Era um casamento, eu estava com as minhas amigas, elas tentavam encontrar as poucas pessoas solteiras e interessantes da festa. Meu corpo estava elétrico pelas bebidas, a música, e os saltos me fazia ainda mais alta do que já sou, estava em um pouco inconfortável, até tirar eles do pé. Eu me encontrei paquerando, dançando, curtindo, e meu sorriso era fácil com qualquer bobagem que falavam. Eu estava me sentindo viva.
Ele chegou, ele sorria quando apareceu ao meu lado na pista de dança, eu não tinha uma grande expectativa. Eu o vi falar com o pessoal ao redor, me cumprimentou apenas, e eu já sabia que seria só isso. Não tínhamos o que falar entre nós.
Tínhamos a noiva em comum, mas fora isso, éramos conhecidos de infância, eu lembro dele como o amigo do meu irmão, lembro dele como o pegador, como alguém que se interessava por todos, menos por mim. Nem mesmo para uma conversa maior que duas frase. Era constrangedor, mas eu tentava. Lembro de um dia específico, eu o havia convencido a me escutar cantar uma música que eu iria apresentar na escola, muito nervosa, queria uma plateia diferente da minha família.
-Gosto do seu sorriso, como suas bochechas sobem.
Fora mais ou menos isso, não recordo exatamente. Ele disse que adorava como minhas bochechas subiam, as maçãs do meu rosto, quando eu sorria. Eu tinha um sorriso bonito, era isso?
Eu sabia que eu não era desejada nem pelo meu crush na época da escola, por ele muito menos. Mas não pude evitar me iludir pelo resto daquela semana, e então perceber que nada havia mudado, ele não me via dessa forma. Apesar disso, éramos meio que amigos. Éramos amigáveis.
Ele apareceu naquela festa, depois de anos do colégio, eu era diferente, ele também. Mais tarde, depois de muita dança, bebida, água, a barriga cheia, os pés doloridos assim como a coluna, eu soltei lembranças e ele as resgatou. E vi devagar e com medo daquilo desaparecer, como nos aproximamos com a alegria de reencontrar alguém conhecido depois de anos. Ele me abraçou mais tarde e por algum motivo, não tirou seu braço da minha cintura por um tempo. Eu não tirei também, afetividade amigável, uma merda vindo dele.
Mas não era isso, certo? Não consegui saber na hora.
Ele tentou me beijar uns minutos depois, tão bêbado que acertou meu nariz, depois me empurrou o copo na costela, e eu me afastei. Ele se jogou em mim, o que eu poderia fazer? Ninguém nunca investe em mim, e quando o fazem, é bêbado?
O dia seguinte chegou, eu aproveitei com meus amigos, nos divertimos tanto na noite anterior, e quando fomos dormir na minha casa, fiquei feliz que continuamos nos divertindo. No outro dia eu tomei um susto com o celular. No instagram, uma marcação em um story. Já me desesperei esperando as vergonhas que passei dançando como nunca, na frente de tantas pessoas, as bebidas que entornei, as pessoas que lancei olhares sugestivos, o beijo mal sucedido. Durou apenas segundos essa desconfiança, lembrei que não sou ninguém importante. Eu fiquei confusa com algo, mas não por nada do que suspeitei. A marcação era dele.
"DESCULPAS"
Um gif atravessado, piscando. Os seguintes storys, tinham ele dizendo desculpas para as outras pessoas, aparentemente ele foi um pouco babaca com elas, o que me deixou estranhamente menos nervosa. De alguma forma aquilo significava que eu não era uma pessoa fácil para ele, e dispensável, que suas ações erradas comigo, não eram nada. Admito ser cruel ao pensar isso de uma pessoa boa, mas eu ainda tinha minhas dúvidas sobre ele.
Nos últimos storys em letras pequenas, continuando com:
"Desculpas à todos, mas principalmente à ela. Eu sei que posso ter passado da linha na bebida, mas me sinto um idiota babaca, o que combinar mais, por ter avançado em você daquela forma. Nossa, como me odeio por isso! Depois de anos te querendo, estrago assim! Eu poderia acabar com tudo agora, dizer que sou um estupido e nunca mais te ver, mas percebi que não vou aguentar. Percebi que gastei toda minha coragem e força nesses anos.
Te ver tão linda, tão, mas tão linda. Te ver cercada de brilho, sensualidade, você me fez queimar e nem percebeu. O pior foi isso, você não me viu, enquanto eu te olhava, de baixo, por sinal (você estava tão mais alta, poderia me pisar com aqueles saltos sexys, e eu iria gostar), você fica tão alheia as pessoas te secando, mesmo que de tão perto. Como ficam sedentas para falar contigo, e você não parece estar ali, mesmo à distância mínima de uma mão, você se exclui.
Não faça isso, olhe no olho das pessoas e conte suas ideias e sonhos daquela forma brincalhona, descontraída e com um tamanho respeito que apenas me fez me apegar ainda mais à você. As pessoas lhe têm com muito carinho, ou no mínimo, com respeito. Eu via e ouvia na escola como falavam de ti, como se fosse uma pessoa que não quisessem quebrar, as brincadeiras cessavam, era como se uma integrante da realeza entrasse na sala. Ansiavam por saber o que te tornava tão importante daquela forma, queriam escutar suas palavras, observar suas ações, ver um deslize de sua humanidade.
Só queria dizer que estou aqui. Eu sempre estive, você poderia me ter em suas mãos quando quisesse, mas você nem reparou. Eu quero você em minhas mãos, mas não acho que você vá querer. Bem, estou aqui.
Me desculpe. Te quero"
A energia em meu corpo me paralisou, me engasgou e eu não sabia se era medo, surpresa, desejo... Eu lembrava bem de seus elogios, eu me sentia bem com isso, com seu toque. Eu aproveitei todas as oportunidades em que alguém demonstrava algo por mim que não fosse repulsa. Com ele eu sentia segurança, sabia que sempre poderia lhe ter por perto caso precisasse de zelo, bondade, talvez carinho, mas claro, se antes eu soubesse que me olhava assim. Porém ler aquilo...
Eu lembro de ter chamado minha mãe, só estávamos eu e ela na casa. Eu falei sobre essa carta pública, ela me olhou com felicidade e descrença. Ficou irritada de saber que ele tinha se jogado em mim bêbado, mas admirou que tinha se desculpado e se declarado. Falar com ela não só me provou que ele podia estar falando a verdade, mas também que eu estava duvidando mais uma vez.
Lembro da forma como minhas amigas me mandaram dezenas de mensagens, como eu estava confusa e elas tinham uma pitada de certeza e -de uma forma desconcertante- nenhuma dúvida. Uma das minhas amigas do colégio, ela lhe conhecia, eu esperava que me dissesse algo diferente, eu temi, e ela me disse que ele "era assim". Você era assim?
Eu lembro de lhe ligar enfim:
"MAS QUE PORRA?" Eu estava ofegante e engasguei um pouco na exclamação.
"Oi. Me desculpa."
Eu escutei ele, ele parecia tão sem ar quanto eu, fiquei sem palavras. Queria perguntar o que estava acontecendo de novo, mas justamente por eu não entender o porquê de ser depois de tantos anos, o porquê de ser de repente, e comigo. Que brincadeira era aquela?
Eu queria o ameaçar, ser bruta e mandar ele falar a verdade, mas então eu perguntei contra minha própria força mental:
"Onde você está?"
Ele não hesitou.
"Em casa."
Se fosse alguma brincadeira ele não hesitaria mesmo, ele iria agarrar a primeira oportunidade de me ter presa.
"Me encontre na praça do campo de futebol aqui perto. Lembra dela?"
Ele não respondeu mais do que uma afirmação, por isso eu desliguei.
Pensei que fosse ficar paralisada que fosse me perder nas palavras, ou me enfurecer e exigir uma verdade que eu acreditava, mas quando o vi, me senti tranquila de alguma forma. Era como se eu entendesse algo que deixei passar até então dentre esses anos, eu deixei ele passar.
Ele estava lá, embaixo de uma árvore, esperando por mim. A tarde se estendia atrás da Igreja ali perto, o ar era fresco. Quando me olhou, pude sentir, sentir uma força me puxando na direção dele, a doce atração e se apegando em mim.
Ele me recebeu em seus braços, suspirando assustado e então rindo contente pela minha reação. Me puxou mais forte contra si, sentindo o perfume de meus cabelos. A maciez da sua pele nos braços me deixou extasiada, e o apertei entre os dedos como nunca antes. Era estranho de uma forma, pois eu nunca estive daquela forma com alguém, nunca abracei romanticamente alguém de forma recíproca. Nunca senti esse prazer em um ato tão simples.
Quando me soltou o suficiente para nós olharmos, o observei, os olhos escuros, ele me encarou com a testa franzida, a respiração pesada, o toque de suas mãos firmes em minhas costas, me segurando junto dele. Eu queria que ele me quisesse mais perto, ainda mais, como se não quisesse que eu fosse embora nunca mais.
O beijei, um toque simples, que o fez soprar a respiração em lufadas irregulares. Ele fez do simples toque dos lábios quentes, em algo fervente, eu respirava o ar dele, ele se atrevia nos meus lábios. Quando se separou se deixou rir, eu suspirei, a ansiedade parando de pulsar em meu peito, relaxando, ele me seguiu.
-Me desculpe... lá na festa.
-Tudo bem. -Me afastei para olhar em seus olhos castanhos. -Eu sou muito desligada. Estou... acostumada, a não ser vista assim.
Ele me olhou fundo nos olhos, era de saltar o coração, uma sensação quente em meu peito, braços, no ponto onde a palma dele tocava em minhas costas, minha cintura.
-Vou precisar ser mais óbvio mais vezes. -Ele disse olhando o meu rosto, desceu lentamente para os meus lábios.
-Por favor. -Meu suspiro saiu sofrido, e ele soprou um riso.
-Serei. -Com um toque ele se aproximou novamente, eu o abracei sentindo o tecido quente de sua roupa.
Não me lembro como voltei pra casa, ambos com muito na cabeça, um sorriso no rosto. Quando nos vimos novamente tudo pareceu voltar ao foco, estávamos na terra de novo, com uma inexplicável saudade.
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