Com muito esforço voltei a abrir meus olhos, pude ver Ian analisando meu estado e ele parecia bem preocupado com aquilo. O garoto me viu de olhos abertos e suspirou aliviado, sem falar nada ele levou sua canhota até minha testa e a deixou ali. No tempo que sua mão ficou parada pude sentir um pouco de alivio e algo gelado, era como se ele tivesse colocado uma bolsa de gelo em mim.
―O... Que... ―Minha voz quase não saiu, precisei forçar o máximo que pude. Recebi um olhar de reprovação, entendi assim que não deveria falar nada.
―Preciso confirmar algo, espero que não ache ruim. ―De começo não tinha entendido muito bem o que ele queria dizer, mas logo notei.
Ian levantou minha camiseta, mas eu estava sem forças para impedir. Ele olhou meu corpo com cuidado, e não com malicia, como se procurasse por algo e ao não encontrar ele rapidamente e, com agilidade, usando ambas as mãos, virou meu corpo me deixando de bruços. Ouvi o garoto murmurando algo, parecia ter encontrado o que queria.
Senti seus dedos tocando levemente minhas costas em alguns lugares ardiam e outros doíam. Ian bufou e então disse bem baixo um pedido de desculpas, logo depois colocou a mão na minha nuca e eu apaguei.
Quando acordei novamente estava em meu quarto, estava sem coragem de levantar e esperava que tudo aquilo de antes tivesse sido só um sonho, um dos mais confusos, mas ao menos meus pais estariam em casa só me esperando levantar da cama.
Senti meu corpo todo dolorido, mas mesmo assim teimei em me sentar na cama – mesmo que sentisse como se meu corpo fosse se despedaçar – respirei fundo. Notei minha garganta seca, olhei para a mesa ao meu lado na esperança de encontrar água, mas não tinha nada, o que me desanimou. Estava criando coragem para levantar da cama, mas duas coisas me impediam: a dor e o medo. Tinha medo de que tudo aquilo fosse mesmo real e que meus pais não estivessem mais comigo, só de pensar nessa hipótese me deu vontade de chorar e voltar a dormir para não acordar mais. Respirei fundo mais uma vez e iria começar a fazer uma contagem, para levantar, quando a porta do quarto abriu.
Meus olhos foram rápidos para tentar enxergar quem estava ali, o quarto estava sem iluminação alguma.
―Sinto muito te decepcionar, mas sou só eu. ―Sua voz soou baixa e talvez um pouco gentil, mas mesmo assim senti a tristeza tomar conta de mim novamente.
―Eu só... Pensei que fosse tudo um sonho maluco. ―Abaixei o tom de voz enquanto falava, podia sentir minha garganta arranhando de tão seca.
Ian não disse mais nada, ele apenas se aproximou e colocou um copo de água sobre o criado mudo, ao lado da cama, após isso ficou apenas olhando-me fixamente. Seus olhos eram frios e quanto mais olhava para eles mais achava que eles eram lindos, não era uma cor muito comum de se encontrar nos olhos das pessoas. O rapaz com todo aquele ar misterioso deu alguns passos para trás e encostou o corpo na parede, cruzando os braços.
Aproveitei da distancia tomada para poder esticar os braços para cima, sentindo mais dor ainda, e me espreguiçando para então pegar o copo de água e toma-lo em goles pequenos.
―Precisamos sair daqui o quanto antes. ―Ao ouvi-lo olhei para o lado, onde ele estava.
―Por que a pressa?
―Eles podem voltar. ―Ele suspirou. ―Na noite que cheguei aqui vocês estavam sendo atacados, consegui te proteger e aquelas coisas fugiram. Talvez por conta da coleta de informações eles esperaram, mas podem voltar hoje ou amanhã.
―Hm, e me deixa adivinhar... Eles agem à noite? ―Parecia até um clichê de tantas histórias que li por ai.
―Na verdade não tem um horário, é apenas por poderem se camuflar nas sombras da noite. ―Agora que ele tinha dito fazia sentido. A pele deles era completamente negra como um breu e o melhor lugar para que eles possam se esconder seria entre as sobras noturnas. Balancei a cabeça mostrando entender o que ele dizia, mesmo que tivesse que pensar um pouco mais para entender melhor. Eu suspirei e mordi meu lábio inferior enquanto pensava.
―E a proposito, você gosta de suspirar? ―Ian me olhou de foram confusa, e então arqueou sua sobrancelha direita balançando a cabeça para os lados, sem entender o que eu queria dizer. ―De qualquer forma, quando eu era criança minha mãe vivia dizendo "Ao suspirar você está expondo suas fraquezas e dando brechas para que o mal entre. No momento que coloca o ar para fora, está libertando toda a energia reunida em seu corpo, mesmo que aos poucos, então não pode fazer isso... Ao menos que seja uma pessoa com poder suficiente para enfrenta-los." E depois disso resolvi fazer aulas de luta... Ela sabia como traumatizar uma criança.
―Isso é verdade, existem forças malignas que se escondem só esperando o momento para atacar, e isso é quando suspiramos. Quando fazemos isso puxamos uma grande quantidade de ar junto da energia contida nele, e essas criaturas se mesclam no ar e entram em nossos corpos. ―Ian deu de ombros, olhou para os lados como se procurasse por algo e sorriu pelo canto dos lábios enquanto olhava para a janela perto do guarda-roupa.
Ele suspirou bem profundamente e eu podia jurar ter visto um vulto indo em direção a ele, tentei acompanhar com os olhos, mas foi rápido. Quando olhei para Ian ele estava com a mão esquerda esticada e fechada, o sorriso de deboche esboçado em seus finos lábios. Quando Ian abriu a mão vi caindo no chão uma poeira escura.
―O que é isso? ―Olhei para o chão tentando ver o que era, mas a poeira não estava mais ali.
―São as criaturas que tentam tomar conta de nosso corpo. Claro que um humano comum não pode vê-los e aqui neste mundo eles não fazem mal algum. ―Ele esfregou a mão na calça, como se limpasse ela. ―Mas quando eles notam alguém diferente, tentam atacar... Infelizmente, para eles, eu sou forte.
―Tudo bem, Sr. Forte. ―Terminei de tomar a água que estava no copo e o deixei de volta na mesa. Apoiei minhas costas nos travesseiros da cama, incomodada. ― Ian, o que aconteceu comigo?
―Aqueles dois jogaram um encantamento em você. ―Ele parecia um pouco desconfortável, mas mesmo assim não pouco tempo em ser direto. ―Usaram um encantamento proibido que era usado, em tempos antigos, para torturas. Quando uma pessoa é encantada com aquilo ela sente dores horríveis a ponto de desejar a morte, se eu não tivesse notado você já estaria morta.
―Bem delicado você, mas obrigada por ter me salvo. ―Sorri agradecida, mesmo que estivesse bem fraca mesmo para um simples sorriso. Ian parece ser um cara indelicado e que não pensa nos outros se não for alguma ordem ou se não tiver benefícios, deve ser do tipo que obedece as regras e o que faz tudo o pedido.
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