— Você fez o quê? — Caio está piscando embasbacado por trás das lentes.
— Eu bati uma pensando no Hugo e me sinto mal por isso. — jogo as mãos para trás e apoio o peso nelas enquanto me sento na cama de casal de Caio.
— Não acho que seja algo ruim. Tipo, não entendo esse tipo de atração, mas acho que tudo bem batermos uma para alguém com quem queremos ir pra cama. — ele parece relaxado e quase me esqueço que Caio nunca se sentiu atraído por alguém dessa maneira. Ele sempre é tão aberto e conseguimos falar sobre tudo que, suspeito bastante, ele já conseguiu todas as respostas do universo que alguém precisa ter para viver uma vida leve e contente. — Porém, você se sente culpado por que é muito mais do que isso em jogo, certo? — ele substitui a pose relaxada por um olhar intenso.
— Sim, é mais do que apenas querer transar com ele. Eu acho que estou... — não consigo terminar a frase e somos interrompidos quando Luna empurra fortemente a porta e causa um barulho muito alto.
— Cá, você viu meu colar? Não tá em lugar nenhum e me lembro muito bem de ter usado ele ontem à noite enquanto víamos Netflix. — ela se aproxima da cama e começa a revirar, me afasto, dando espaço e, em questão de segundos.
— Aha! Achei. — ela joga a cabeça pra trás, afastando os longos cabelos escuros do rosto e coloca o colar. É mais um pingente, apenas uma linha negra com uma folha de pau-brasil, acompanhada de um pontinho vermelho no meio, na ponta. — Bem, temos vinte minutos antes de mamãe nos levar para escola. Então desembucha, Urizinho. O que te trouxe aqui hoje tão cedo ao invés de nos esperar em sua casa? — ela se senta em uma almofada no chão.
— Hugo me mandou mensagens ontem. Conversamos por um tempo e... — respiro um pouco. — acabei me masturbando pensando nele.
— Uau. — Luna dá um sorriso de lado. — Um mini pervertido. Mas e daí? Pra que tanto alvoroço?
— Ele está se sentindo culpado porque ele pensa no Hugo como muito mais que alguém pra foder. — a maneira de Caio dizer foder foi engraçada. — Acho que ele está se ...
— Ainda não tenho certeza. Pode não ser nada. — corto antes que ele termine e acabo recebendo um olhar zangado. Caio odeia que as pessoas não esperem a sua vez de falar.
Luna começa a cantarolar trechos de alguma música da Maria Gadú, mas não me lembro o nome. Caio fixa os olhos para frente, me ignorando e interrompendo a fria repreensão. Ficamos todos esperando o momento passar sem nos pronunciar. Todos sabemos que não pode não ser nada. É alguma coisa. A ideia de ver Hugo hoje foi o que me tirou da cama tão rápido e, ao mesmo tempo, desejo apenas correr para longe a ter que encará-lo depois do que eu fiz ontem. Não é algo para me envergonhar, eu nunca me senti envergonhado antes, com nenhum dos meus antigos namorados, mas me sinto agora e nada que eu diga me faz ver a situação com outros olhos.
Luna interrompe o canto, agora acompanhado de batucas, e me encara de maneira entediada, apoiando as mãos para trás e jogando a cabeça para o lado.
— Por que é tão difícil admitir isso pra si mesmo dessa vez? — Caio também volta sua atenção para mim e Luna continua. — Quando aconteceu com o Jorge e depois com o Rafael você aceitou tudo de boas. Esses namoros não foram tão ruins ao ponto de fazer você querer se fechar não, né?
— Não acho que esse seja o caso, Lu. Eu só não sei se estou mesmo... — novamente essa palavra aparecendo. Merda. — Ah, sei lá! Com o Jorge e Rafa foi algo mais mecânico, sabe? Estávamos ficando, eles me pediram em namoro e eu aceitei. A mesma coisa, nas duas vezes. Pensei que o próximo namoro seria mais ou menos assim também. Mas nem sequer fiquei com o Hugo e já parece que estou ... — por que era tão difícil externar isso em voz alta? Esse tambor não ritmado que saltava do meu peito. Um barulho que, desde que conheci Hugo, me acompanhou para todos os lugares. Será que essa inquietação é muito mais que um desejo? Será que estou mesmo...
— Apaixonado? — foi Caio quem falou em voz alta primeiro. Acho que ele não vê isso como grande coisa, já que não compreende muito bem o que é amar alguém romanticamente.
— É. Apaixonado. Não acredito que eu esteja apaixonado. Nós mal nos conhecemos. — dizer isso em voz alta pareceu tornar tudo o que eu sentia ainda mais real, acho que não posso correr dos meus sentimentos, não importa o que eu faça.
— E lá vamos nós. — Luna se levantou e tacou a almofada em mim, segurei ela entre os braços, amenizando o impacto. — Garotos. Sempre complicando tudo. — ela não gostava de garotos, sempre se deu melhor com meninas, então, desde sempre, ela aproveitava as ocasiões pra dizer algo depreciativo sobre os caras. — Não é como se você estivesse indo se declarar pra ele nem nada, né? — suas mãos passam sobre a camisa amarrotada, deixando a lisa novamente. — Apenas aceite e continue conhecendo o Hugo para ver se seus sentimentos vão e frente e serão correspondidos ou não.
— Parece simples, colocando dessa forma. — Caio se levantou também, colocando a mochila nas costas e ajeitando o cabelo que caia sobre os olhos.
— Parecer, parece. Mas não acho que seja. — minha voz saiu como um resmungo e me juntei a eles, descendo as escadas. — As coisas parecem muito mais reais dessa vez.
— Porque talvez elas sejam, Urizinho. — Luna passa a mão pela minha cabeça de um modo zombeteiro. — Vamos, mamãe deve estar na garagem. — nós três passamos em sincronia pela grande porta de entrada e vamos em direção a garagem.
Meu peito volta a ficar inquieto e sinto o suor nas minhas mãos. Estou apaixonado e completamente atraído por Hugo e, pelo que sei, tem uma boa chance de que ele também goste de mim. Entro no carro, cumprimento minha tia de uma maneira distante e logo me perco em pensamentos. Para onde minha relação com Hugo está caminhando?
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