grandes campos sem grama alguma. Marcas fundas no chão e correntes gigantes enfileirada em um canto. Prendi a respiração. Era uma Arena. É óbvio que não havia luta de dragões (elas são proibidas) mas o simples fato de haver correntes já me enojava. E não era apenas uma única Arena.
Mais adiante pelo caminho de pedras, ao Leste, havia uma descida para o que parecia ser subterrâneo. Estava trancado, mas pela luz que emanava de tochas e rugidos, sabia que era onde os dragões estavam. Me arrepiei e quando pus a cabeça mais próxima do portão de ferro fundido, um homem chamou minha atenção:
–Cuidado! - era gordo e baixinho, barbudo. - Desculpe-me se a assustei. Professor Ohara. Professor de Segurança no Trabalho. - disse isso dando um sorriso, que faltava alguns dentes. - Experiência própria. - depois gargalhou quando notou a minha feição de susto. - Brincadeira! Isso aqui - ele apontou para os dentes - são outras histórias. Histórias incríveis no mar! Vai ser minha aluna?
–Creio que sim, senhor. - estendi a mão. - Dagda Falls. Curso de Dracologia.
–Ah sim! Será sim minha aluna, seja bem-vinda, Falls! - depois de ter retribuído ao aperto de mão, se afastou. Havia mais para ver no Campus, mas decidi voltar ao meu quarto para algo bem mais complexo que dragões: pessoas.
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