Seus olhos observavam as gostas brilhantes no céu enquanto sua mente vagava em possibilidades. Uma em que Lais já tinha voltado para seus amigos, outra em que ela estava indo embora da festa. O mais distante dele, mais confortável. E ele sentiu-se um profundo idiota, sem nenhuma noção de consequências e que agora sofria por suas próprias ações. Ele até poderia passar o resto da festa ali, deitado naquele sofá, sentindo o cheiro do gramado e escutando a diversão alheia ao longe. Mas então pensou como isso iria parecer para o resto das pessoas, como isso iria parecer para Lais. O derrotado, o cara que levou um fora e ficou miúdo em seu canto, sendo antissocial para se defender.
Sua respiração ficou presa quando escutou os passos perto dele e então a garota apareceu em seu campo de visão. Foram disparos, seus olhos para os cabelos balançando e então os olhos estreitos; seu coração pela presença dela. Uma sobrancelha se ergueu na face clara, os olhos verdes mais escuros que sempre, lhe dizendo que ele estava agindo estranho. Eu sei, pensou quase rindo com o súbito contentamento pela presença alheia.
-Ok, isso aqui é bonito demais. -Ele sufocou-se com o coração disparado ao ver o pequeno sorriso nos lábios enquanto ela falava.
O tom do cabelo dela estava mais brilhante embaixo da luz do jardim, uma auréola dourada. Ele não pôde evitar observar o rosto expressivo e muito menos quando a viu rir de uma das figuras pequenas perto dos jarros nas prateleiras. Estava sendo estranho, percebeu, mas não conseguia não olha-la.
-Esses são fofos. -Ela falou, olhando por entre os objetos de decoração.
Parecia um zoológico de porcelana, onde as lontras tinham pequenas mudinhas em seus jarros, os hipopótamos tinham ervas para chás e em girafas coloridas haviam suculentas. Após tocar em alguns galhinhos, ela ficou satisfeita de saber que estavam fortes e pela terra que saiu em seus dedos percebeu que estavam hidratadas. O aroma dizia que elas eram bem amadas, principalmente as azaleias, as pétalas rosadas mais escuras na luz do jardim.
-Estão lindas. -Os comentários continuavam baixinho. -Elas devem ser muito paparicadas. Vocês andam conversando muito? -Zack se sentou, não sabia se ela falara consigo, por isso ficou em silêncio. Ele deduziu pela forma como ela estava vidrada nas plantas, que não era pra ele a pergunta.
A necessidade de ir até a mais nova era grande, mas ele raciocinou seus atos, como se estivesse vendo os próximos segundos, caso ele se aproximasse dela agora. "Não chegue perto. Vou embora, me deixe em paz." frases prováveis, onde lá se iria mais uma chance de conversar com a garota, indo junto da garota.
Ele secou as mãos na calça, esperou a outra terminar sua inspeção, a observando, tentando não parecer um louco stalker, mas também não sendo exatamente sutil. Quando Lais virou para olha-lo ele tomou um pequeno susto e mudou a posição no sofá, desconfortável por ser descoberto.
-Vai ficar aí caladão? -Isso também. Ele não poderia ficar em silêncio.
-Vi que você gosta de botânica. -Engoliu a saliva em conjunto com seu nervosismo, decidindo então cruzar as pernas. Por fora passou o ar de desinteresse, relax, muito composto. Lais quase riu da fachada, mas se manteve firme.
Ele se lembrava de como a ruiva fora a primeira a conseguir deixar viva as begônias do jardim do colégio. Ela sorriu para a professora e dissera que era sua melhor habilidade, cuidar de flores, vê-las brotar e desabrochar em seu maior vigor. Zack soube naquele momento que ela seria a melhor aluna no colégio, não apenas por sua inteligência, mas por sua paixão. Ele não errou.
-E me trouxe para um jardim decorado. -O sopro do riso alheio, fez o garoto balançar as pernas, ele pareceu contente.
Quando ela se virou para ele, o rapaz perdeu a linha de raciocínio e apenas a observou se aproximar, ela se sentou próxima no sofá, e o viu lhe olhar intrigado. Todos os nervos do rapaz estavam ligados e centrados na proximidade da outra, ele sentia o calor dela, mais forte que o ar quente da noite.
-Você é amigo da dona da casa? -Perguntou Lais, lançou os cabelos por cima do ombro.
Zack lembrou de Juan, e de como ele fora subornado para se aproximar da garota naquela noite. Lais não deixou passar a pequena mudança em seu rosto, antes dele lhe sorrir de leve e se virar um pouco no sofá para lhe encarar melhor.
-E sou amigo do dono, ele mora com uns colegas de universidade. Eu o ajudei a organizar esse jardim faz uns meses. -Ele estava tentando não ficar mais fascinado com a imagem da outra. Seu corpo tinha curvas que ficavam proeminentes acima dos puxadores do cinto, suas coxas não deixavam um espaço livre. Ele estava ficando desnorteado, só de pensar na sensação de sua pele, seu calor.
-Entendi. -Lais observou o jardim mais uma vez, tentando imaginar o outro naquele ambiente.
Olhou mais uma vez o conjunto, as luzes penduradas nas paredes, as flores coloridas, os jarros de um verde claro e as estantes brancas o sofá pequeno e de couro marrom parecia se combinar com o gramado verde. Quando a outra voltou a observar o rapaz, o viu visualizar as estrelas com interesse.
-Esse seu amigo foi o responsável pelo suborno? -Zack riu com a percepção da outra, e suspirou.
A ruiva apoiou as penas em cima do sofá e os braços em seu encosto. Quando ela deitou a cabeça em cima dos braços e lhe observou com os olhos claros, o moreno se sentiu movido. Respirando pesado, se levantou em súbito.
-Se importa se eu fumar? -A voz pesada do outro fez a menina se perguntar o que tinha a ver com os vícios dele.
Zack alcançou, em sua jaqueta jogada no braço do sofá, seu maço de cigarros e ao colocar um filtro nos lábios o acendeu com um isqueiro. Ao tragar uma vez, ele esperou um momento para então soltar a fumaça. Estava quase menos pirado agora, mas a sensação de descontrole voltava em pulsações ao lançar olhares para a outra.
-Como é estar viciado? -A voz dela saiu engraçada, o rapaz lhe olhou com um pequeno sorriso, mas a expressão estava pesada.
-É complicado. Complexo. É como estar... É como estar muito próximo de algo e saber que aquele é seu porto seguro. Acontece algo legal, eu sei como completar a satisfação. Ou sei lá... Uma merda... Eu sei o que me deixa melhor. -Ele apenas soprou as palavras, tentando, mas sem saber como explicar.
-É como segurar algo bom, mas não poder pegar algo ruim. Pra mim é bastante engraçado, pois eu sinto uma ansiedade absurda sem, mas eu me sinto tão relaxado com isso. -A voz de Zack se esmaeceu no final, sucumbindo a sua analise.
A outra observou a face séria dele, que dava bastante peso em suas palavras. Zack parecia, de forma considerável, mais calmo naquele momento, mas não era como se estivesse de fato tranquilo. Lais analisou o que ele dissera e não perdeu a sugestão. Completou consigo, em uma teoria, de que o moreno estava nervoso com sua presença, precisando de um alívio, mesmo que químico. Era um pouco perturbador e a ruiva não sabia o que fazer com a informação, pois suas intenções eram um tanto cruéis. Por um segundo ela hesitou, mas não pôde evitar e soltou um riso alto, o que desencadeou uma série de gargalhadas. Zack ficou em dúvida por um segundo, mas se entregou a um sorriso também.
Ele não sabia do que exatamente com o que ela estava se divertindo, mas ficou observando ela se encher de sorrisos. Era uma eletricidade estranha, que fez o garoto tragar mais uma vez, forte, direto para seu amago, onde ardia. Lais nada viu com as lágrimas nos olhos, se apoiando com uma mão no sofá e voltando a cruzar as pernas no couro. Se esticou e suspirou, a crise súbita de risos se esvaindo, e a confusão crescendo. Ela se perguntou o que exatamente fora o gatilho, talvez a forma como ele fala? Ou como ele banca o bad boy? A ruiva fungou e sorriu, se voltando novamente para o outro.
-Suas respostas são bem detalhas. Adorei. -Disse Lais, erguendo as sobrancelhas e lhe apontando um dedo.
-Desculpa. -Falou, com um sorriso por trás do cigarro.
-Não se preocupe, tô só brincando. -Despachou Lais com um abanar das mãos, seu peito ainda cheio, pesado das risadas.
O mais velho lhe olhou com a face séria, e pensou em como aquele momento era talvez um em poucos. Por mais que ele repetisse aqueles exatos segundos na cabeça, lhe dizendo "É real, é real", ainda era como um devaneio, um sonho. Aquele tipo de sonho tão real, que com o tempo você passa acreditar que aquilo aconteceu na vida real. Ele estava em um paradoxo, e precisou respirar mais uma vez, se enchendo com o prazer. Questionou-se o que lhe fazia ter aquela visão, talvez o começo? A trajetória, talvez... Ele não podia nem dizer como fora o exato começo, só podia dizer que estava desde sempre em um embate com a outra. Era cansativo, mas ele passou a fazer sem nem se importar.
O momento em que se contenta na noção, talvez a razão surgisse, lhe fazendo perceber que o que ele sentia, não era o que dizia. Uma fachada, que por algum motivo, por alguém, montou. Não lembrava mais, a algum tempo esquecera. Há muito tempo se arrependeu, mas então quando percebeu, já não mais estava incitando, mas sim se defendendo com contra ataques. Guerra boba era isso para ele. Lais discordava, tanto que quanto mais se via no caminho de Zack, menos queria estar distante, do outro lado de qualquer calçada que ele passasse. Era normal, já era comum.
-Bem, eu sinto que devo pedir desculpas por tudo que eu disse e fiz. Não foram coisas legais. -As palavras saíram tão sinceras que o fez sentir o calor na face, os olhos mirando um ponto qualquer dentre as flores.
Laiz ficou em silêncio por um tempo, apenas lhe observando e se perguntando o que toda aquela situação queria dizer. Onde vamos parar? Ela se questionou, deu um sorriso, abaixou a cabeça e começou a desenhar círculos em sua calça. Ela tentou pensar por cima de tudo, e por algum motivo não conseguia deixar de ficar confusa consigo, e com ele.
-O que você fez? -Sua voz se sobrepôs, parecendo muito desconexa com o som da festa ao longe.
-Eu estou falando sério. -Zack franziu a face, sem compreender.
-Eu também. Até que você termine de tentar se provar um bom samaritano, como está tentando fazer, estamos em trégua. -O sincero cansaço no rosto de Lais, deu um vislumbre a Zack que ele nunca pode ter.
Ele se sentiu perdido, absorto nas sensações, que se assustou quando percebeu que havia dado um passo na direção dela, pronto para ir até ela. Ele se embaraçou por conta do impulso e fingiu estar apenas se acomodando com as costas na parede, baixou os olhos para o gramado. A palavra alheia passou pelo outro diversas vezes, e ele tentou leva-las até o coração. Foram bem acolhidas quando chegaram lá, abraçadas e aquecidas. Ele era fácil, aquilo lhe deixou com uma estranha felicidade.
-Não estou te perdoando, você foi um tosco. - Com isso Zack suspirou e riu sem sentir o humor.
Sua cabeça balançou em concordância, se lembrando como poderia ter sido por muito tempo, petulante, infantil e disfarçado seu interesse em alfinetes. O que poderia ter pinicado em Lais, algumas dessas vezes.
-E outra, você me prometeu um carteado. -Zack podei começar a sentir que estava oficialmente em uma trégua, e evitou retorcer os lábios. Levou o cigarro à boca, a tempo de cobrir os lábios, não querendo que a outra visse.
-Bem, eu posso encontrar um baralho. -Lais o viu soprar a fumaça, e então sorrir com travessura.
(Continua)
Comments (0)
See all