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As Incertezas da Fortuna

Capítulo 5 [Parte 1]

Capítulo 5 [Parte 1]

Mar 25, 2021

Aviso: Essa obra de ficção contém cenas incômodas envolvendo abuso psicológico e gaslighting parental. 


Mylène ainda estava um pouco zonza com tudo que havia acontecido: a explosão, Gaspard em choque, a revelação sobre Marianne…

A tarde no festival da primavera fora inesperada, inusitada e certamente os acontecimentos do evento passaram longe das expectativas que tinha, mas ainda assim, ela se sentia contente.

Claro que, como uma cidadã consciente, Mylène estava preocupada com os estragos da explosão — mas também torcia para que De la Source não fosse capturado, pois admirava secretamente seu trabalho. E, como um ser humano decente e uma praticante das artes medicinais — mesmo que na surdina — esperava que ninguém estivesse ferido. Porém não conseguia esquecer o abraço final entre ela e Gaspard… Aquele abraço tinha sido a cereja no topo do bolo, uma cura para a sua alma inquieta.

Talvez ela nunca fosse ser inteiramente feliz ao lado de Gaspard, mas a conexão entre eles e a segurança que ele passava a levariam para uma vida boa. Afinal, o contrato por conveniência entre eles se tornara uma verdadeira amizade quase sem que percebessem. Uma relação tranquila com um marido que a respeitava, a mãe saudável, o estudo, o título de marquesa e duas crianças lindas com olhos cinzentos correndo pela casa. O que mais poderia desejar?

Mylène fechou os olhos por um instante e buscou a vozinha que sempre lhe trazia dúvida. Nada, nenhum pio. Naquela noite ela dormiria em paz.

Outra voz, entretanto, interrompeu seus pensamentos:

— Chegamos, senhorita! — Anton avisou.

— Ah, claro! — ela abriu os olhos e tentou se situar.

Mylène estivera tão absorta em seus pensamentos que nem percebeu que o balanço da carruagem se suavizara, finalmente chegando ao seu destino. Ela baixou da carruagem dos Orléans com o auxílio de Anton e agradeceu ao cocheiro, observando os funcionários da  família Dupain que já estavam em frente à casa para recepcioná-la.

Sempre se sentia desconfortável quando todos os criados paravam tudo apenas para recebê-la e os dispensou rapidamente após pedir para que Laila preparasse seu banho. Mas primeiro deveria passar no escritório do pai para dar um breve resumo do encontro com o noivo, como de costume. Durante o curto caminho, Mylène refletiu sobre o que falaria para Hugo Dupain com cuidado. Sabia que as palavras certas poderiam lhe garantir a permissão para ver a mãe e não podia se dar ao luxo de errar.

O escritório de seu pai ficava depois da sala de visitas e da de reuniões. Seguindo pelo corredor à direita da entrada da casa, Mylène parou na frente das portas pesadas de madeira que dariam direto ao escritório do pai. Antes de bater à porta, fechou os olhos mais uma vez e respirou profundamente.

O alívio das angústias que sentia em relação à sua vida com Gaspard era evidente, entretanto diminuía a cada segundo que ela encarava aquela porta e se lembrava que ainda precisaria conviver com o pai por mais um mês atuando como a filha perfeita e obediente.

Puxando um pouco mais de ar pela boca, Mylène se consolou. Faltava pouco. Valeria a pena. Tinha que valer.

Novamente de olhos abertos e mais centrada, ela se sentiu pronta para encarar o seu carrasco particular. Obstinada, estava prestes a pedir permissão para entrar com uma batida na madeira quando alguém a surpreendeu, abrindo a porta abruptamente.

— Ah, boa tarde, senhorita Dupain! — um homem conhecido a cumprimentou sorrindo de orelha a orelha.

Era o Senhor Verry, um dos parceiros comerciais de seu pai, e Mylène nunca o vira sem uma carranca. Seu estranho bom humor fez com que ela sentisse um arrepio na espinha, sensação intensificada pois era um homem de dentes amarelados e sujos em um rosto pálido, sem nenhum sinal de saúde.

— Já estou de saída, mas a senhorita não precisa me acompanhar — ele se despediu.

Mylène sentiu repulsa só de pensar na possibilidade de ter que acompanhá-lo até a saída, mas felizmente o senhor Verry a dispensara e partira antes que ela precisasse fingir simpatia.

Sem mais delongas, ela entrou no recinto e encontrou o pai sentado no sofá, lendo alguns documentos. À sua frente, uma xícara fumegante de chá estava servida e a outra, do convidado, vazia. Isso era um bom sinal, significava que ele não a obrigaria a beber nada, ou, pelo menos, não a ameaçaria a beber.

Mylène nunca consumia nenhuma comida ou, principalmente, bebida oferecida pelo senhor Dupain.

— Soube que houve uma explosão no centro hoje — ele comentou de forma casual, sem tirar os olhos dos papéis. De início, Mylène ficou surpresa que as notícias tenham chegado tão rápido para seu pai, mas logo recordou do sorriso aterrorizante de senhor Verry e concluiu que a informação poderia ter sido repassada a Hugo por ele.

— Foi na Maison d’Argent. Vossa Excelê-…— Mylène interrompeu a si mesma antes de continuar — Quer dizer, Gaspard foi requisitado no local.

Se corrigira de propósito para lembrar Hugo da cena de intimidade entre os noivos mais cedo. De onde estava, Mylène conseguia enxergar o sorriso de satisfação do pai. Se tudo continuasse fluindo bem, ela conseguiria ver a mãe ainda naquela noite.

— O marquês, sem dúvidas, é um homem importante — a alegria na sua voz era um tanto ridícula e descabida. — E suponho que tudo ocorreu bem no festival, não é?

"Teve uma explosão!", ela pensou indignada. Porém, apenas disse:

— Sim, papai! — Mylène replicou com uma falsa animação. — Até fui presenteada com uma rosa! Pena que na correria após a explosão, ela acabou se perdendo…

— Não se preocupe, querida. Você terá todas as rosas que quiser quando estiver finalmente casada! — ele exclamou, colocando os papéis que segurava ao lado da xícara. — Bom trabalho!

Dito isso, o senhor Dupain se levantou e foi até a filha. Ele pegou a corrente prateada que sempre carregava no pescoço e o coração de Mylène se acelerou, parecendo subir para sua garganta. Quando seu pai puxou a corrente por completo, a chave para o quarto da senhora Dupain surgiu da gola de sua camisa.

— Creio que sua mãe estará disposta para vê-la hoje — seu pai comentou como se Avril tivesse se recuperado magicamente apenas por Mylène ter se comportado como ele queria. — Será sem a minha supervisão porque estou ocupado com o carregamento inesperado de Hassan.

Ele estava de bom humor por conta do trabalho.

Por dentro, Mylène começou a pular e gritar de alegria. A última vez que tivera um momento à sós com a mãe fora há quase dois meses, quando Gaspard finalmente anunciou para a imprensa Beau que o seu casamento aconteceria em breve.

— Obrigada, papai.

— De nada, querida filha. Mas lembre-se que você tem quinze minutos para trazer a chave de volta às minhas mãos. Não deve incomodar demais sua mãe.

Hugo pausou um segundo antes de completar num tom despreocupado, mas ameaçador:

— Não queremos que ela tenha algum tipo de recaída por sua culpa, não é, Mylène?

— Não, papai — Mylène afirmou monotonicamente, escondendo a aflição.

Sem dizer mais nada, Mylène deixou o escritório. Não gostaria de criar qualquer motivo para Hugo rescindir sua permissão. Ao fechar a porta, acelerou o ritmo dos passos para chegar o mais rápido possível no primeiro andar. Tinha pouco tempo e uma missão a cumprir.

Quando chegou perto do quarto, observou de canto de olho que Loic, um dos empregados leais de seu pai, estava ao pé da escada. Seguramente, assim que entrasse no cômodo, ele subiria os degraus e ficaria “espionando” a conversa que ela teria com a mãe.

Nada que Mylène já não estivesse acostumada, sabia que apenas precisaria atuar um pouco mais.

— Boa tarde, mãezinha! — ela disse ao entrar no quarto. — Como você está hoje? Espero que bem, na medida do possível.

Nenhuma resposta. Provavelmente, o silêncio da mãe a acompanharia naquela visita. A melancolia dela estava forte.

“Melancolia… Hah! Que ótimo nome papai deu para este assassinato lento que ele está cometendo", pensou com escárnio.

— Hoje o dia foi agitado. Fui ao festival de primavera, acredita? É a primeira vez desde a partida do León… — Mylène continuou a falar. Boa parte da literatura dizia que, mesmo desacordadas, as pessoas no estado da sua mãe conseguiam ouvir. Além disso, era um ótimo estímulo para o cérebro. — Ainda assim, foi bastante divertido.

Após abrir um pouco mais a janela para fazer o ar circular, ela se aproximou da cama. Os cabelos ruivos que um dia foram tão brilhantes da mãe estavam mais opacos e quebradiços do que nunca. Através da pele e dos lábios era possível ver também que estava um pouco desidratada. A fúria tomou conta de Mylène, mas ela entendia que não adiantaria de nada extravasá-la, só pioraria a situação. Precisava agir.

Imediatamente, abriu a bolsa que sempre levava consigo e tirou de lá o vidrinho de “álcool”. Devagar, ela começou a derramar o seu conteúdo dentro da jarra de água em cima da mesinha de cabeceira. Não havia copos para servi-la porque, assim como Mylène não consumia nada que Hugo a oferecia, Hugo também não confiava em nada que Mylène pudesse oferecer para a mãe.

Hora da atuação.

— E você sabe que o marquês não gosta nada dos Romaines, né? Acredita que ainda assim ele me acompanhou no festival? Acho que ele gosta mesmo de mim, mamãe! — ela aumentou o tom de voz para demonstrar choque, mas tinha o intuito de disfarçar qualquer barulho que pudesse produzir. — Nosso casamento será lindo, mesmo que seja uma cerimônia íntima. Espero que a senhora esteja bem o suficiente para comparecer e me ver com o seu vestido. Já o ajeitamos para caber perfeitamente em mim.

E pronto! 

A missão de Mylène se cumprira.

A tintura revigorante inodora e incolor que havia desenvolvido com ajuda das mulheres do Refúgio agora estava toda na jarra. À noite, quando alguém despertasse sua mãe para alimentá-la e mantê-la viva, também fariam com que ela bebesse água. Sempre corria o risco de que trocassem a jarra e jogassem o conteúdo fora, mas precisava confiar. Afinal, era a única coisa que podia fazer pela mãe no momento, já que Rosane e Laila, suas criadas pessoais, não eram autorizadas a entrar ali.

Na casa dos Dupain, as duas eram as únicas pessoas em quem Mylène confiava. Elas também eram as únicas que sabiam que o senhor Dupain envenenava a esposa desde a morte de León, o primogênito do casal.

De início, Avril Dupain realmente havia ficado mal. Que mãe não ficaria? Porém, a sua personalidade vivaz nunca permitiria que ela se entregasse à tristeza por muito tempo. Avril sempre fora a única pessoa que conseguia confrontar Hugo Dupain e faria o que estivesse ao seu alcance para evitar que Mylène se casasse com um nobre qualquer para elevar o status social da família. Isso seria um grande empecilho para os planos que o senhor Dupain tinha, porque com a morte de Léon, só lhe restava a filha como caminho para realizar seu desejo de grandeza.

Quanto à Mylène, ela sempre quisera estudar. Quando sua mãe ainda estava bem, chegara até a comentar à mesa de jantar que gostaria de prestar universidade em Sálaga, o país ao sul de Chambeaux. “Lá, as mulheres podem até ser médicas”, ela dissera na mesma oportunidade.

Sua mãe dera todo o apoio do mundo, obrigando seu pai a agir.

Então, aos poucos, sua mãe começou a adoecer. E, enquanto o senhor Dupain dizia para todos à sua volta que isso era devido à melancolia, Mylène notava as vertigens, dores abdominais e diarreias. Pelo que já tinha aprendido na medicina, desconfiou de algum tipo de infecção.

Durante a procura de um remédio para a mãe, Mylène acabou descobrindo uma apoteca antiga, mas não muito famosa, da cidade. Foi lá também que conheceu sua mestra, uma salaguenha que era a dona do lugar. Dado os sintomas, a apotecária levantou a suspeita de envenenamento e sugeriu que Avril tomasse uma tintura simples. Após uma semana com a medicação, seu estado e vigor melhoraram.

Naquele momento, não poderia afirmar quem estaria por trás de tal atitude cruel e o porquê do alvo ser justamente a mãe. Numa tentativa de descobrir o culpado, Mylène pediu que Rosane e Laila vigiassem o preparo da alimentação de Avril. Nada tinha sido constatado até o dia em que Hugo proibiu a filha de frequentar apotecas e de comprar novas tinturas para a mãe sem motivo algum.

Obviamente, Mylène não deu ouvidos.

O pai agiu mais uma vez, confirmando ser o responsável pelo envenenamento, e quase matou a mãe, botando a culpa toda na filha por não “respeitar os desejos da família”, o que na verdade significava que Mylène não respeitara os desejos dele. Se ela continuasse o desrespeito, a senhora Dupain sofreria as consequências.

Mas o jogo viraria quando ela se tornasse a Marquesa Orléans.

— Eu vou tirar a gente dessa situação em breve… — Mylène sussurrou, dando um beijo na testa de sua mãe antes de deixar o quarto.

[Continua na Parte 2]
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"Mylène Dupain e Gaspard Orléans estão noivos!"

E em meio à nobreza de Chambeaux, os dois tiveram muita sorte de se encontrar. Afinal, eles não apenas se dão bem como também parecem satisfeitos com as vantagens que o casamento trará para ambos.

Porém "parecer" não é "estar"...

E isso fica mais evidente depois de um festival de primavera em que o destino desperta sonhos há tempos renegados e desenterra o passado. Mylène e Gaspard, à sua maneira, acabam embarcando em jornadas individuais, na esperança de logo se encontrarem novamente. Mas será que quando isso acontecer eles ainda ficarão satisfeitos com a vida que levavam antes?

Autora: Marina Orli
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