O salão de entrada era enorme, a luz da lua através das janelas iluminava as paredes cinza do internato e um silêncio incômodo preenchia o ar. Raziel se esgueirava e se escondia, observando o lugar com atenção para não ser visto.
Com passos mansos ele se aproximou da porta de entrada e, lentamente, girou a maçaneta. Trancada. Ele já esperava isso, mas não gostava muito da segunda alternativa.
Deixou o salão de entrada e encontrou a área de serviço, sabia que a tranca estava com defeito e por isso a porta ficava sempre aberta. Entrou e localizou o cesto de roupas sujas, retirou três lençóis longos e amarrou-os, criando uma corda. Enrolou em volta do punho e subiu até o dormitório.
Raziel abriu a porta lentamente para verificar se todos ainda estavam dormindo. Ninguém parecia ter acordado. Entrou no quarto, foi até a janela e abriu-a. Amarrou uma ponta da corda feita com lençóis, na cabeceira da sua cama e jogou a outra ponta pela janela.
Ela não era grande o suficiente para alcançar o chão, mas o deixava em uma altura baixa o suficiente para que pudesse pular. Após verificar a resistência dos nós, começou a descer a corda.
— Raziel. — Ele escutou dizer novamente.
Não sabia de quem era a voz, mas já vinha escutando há muito tempo. Depois de alguns dias ele percebeu que a voz parecia vir da floresta, um pouco depois dos limites do internato.
Ele atingiu o chão e quase perdeu o equilíbrio com o impacto. Se agachou e se aproximou da parede, em silêncio. Esperou um tempo para ter certeza que ninguém tinha escutado sua queda e saiu em direção aos muros do internato.
Depois de chegar aos muros, localizou uma grande arvore próxima a ele. Subiu nela e depois pulou em direção à parede de concreto, se agarrou no topo e jogou-se para cima. Depois de descer do muro, olhou para trás e percebeu algo que não havia incluído em seus planos:
— Como que eu faço pra voltar?
Após um tempo parado pensando, decidiu que iria continuar e encontrar uma solução quando voltasse. Atravessou a rua e entrou na floresta. Desacelerou o passo e começou a se focar em prestar atenção aos sons.
— Raziel. — Escutou, novamente.
— Só eu pra começar a escutar vozes e correr atrás delas ao invés de evitar elas.
Raziel seguiu a voz e chegou a um lago, porém não encontrou ninguém em lugar algum. Começou a olhar ao redor, procurando pela fonte da voz, quando a escutou de novo.
— Raziel.
— Onde você tá?
— 127b.
— Hãm?
— Eu estou em 127b, me encontre Raziel.
— Quê? Como assim, quem é você?
— Você saberá quando for a hora. Agora corra eles estão atrás de você.
Raziel começou a escutar sons de pessoas correndo, vindo de trás dele.
— Me encontre, Raziel.
— Por que eu? — Parecendo ter perdido o controle do próprio corpo, Raziel olhou involuntariamente para o próprio reflexo na água.
— Por que nós somos iguais. — Ele viu seu reflexo dizendo, porém seus olhos brilhavam em roxo.
As pessoas começavam a se aproximar e Raziel saiu correndo. Ele entrou mais fundo na floresta e, depois de correr por um tempo, se lembrou que as pessoas que estavam vindo atrás dele deviam ser do internato, deviam ter percebido que ele sumiu, e como não tinha mesmo uma forma de voltar, não fazia sentido tentar fugir deles.
Raziel parou e esperou eles o encontrarem. Como pensou, eram os monitores do internato.
— Oi, foi mal ter fugido.
Eles não expressaram nenhuma resposta. Raziel percebeu uma jovem junto a eles. Sofia. Era sua amiga. Ele não sabia o que ela estava fazendo na floresta, os adolescentes não tinham permissão para sair do internato.
Pensou que talvez ela tivesse visto ele saindo e ido atrás dele, mas havia sido pega pelos monitores.
— Sofia, por que você está aqui?
Os monitores abriram espaço e ela passou à frente deles. Mantinha uma expressão séria e parecia estar com o olhar longe, não estava olhando para ele, nem para nada. De repente, Sofia levantou sua mão e apontou em direção à Raziel.
— Espera... O que é isso Sofia? — Deu um passo para trás e suas pernas começaram a tremer.
Uma pedra que estava perto dela começou a vibrar e depois saiu do chão, ficando suspensa no ar. A pedra se deslocou e ficou flutuando em frente à Sofia. Raziel paralisou, queria sair correndo, mas as suas pernas não o deixavam. Porque Sofia estava fazendo aquilo? Porque os monitores não estavam impedindo-a? Começou a suar frio.
Sofia fechou os punhos e a pedra foi lançada em alta velocidade na direção de Raziel. Antes de ser atingido pela pedra ele percebeu seu reflexo, com os olhos brilhando em roxo, em uma poça de água próxima.
— Eu disse para você correr, eles não são exatamente quem você pensa que são.
Apagou.
Comments (0)
See all