Em uma pequena nação ao sul do continente. Ciano admira, pela janela, o labirinto de Carvão. Ele espera seu intimo amigo, que sempre lhe acompanha nos trabalhos do exército.
Salmão, seu amigo, adentra o quarto e encontra Ciano, novamente, admirando o labirinto.
— O que tem de tão bonito, nesse labirinto? — Diz Salmão.
— Você não acha a ideia de que alguém construiu isso muito surreal?
— Não estamos no exército para questionar de onde ele veio. Nós trabalhamos para chegar no final dele.
— Eu gostaria de saber mais sobre o labirinto. A cada vez que eu entro nele eu só fico mais intrigado, com o porquê dele ter sido construído e quem o construiu. Além disso, tem tantas outras coisas. Como ele funciona? Como ele foi construído? O que tem no final dele?
— Você deveria se esforçar mais no seu trabalho ao invés de desperdiçar seu tempo se questionando sobre coisas fúteis.
Ciano ri de forma constrangida, pelo apontamento de seu amigo. Fazia uma semana que ele havia entrado no exército e tudo que ele conseguia pensar era sobre o labirinto. Desde a sua infância Ciano sempre foi apaixonado pelo labirinto e pela história que havia por trás dele. Ele viu o alistamento, obrigatório, como uma chance de conhecer melhor a sua paixão.
Ambos os amigos saem do salão principal do exército e se direcionam para o seu esquadrão. Todos os soldados se armam, com armaduras e espadas, e se põem a marchar para a entrada do labirinto.
O labirinto tem uma magnitude enorme, dezesseis andares, onde cada um deles parece não ter fim. As regiões próximas ao labirinto são protegidas e não de para construir nelas. Além disso, as paredes e o chão são indestrutíveis. O seu criador o fez com muito zelo, para que não pudessem trapacear.
As tropas interrompem a sua marcha e o líder de esquadrão, se põe a frente.
— Hoje iremos adentrar o labirinto. Para que não esqueçam, as últimas palavras do artesão, direi novamente: “Para aqueles abençoados, como eu, deixo-lhes esse labirinto. Desfrutem dos meus maiores orgulhos, e cheguem ao final para desfrutarem de minhas bençãos.” Terminem o labirinto e deem orgulho a sua nação.
As portas se abrem, liberando a entrada do primeiro andar. A porta fica aberta somente duas horas por dia. Caso você não sai terá de passar a noite no labirinto, o que é estritamente proibido no exército. As expedições de entrada são administradas por um general de divisão, dois marechais e quatro líderes de esquadrão.
Em geral as pessoas que participam das expedições são somente os líderes de esquadrão e os soldados comuns, pois a nação por mais de cem anos não consegue passar do quarto andar, e os soldados acima de líder de esquadrão passam a maior parte do tempo pesquisando sobre o labirinto, fora dele ou dentro dele, devido a permissões especiais. Dependendo do quanto você desceu no labirinto você ganha cargos de liderança ou até mesmo equipamentos encantados, que trabalhando uma vida inteira como cidadão você não conseguiria.
Adentrando o labirinto o líder se dirige a passagem que leva ao segundo andar, enquanto os soldados têm de provar seu valor para o labirinto. Dentro do esquadrão de Ciano resta somente cinco pessoas que não morreram ou foram reprovadas pelo labirinto: Ciano, Salmão, Escarlate, Branco, Preto. Salmão havia conversado com Ciano ontem, para que ele ajudasse ao invés de simplesmente ficar passeando pelo labirinto, pois ele realmente gostaria de ser aprovado dessa vez. Ciano que já, praticamente, conhece todo o primeiro andar os guia pelos caminhos estreitos que são decorados com as paredes rochosas, incrustadas de pedras luminosas.
As paredes do primeiro andar tem o péssimo hábito de rodar, andar, subir ou descer, devagar.
Em dias que muitas pessoas entravam no labirinto o cheiro de sangue, e a visão dos corpos esmagados facilmente esvazia o estômago de qualquer um.
Mesmo que devagar isso era suficiente para deixar qualquer um perdido. Mas Ciano conseguiu facilmente se localizar e apontar o caminho correto. Depois de alguns minutos de caminhada eles conseguem chegar ao final do primeiro andar. Cada andar, além dos desafios do próprio andar, tem uma passagem que é feita para julgar aqueles que compreendem.
A passagem do primeiro andar se baseia em dezesseis portas que se apresentam em um espaço semicircular. No chão se consegue enxergar um círculo com várias linhas perpendiculares passando dentro dele. Já no teto, várias palavras se formam, a partir de água, e escorrem por estalactites, caindo, em formato de gotas, no círculo.
— Sabia que você conseguiria se você tentasse. — Diz Salmão.
— Ainda sim eu gostaria de explorar esse lugar mais. Tudo nesse lugar é cheio de símbolos e palavras, que podem ter diversos significados.
— Você pode explorar esse lugar o quanto você quiser se você entrar para o alto escalão. — Diz Escarlate.
Ciano concorda, ainda estando um pouco desconfortável. Cada um entra por uma das dezesseis portas, para tentar ter acesso ao segundo andar. Mesmo que as portas estejam uma do lado da outra, em um espaço semicircular, cada uma leva a um cômodo completamente diferente.
Ciano, encontra-se em um quarto, onde o chão é resplandecente como água parada. Conforme ele dá passos para dentro do cômodo, no chão, se formam palavras que brilham em ciano:
“Você parece promissor.
Fazia algum tempo que eu não encontrava alguém tão curioso.
O quão longe essa curiosidade vai te levar?
Como um presente, eu vou acordar em você algo interessante.
Estou ansiosa para nossa próxima conversa.”
No chão, abaixo dele, se forma um grande retângulo. Em um de seus cantos o nome de Ciano foi escrito e, logo abaixo, um símbolo, surgido de chamas, o marca. Logo em seguida, Ciano cai na escuridão que parece não ter fim, mas logo acerta o chão.
Ele estava em uma sala, junto de Escarlate, Preto e Salmão.
— Isso significa que passamos? — Questiona Salmão.
Depois de terminar a frase, antes mesmo de ter tempo para respirar, Salmão se depara com o rosto de Preto, que está horrorizado. Suas pernas estão bambas e seu corpo trêmulo. Parecia que havia visto algo inumano. Salmão rapidamente vira seu rosto para Ciano, e a medida que seu coração começa a bater mais forte, ele passa a ter a mesma reação. De repente todos os seus companheiros estavam aterrorizados e Ciano não conseguia entender.
— O que aconteceu com vocês? Parece que viram um fantasma.
Conforme Ciano estende o braço, para seus amigos, ele os enxerga se afastarem. Um medo avassalador adentra o coração do garoto.
Um pouco antes de cair aos prantos, ele vê. Refletido no medo, dos olhos de seus amigos, um brilho ciano dança para ele de forma seduzente. Com suas lágrimas escorrendo pela sua face, ele estende uma de suas mãos a sua cabeça. A mesma começa a arder e queimar, chegando ao ponto de deixar a palma de sua mão em carne viva.
Ouvindo os grunhidos de dor excruciante, seus companheiros não sabem identificar. O que eles sentem é só medo? Ou uma tristeza, amarga, também os consome? Uma coisa eles sabiam dizer com certeza. A dor que Ciano sente não vem das queimaduras.
O líder de esquadrão se põe atrás de Ciano e apaga as chamas que se apossaram de sua cabeça, jogando água, que ele coletará com o capacete. Logo após, ele parabeniza seus soldados:
— Parabéns, finalmente chegaram no segundo andar. espero que continuem com o ótimo desempenho. Sobre o que vocês acabaram de ver, coisas estranhas acontecem aqui o tempo inteiro, não pense demais sobre isso.
Após terminar a fala, o líder apresenta um semblante de desconforto. As palavras que ele havia usado para poupar os corações dos jovens, por mais que sejam verdadeiras, não condizem com a realidade que eles vivem. Não importa o quão humano você seja, o medo e as memórias que foram passadas adiante, durante toda uma eternidade, mancham a vida e o caráter daqueles que vivem hoje.
Ciano levanta-se junto com seus companheiros e ambos se direcionaram para a saída. Durante todo o trajeto ambas as partes ficam em silêncio, tentando digerir o ocorrido.
A cada passo que Ciano da, sua consciência pesa cada vez mais. Ele ainda não consegue enxugar os pensamentos que o martirizam. Os mesmos são como correntes, que o prendem a sua moral e o impedem de agir.
Ciano e Salmão chegam a um ponto em que eles têm de divergir, para irem a seus quartos. Salmão, na tentativa de falar algo, se vira, somente para provar a sua impotência. Seu amigo anda em direção ao quarto, enquanto ele olha, paralisado.
O pobre soldado estava cansado. Muita coisa havia acontecido em pouco mais de uma hora que ele havia ficado dentro do labirinto. Ele se pôs na cama e adormeceu.
Um balanço suave, uma superfície plana e fria e um arrastar de correntes tranquilizante. Ciano acorda acorrentado em uma tábua e sendo levado, por dois soldados, dentro de um corredor escuro.
Ao chegar em um grande salão, um pouco melhor iluminado, os soldados largam a tábua, no chão, e soltam Ciano. Eles, então, voltam para o corredor e trancam a porta, que é a única saída para a sala.
Ciano calmamente se levanta e senta em uma das grandes mesas do salão. Em seguida, seu olhar manifesta sua decepção e desgosto, enquanto outras pessoas adentram o salão.
Enquanto ele, ainda, se concentrava em seu lamento as outras pessoas na sala murmuravam apostando quanto tempo ia demorar até ele se suicidar. Diferente das outras pessoas, uma menina, com uma determinação sufocante, sem a perna direita, que permanece de pé apoiando-se em um bastão. Observa ele, com uma chama, intensa, de esperança nos olhos.
A garota, aos poucos, vai se aproximando e senta a frente de Ciano na mesa.
— Se você vai ficar se lamentando pelo resto dessa coisa, miserável, que você chama de vida. Me de ela! Vou fazer muito bom uso. — Diz a garota.
Essa história não é sobre alguém que abandonou a sua capacidade de pensar. Ela é sobre uma garota que tem a capacidade e a determinação para mudar os Traumas.
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