Depois de um tempo em que Eleonora trouxera os lanches para o grupo, Jennifer se levantou e rumou em direção as escadas, dizendo que voltava logo. Ao primeiro movimento da garota, Allec encarou seu amigo J e aguardou ela subir as escadas antes de sussurrar:
— J, dá uma forcinha aí vai, é uma chance em um milhão!
— Mas a mãe dela está aqui cara...
— Não tem problema, eu a ouvi subir pro segundo andar e já faz algum tempo... Por favor, J, diz que sim? É a primeira vez que me sinto tão atraído por uma garota...
— Tá bom Al, vai ficar me devendo essa! Eu vou cobrar hein!
— Pode contar comigo cara, pra qualquer coisa. — disse trocando gestos e toques com as mãos e perguntou: — Já tem algum plano?
J apenas lhe lançou um sorriso, enquanto mexia no celular.
— Ela tá vindo, disfarça... — sugeriu Allec pegando novamente o caderno.
— E aí, criaram mais algum diálogo?
Os garotos assentiram negativamente e o telefone de Jonathan tocou.
— Alô mãe?... Não, tô na casa de uma amiga, junto de alguns amigos, fazendo trabalho em grupo... Não mãe... Tá bom, daqui a pouco apareço por aí... Tá, tchau... Beijo... — Jonathan conversou com sua mãe, mas mesmo com uma ótima audição, Allec não escutara nada do outro lado da linha. J fingia e era um ótimo ator.
— Está tudo bem J? — perguntou Jennifer.
— Está, minha mãe disse pra eu ir pra casa, sinto muito galera... — disse enquanto guardava seus cadernos.
— Tá tudo bem J... Eu e Jenny vamos adiantando as falas e amanhã a gente passa pra você. — respondeu Allec se levantando, junto de Jenny, para se despedirem do amigo e o acompanharam até a porta.
Ao voltarem Jennifer perguntou: — E seu irmão Allec?
— O que tem ele?
— Ele não ficará bravo se você chegar tarde? Daqui uma hora já irá escurecer e o trabalho ainda levará um tempo... Se quiser a gente termina amanhã...
— Não esquenta, ele sai tarde do serviço também, mas agradeço por se preocupar.
Os dois passaram um tempo escrevendo, analisando as falas e atuando nos personagens. A mãe de Jennifer fora até o mercado e ambos ficaram sozinhos na casa.
— Hey Allec, vê se gosta desta fala... — ela leu interpretando a personagem, mas Allec não processara uma palavra do que ela dissera, por estar hipnotizado pelo som doce da voz dela.
— Ficou muito bom! Você leva jeito Jenny...
— Ah que isso, tá falando por falar, mas eu acostumei a ler bastante, dá pra viajar legal na escrita... — foi colocar a folha no chão enquanto dizia e acabou tocando na mão dele sem querer. — Me desculpe. — disse desviando o olhar e ambos sentiram o rosto ferver.
— Não foi nada. — respondeu. — Você não imagina o quanto é bonita... — Allec pensara em voz alta e ficou vermelho igual a uma pimenta, quando ela o encarou.
— Você acha? — perguntou corada.
— Er... Eu... — coçou a cabeça sem jeito.
— Você me acha mesmo bonita?
— Não... Você é linda! Não apenas por fora, você é gentil, simpática... É única... — levou a mão ao rosto dela. — Sua presença faz meu coração disparar, principalmente quando você me olha deste jeito... — sorriu e sentiu seu coração quase saindo pela boca de nervoso. Queria muito beijá-la, mas claro não contra a vontade dela.
— Desde que te conheci eu me sinto estranha, mas não de uma maneira ruim... Como se você tivesse me resgatado de um mundo de trevas... Isso que estou dizendo não deve fazer sentido pra você, mas... — foi interrompida por Allec, que levou seu dedo indicador nos lábios dela em sinal de silêncio.
— Não diga nada... — disse e a beijou.
Ela retribuiu e permaneceram se beijando por alguns minutos, até que ela o afastou e se levantou. — Espere!
— O que há de errado?
— Me ajude a levar pra cima. — disse juntando os cadernos e pegando o laptop. — Se ficarmos aqui, minha mãe pode chegar a qualquer momento. — disse lhe mostrando o caminho até seu quarto.
Seguiu-a então até o quarto e colocou as bolsas próximas da cama. O quarto dela era adorável, de um tom bege e rosa. Farejou prata na maior parte dos objetos e ficou intrigado, mas voltou a si quando escutou a porta fechar. Se virou e encontrou Jennifer o encarando e sorrindo.
— Não me leve a mal Al, é que meus pais são muito convencionais as tradições, você precisaria pedir permissão pra eles só pra ficar de mão dada comigo...
— Eu não me importo... — disse se aproximando e ficara sobre ela, apoiando um braço na porta e continuou: — Quero ficar com você Jenny... E se você concordar eu pedirei a eles assim que voltarem.
— Você faria isto por mim?
— Qualquer coisa... — acariciou os cabelos dela.
— Melhor não. Pelo menos hoje não, pois eles não iriam gostar de eu ter ficado com um garoto no meu quarto, enquanto ninguém estivesse em casa. Amanhã! Está bem?
— Ok. — sorrira em resposta e ela o puxou para cama e ficaram trocando carícias.
John e Carol resolveram comer numa lanchonete a dois quarteirões de onde trabalhavam. John chamara a atenção da garçonete para fazerem os pedidos. Enquanto aguardavam, ele sentia a inquietação de Carol, que o encarava fixamente e perguntou:
— Está tudo bem Carol?
— Está, só não estou conseguindo acreditar que você me chamou pra sair... É alguma pegadinha, não é? — ela olhou para os lados em busca de algo. — Onde elas estão?
— Do que você está falando?
— Das câmeras! Aposto que irão postar na internet...
John a interrompeu pegando em suas mãos.
— Por que não acredita em mim? Eu estou mesmo interessado em você e fui um tolo por não ter aceitado antes.
Ele levou sua mão ao rosto dela, ao notar que os olhos da mesma haviam se umedecido e se preparara para limpar qualquer lágrima que viesse.
— Me desculpe John... Eu fico muito feliz de coração por ter me convidado... Obrigada.
— Disponha, eu que fico agradecido por não ter desistido de mim. — lançou-lhe um sorriso.
Ambos jantaram um lanche médio, composto de cheddar, bacon, dois hambúrgueres e algumas rodelas de tomate. Conversaram por algum tempo e eram quase dez horas da noite, quando decidiram ir embora. John levantou primeiro e estendeu a mão em gesto cavalheiro. Ao saírem, ele a guiou por um beco estreito e mal iluminado entre a lanchonete e um prédio residencial e puxou-a pelo braço, a surpreendendo com um beijo quente.
Ela retribuiu o beijo, em seguida ele começara a lambê-la no pescoço, enquanto dizia: — Carol... Quero muito provar da sua carne. — suas mãos agora se atreviam entre as pernas dela.
Carol ficou paralisada e feliz, pois o homem que sempre desejara a queria de corpo e alma, mas conseguiu pará-lo e dizer: — John, vamos pra outro lugar... Para meu apartamento.
— Está bem... Desculpe-me pelo ataque, não consegui me conter. — disse envergonhado, como se não fosse à mesma pessoa de minutos atrás.
— Está tudo bem... Vamos. — ela pegou sua mão e o guiou através do beco, que cortava caminho e pensou: “Eu não esperava por isto, mas eu gostei.”
Ao saírem do beco, a rua estava deserta. Começou a chuviscar e John a cobriu com seu casaco.
— Obrigada... Mas você não está com frio?
— Não, não se preocupe. — ele a puxou para mais perto de si e andaram abraçados, até que ele fingiu ouvir algo. — Ouviu isto? — fez uma cara de surpresa. — Fique aqui... Eu já volto. — e atravessou a rua correndo até o outro beco escuro, que ficava entre dois estabelecimentos comerciais já fechados.
— Esperai, o quê? — ela não entendeu o motivo dele ter saído correndo. — John, espere! — hesitou, mas o seguiu e adentrou lentamente o beco, após ligar a luz do celular, por causa da escuridão e o aumento da chuva, que prejudicava sua visão. — John? — chamou por ele, infiltrou-se mais uns dez metros e notou algumas roupas rasgadas e encharcadas, próximas a seu pé. Com a luz do celular mais perto das roupas, identificou que pertenciam a John. — Oh meu Deus! John? — chamou por ele mais uma vez e antes que se virasse para recuar e chamar a polícia, escutou algo pousar na poça d’água atrás dela. Quando tomou coragem para se virar, segurou a respiração e no mesmo momento em que visualizou a silhueta negra de dois metros de altura, pensou em gritar, mas seja lá o que fosse, agiu mais rápido, tampou sua boca a empurrando contra a parede e fazendo-a bater a cabeça.
Ela apagou por alguns segundos, devido à pancada e conforme foi recobrando a consciência, sentiu um cheiro de cachorro molhado e pelos grossos próximos a seu corpo. Sua visão foi ficando mais clara e algo gelado tocava sua pele, abaixo de seu umbigo e entre suas pernas. Seus olhos se arregalaram ao notar, que se tratava de um lobo, que a farejava e gritou:
— Não! Não! — ela tentou repeli-lo e quando foi gritar novamente, ele rosnou e roçou seus caninos na mão dela, ameaçando mordê-la e ela estremeceu, ficando em silêncio.
O lobo começou a rasgar suas roupas e a lambê-la.
— Não! Socor... — ela gritou, mas fora interrompida quando o lobo rosnou novamente, mas agora bem próximo de seu pescoço, mostrando suas presas e sentindo o ar quente de sua respiração. Ela começou a chorar e a tremer, enquanto dizia baixinho: — Por favor... Deixe-me ir... — seu corpo ficou paralisado. Sentiu as garras do lobo em seu quadril, que ele havia levantado, mas uniu forças e deu um chute bem no estômago dele, se virou e levantou gritando: — Socorro! Alguém me ajude! — mas neste exato momento um trovão dominou o céu, ocultando qualquer vestígio de socorro.
O lobo furioso, cravou as garras em suas costas e a mordeu no pescoço de maneira que o quebrou.
— Precisamos voltar a fazer os diálogos... — Jennifer sugeriu e o beijou.
Ambos deitados e abraçados na cama.
Allec brincava com o cabelo dela e sorriu ao dizer:
— Os diálogos podem esperar...
— Acho que o J vai ficar bravo conosco.
— Não esquenta... — Allec se virou e ficou sobre ela. — Ele vai entender.
— Se você tá dizendo... — ela riu e o puxou pra si.
No mesmo momento em que iam se beijar, escutaram o som dos dois automóveis estacionando na garagem.
— Ai não, eles já chegaram! — Jennifer pulou da cama e espiou pela janela. — Rápido, consegue descer pela janela Al? Tem uma grade aqui do lado.
— Sim. — disse pegando sua mochila.
Jennifer revirou o armário e encontrou seu guarda-chuva.
— Aqui! — disse lhe entregando. — Me desculpa por tudo isso. — disse abrindo a janela.
— Não esquenta, obrigado! A gente se vê amanhã então!
— Tudo bem, até amanhã... — e se despediram com um beijo.
Allec começou a descer pela grade e quando viu que ela se distraiu com o barulho dos pais, pulou de quatro metros de altura, sem ela notar e correu em direção a sua casa.
Aproximadamente dez e meia da noite, Allec chegou em sua casa e não encontrou seu irmão.
— De novo John? — disse indignado, pois esperava encontrá-lo, ainda mais em um tempo chuvoso.
Um uivo quase imperceptível surgiu no mesmo instante. Allec correu até a janela e avistou seu irmão, transformado e camuflado entre as sombras do jardim. Ainda chovia muito e ao abrir a janela, John saltou para o mais próximo possível do banheiro, porque ficara ensopado. Allec resmungou, por quase ter caído no chão ao desviar do irmão. Fechou bruscamente a janela e cortinas e caminhou até o banheiro, onde estava o irmão, se secando de maneira canina. Os dois se entreolharam e John afirmou:
— Nem venha me falar nada, eu vi que você chegou agora também!
— Ah é? E onde você esteve? — Allec retrucou.
— Tá ficando surdo? Pergunto o mesmo a você!
— Eu fiquei estudando na casa de uns amigos... — respondeu cruzando os braços.
— Sei... — John se aproximou e o farejou. — Vá tomar um banho, você tá fedendo a humano. — ele foi até seu armário pegar uma toalha, ainda em sua forma bestial.
— E você John? Cadê suas roupas?
— Infelizmente eu as perdi na caçada... As joguei no lixo. — disse revirando seu armário.
— Cabeçudo! Alguém poderia te ver! — Allec o repreendeu, socando seu irmão no braço. Caminhou até o armário e enquanto também mexia em sua gaveta, comentou chateado: — Valeu por lembrar de mim de novo!
— Não enche, você parece que ficou bem ocupado também. Amanhã iremos caçar então! Às 22h00. Não se atrase.
— Tá, tá! Digo o mesmo. — Allec respondeu fechando a porta do banheiro e pensou: “Seja lá o que estiver escondendo John, cedo ou tarde eu irei descobrir.”
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