A rua detrás da Night Cave estava deserta naquele horário, a rua estreita com aquelas grandes latas de lixo não tinha movimento de carros e vez ou outra passava um pedestre por ali. As paredes atrás de Faith eram cobertas por velhos cartazes colados uns sobre os outros indicando atrações antigas da Night Cave e de outros pontos da cidade, a iluminação era boa, mas, o jogo de sombras por estar em meio aos prédios da cidade fazia com que a rua aparentasse ser mais obscura do que realmente era. Era ali que Faith gostava de esperar por Nicholas, era ali onde ela costumava se alimentar antes de finalmente ir para casa.
23h45min
Faith já impaciente viu o Ford Crown Victoria Ano 2006 amarelo de Nicholas entrar na rua e parar bem próximo a ela. O vidro do carona abaixou-se e ela pôde ver Nicholas.
_ Fala Faith! – Disse Nicholas sorrindo ao vê-la.
_ E aí Nick? – Faith se curvando debruçou-se sobre a janela do carona. – Muito trabalho?
_ Aí moça! Vai passando o celular e a carteira! – A voz de um homem em tom ameaçador interrompeu a conversa e antes que Faith se movesse ela sentiu o cano de uma arma em suas costas, pouco acima da linha de sua cintura.
Nicholas e Faith ficaram sem reação. Não tinham percebido a aproximação do homem de touca escura na cabeça.
_ E você aí! Fica de boa! – Disse o homem se dirigindo a Nicholas.
Faith olhou rapidamente para suas pernas para identificar ao certo a posição do homem que estava atrás dela. Então em um rápido movimento Faith usando sua prótese, deu um forte pisão no pé direito do assaltante.
_ Filha da p... – Gritou o homem. Mas, antes que terminasse seu insulto, Faith aplicou uma forte cabeçada para trás, atingindo o nariz do homem que só fez gemer de dor ao ter seu nariz atingido de maneira tão inesperada. Para completar, Faith girou sobre a prótese e aplicou um forte soco com as costas da mão no rosto do bandido fazendo-se ouvir um estalo do impacto do golpe, jogando-o contra a parede e fazendo-o cair sentado e inconsciente no chão.
Faith observou o homem desacordado esperando alguma reação por parte dele, mas, ele ficou imóvel com o sangue gotejando de seu nariz.
_ Sua sorte é que eu tenho trabalho a fazer. – Disse Faith enquanto jogava seu cabelo por cima do ombro e soprava sua franja tirando alguns fios que ficaram desarrumados.
_ Às vezes eu me esqueço de que você brigaria com a Ronda. – Disse Nicholas já fora do taxi observando Faith e o bandido apagado e arma jogada no chão.
_ Com quem? – Perguntou Faith curiosa por não reconhecer ou se recordar de imediato de quem era a tal Ronda.
_ Procura na internet depois... – Respondeu Nicholas nitidamente incrédulo com o desconhecimento de Faith.
Antes de ir, Faith observou na rua se alguém tinha visto alguma coisa, então ela percebeu um rapaz de jaqueta com capuz na cor branca que andava cabisbaixo como se não quisesse que fosse descoberto. Certamente ele tinha visto o acontecido, mas, agora fingia total desconhecimento da situação.
Faith discretamente se abaixou e pegou a arma do bandido e entrou no taxi.
_ O que vai fazer com isso? – Perguntou Nicholas. – Você me disse que não as usava...
_ E não uso. – Respondeu Faith colocando a arma no porta-luvas. – Depois arruma para algum parceiro seu. Sei lá...
_ Sabia que se a polícia me pegar com essa arma aí eu estou meio enrascado.
_ Então joga ela fora em algum lugar...
_ Podia simplesmente ter deixado ela lá.
_ Para aquele babaca tentar assaltar mais alguém?
_ Isso é você bancando a heroína?
_ Nick...
_ Oi?
_ Dirija!
_ Sim senhorita! Para onde?
Faith passou o endereço para Nicholas e logo estavam a caminho do lugar.
_ Então o que vai ser dessa vez? – Perguntou Nicholas quando já estavam afastados da Night Cave. A arma já tinha sido jogada em uma lata de lixo. Não sem antes ter suas digitais limpas.
_ Recuperar uns documentos.
_ Tente não voltar toda arrebentada de novo. – Nicholas se referia à vez do cemitério onde Faith foi atingida por disparos de arma de fogo.
_ Acredite! Esse é o plano!
_ Você precisa tomar mais cuidado nessas suas missões.
_ Eu sei me cuidar Nick.
_ Só estou dizendo para você não se arriscar demais a ponto de se ferir gravemente.
_ Não posso ficar me preocupando com isso Nicholas... Quando recebo uma missão é preciso cumpri-la até o final.
_ Sua lealdade pode te matar um dia sabe?
_ Eu sei... Mas, morrer em missão é o meu destino... – Nem Faith acreditou no que ela mesma disse.
_ Credo Faith!
_ Eu não quero morrer Nick... Mas, como você mesmo disse, um dia eu vou me foder de verdade durante alguma missão.
_ Então Faith... – A voz de Nicholas soava preocupada. – Se ver que não vai dar é melhor recuar...
_ Se der eu recuo... Não sou de correr de uma briga.
_ Tem hora que é melhor fugir para ter a chance de lutar de novo...
_ Não consigo correr só com uma perna Nick... – Respondeu Faith em tom de brincadeira e sorrindo para Nicholas que a olhou com descrença.
_ Porra Faith!
_ Não precisa se preocupar Nick. – Faith voltou a falar sério. – Não tenho planos de morrer tão cedo!
_ Eu aqui falando sério e você de gozação... – Resmungou Nicholas em voz baixa, mas, não o suficiente para que Faith não lhe ouvisse.
_ A gente mal se conhece e você fica nessa preocupação. Eu sei que o senhor Simons mandou você ficar de olho em mim, mas, não precisa ficar pilhado não.
Nicholas por um momento tirou os olhos do trânsito e olhou para Faith, ele parecia querer dizer alguma coisa, até esboçou as primeiras palavras...
_ Deixa quieto... – Disse Nicholas por fim e voltou os olhos para o trânsito. Já estavam se aproximando do porto onde Faith teria de realizar sua missão.
_ Que foi? – Faith percebeu que Nicholas queria dizer algo e ela queria saber o que era.
_ Nada...
_ Sério Nick! O que foi?
_ Estamos chegando... Vai querer que eu pare aonde?
_ Nicholas! O que você ia dizer? – Insistiu Faith.
_ Nada importante...
_ Se não é importante, fala então!
_ Não quero te atrapalhar Faith...
_ Então fala logo para eu não ficar pensando nisso a noite toda!
_ E faz diferença para você?
_ Talvez... Se não me contar eu não saberei!
Nicholas começou a dirigir mais devagar, contornando a região. Era possível ver fileiras de contêineres e galpões ao longo da região portuária. O transito ao redor era rápido, mas, ainda sim movimentado. Pelas ruas, poucas pessoas caminhavam, mas, em sua maioria eram moradores da região, a parte viva e movimentada de Chicago começava há algumas quadras dali.
_ Sabe Faith... – Nicholas falava em voz baixa, como se evitasse ser ouvido por mais alguém. – Não fico falando essas coisas porque o senhor Simons mandou. Ele me mandou te auxiliar e não te espionar ou lhe proteger de alguma forma.
Faith não disse nada. Ficou observando o porto pela janela, mas, ouvia atentamente as palavras de Nicholas.
_ Nos conhecemos faz pouco tempo, mas, apesar de você ser o que é... – Nicholas fez uma pausa. – Digo... Eu acho que às vezes você não se preocupa com sua vida e se entrega demais às missões que lhe é dada.
_ Pode parar ali na frente... – Disse Faith indicando um lugar onde a avenida passava sob uma ponte e a iluminação era mais fraca.
Faith tentou não demonstrar, mas, Nicholas percebeu que ela queria que ele continuasse a falar...
_ Simons tem sorte de ter você trabalhando para ele. – Continuou Nicholas. – Você se dedica e se arrisca demais por ele. Mas, eu acho que às vezes você deveria se preservar mais.
Nicholas estacionou o carro e desligou o motor. Ele não disse nada ao parar e ficou olhando para frente como se esperasse algo. E ele esperava...
_ Obrigada Nick... – Disse Faith enquanto abria a porta. – Eu vou me cuidar.
_ Te espero aqui mesmo?
_ Pode ser... Se quiser ir para um local mais movimentado. Eu te ligo quando terminar.
_ Tem um quiosque de comida oriental mais à frente. Vou aproveitar e jantar de uma vez.
_ Aposto que vai comprar a mais para levar para viagem... – Respondeu Faith fechando a porta.
_ Pode ser... Você não vai querer né? – Brincou Nicholas.
_ Fica para outro dia Nick... – Respondeu Faith, também em tom de brincadeira.
Nicholas deu partida em seu taxi e lentamente se afastou do local onde deixou Faith que por sua vez, começou a estudar o local onde estava. A região do porto estava fechada e ela sabia que poderiam ter alguns guardas no local. O que não era realmente um problema, já que seus poderes vampíricos eram justamente para situações como aquela.
Enquanto andava procurando um melhor lugar para entrar e localizar o galpão onde o encontro iria acontecer, Faith pensava na conversa que acabara de ter com Nicholas. Em sua mente ela não compreendia o porquê da preocupação de Nicholas, eles nem se conheciam há tanto tempo assim e ela nem fazia nada para que ele tivesse alguma consideração com sua pessoa. Mas, mais ainda, ela pensava sobre até onde sua lealdade ao senhor Simons iria. Ela morreria por ele?
Faith não tinha certeza de sua resposta... E isso a preocupava.
Uma moto esportiva passou pela avenida em alta velocidade e o som alto do motor acabou por assustar Faith e tira-la de seus pensamentos de até aonde ela iria pelo seu senhor.
“Não tenho tempo para pensar nessas besteiras... Não preciso morrer pelo senhor Simons. Só preciso cumprir o que ele deseja de modo seguro...”
E com isso ela terminou sua reflexão interna e voltou toda sua atenção para sua missão.
Aproximando-se da guarita. Faith percebeu que havia apenas um guarda ali. Uma cancela eletrônica impedia a entrada e saída de veículos na região do porto. Mas, não havia um portão ou algo assim.
“Fácil...”
Faith sabia que no interior, mais guardas deveriam estar patrulhando o local e sabia que ao menor sinal de perigo o guarda da portaria comunicaria os outros guardas e possivelmente a polícia.
Mas, Faith não precisava chamar a atenção do guarda, ela precisaria apenas passar despercebida e ativando seu poder de furtividade sobrenatural, ela passou esgueirando-se pelas sombras e entrou na região do porto sem que o guarda da guarita desprendesse sua atenção do programa que ele assistia no pequeno televisor enquanto bebia de seu café quente.
“Agora é achar o tal galpão...”
Mesmo sem ter chovido há alguns dias, o chão asfaltado de toda a região do porto estava molhado refletindo as poucas luzes amarelas que iluminavam de forma ineficiente o local, criando jogos de sombras por entre os inúmeros contêineres, guindastes e os grandes galpões. Faith se movia lentamente mantendo-se em sua ocultação sobrenatural enquanto procurava o galpão onde seria o encontro. Enquanto esgueirava-se pelos corredores formados pelos contêineres ela aproveitava para acumular o máximo de informações sobre o local, como rotas de fuga e a vigilância seja ela eletrônica ou humana.
Câmeras de segurança, ela reparou somente nas proximidades dos galpões, mas, nem todos tinham este tipo de segurança.
“Certamente o local da reunião não terá vigilância eletrônica... Se tiver é muito provável que esteja desabilitada durante esta noite... Mas, de toda forma é melhor eu tomar cuidado para não ser filmada...”
Como era de se esperar Faith logo concluiu que o local tinha uma pequena equipe de guardas noturnos, não mais que meia dúzia. Dois ou três patrulhavam enquanto um ficava na guarita da portaria, além disso, ela localizou uma sala iluminada que era onde um ou dois guardas descansavam, ou lanchavam.
“Os guardas parecem entediados e desatentos... Provavelmente eu consiga localizar o galpão sem muitas dificuldades.”
Escondendo-se nas sombras, enquanto evitava os olhos dos vigilantes noturnos e o raio de visão das câmeras de vigilância, Faith foi seguindo o mapa enviado por Simons até encontrar o galpão onde aconteceria a reunião. Era um lugar grande com muitas janelas na parte superior, pelo menos há uns 2 metros e meio do chão. A enorme porta parecia trancada e como Faith suspeitou, não havia câmeras de vigilância.
“Meia Noite.”
Ainda se esgueirando, Faith se aproximou de um carro sedam preto que estava estacionado bem próximo ao local. Colocando a mão sobre o capô e sentindo o calor contido nele, Faith pôde constatar que aquele veículo tinha acabado de estacionar por ali. Certamente seria de dos grupos que realizaria a troca.
“Nada de útil.” – Pensou Faith ao espiar o interior do carro e não ver nada que pudesse lhe trazer algum tipo de vantagem.

Comments (0)
See all