— Diana Evanora, sabemos que está aí dentro. Saia agora e nem ouse usar magia — ordenou uma voz masculina, em tom ríspido, após algumas batidas na porta.
— Não sabia que estava sendo procurada. Belo nome, inclusive — comentou o conglomerado com um sorriso no rosto. Diana, porém, não prestou muita atenção à fala: naquele momento, estava tentando pensar em quem poderia estar atrás dela, e, claro, como escaparia dali.
— Devolve meu corpo. Rápido. — Ainda não tinha certeza do que iria fazer, mas independentemente do que fosse, precisava estar no controle de si em primeiro lugar.
— Ah, eu não o roubei. Como eu disse, sou apenas magia, não um espírito. Você é quem precisa voltar para ele — respondeu o conglomerado, sem parecer muito preocupada com toda a situação.
Diana começou a tentar se mover em direção a ela, mas a porta do quarto caiu, e os magos entraram. Usavam mantos negros com uma letra bordada no peito.
Um símbolo que a bruxa conhecia muito bem.
— O Conselho — declarou, se preparando para o pior.
Durante todos os seus anos no Conselho Mágico, mesmo que Hadria admitisse que não era tanto tempo, já havia presenciado diversas discussões e momentos de bastante tensão entre os representantes das famílias da alta hierarquia das Terras Mágicas, durante reuniões e eventos para discutir assuntos políticos.
Entretanto, jamais havia visto tamanho caos no grande salão como aquele que testemunhava agora.
Quase todos falavam ao mesmo tempo, sem que fosse possível distinguir qualquer voz em meio à grande confusão.
Em determinado ponto, porém, uma se sobressaiu às demais.
— Façam silêncio. — A voz de Aurora soou como um poderoso trovão, e todos se calaram de uma só vez. Como uma das feiticeiras mais respeitadas de sua geração, pouco se pronunciava durante as reuniões do Conselho, e nem mesmo comparecia a boa parte delas. Mesmo assim, ninguém a questionava, e nem poderia. “Mais do que medo ou respeito, poder”, pensou Hadria, lembrando-se das palavras do pai sobre a mulher.
Se fosse sincera, nem a jovem entendia o porquê de Aurora estar presente dessa vez, mesmo sendo uma reunião de emergência. Mas que bom que estava.
— Por favor, senhorita Merlin, prossiga — disse ela, encarando a maga diretamente. A jovem estranhou ser chamada dessa forma, mas fez um gesto de agradecimento e seguiu, devido às circunstâncias.
— Eu fiquei tão espantada quanto vocês estão agora. — A feiticeira fez uma pausa, observando com atenção as reações dos outros representantes, e então continuou. — Mas tenho motivos para acreditar que é um futuro evitável. Se nós...
— Um momento, minha cara Hadria — começou Cello, cortando a fala da mais nova. — Quando disse que teve essa visão?
— Ah, bom. Hoje mesmo, mais cedo.
— E o que estava fazendo no momento que teve a visão? — Cello normalmente era um dos que mais descreditava Hadria, e fazia questão de não demonstrar respeito algum por ela. A garota já ouvira boatos de que ele havia questionado inúmeras vezes quando encontraram as provas de que ela era herdeira de Merlin, e que mesmo depois não chegou a ficar totalmente convencido. Era natural esperar que também questionasse sua história.
— Eu estava... tentando ter visões. Já se tornou quase um hábito. Mas deu certo pela primeira vez. — A maga pôs as mãos atrás das costas, segurando firmemente uma à outra. Sabia o que viria a seguir, e precisava ser forte para não se deixar abalar.
— Hmmm, deu certo mesmo? Ou você só quer muito acreditar nisso?
— Perdão?
— Veja bem, há oito anos que está neste Conselho, e não acho que tenha grandes feitos além de exibir o nome de Merlin a torto e a direito. Também nunca conseguiu explorar sua magia antes, e em termos de relevância, mesmo pertencendo à família do “maior feiticeiro de todos os tempos”, você é quem menos contribuiu para as Terras Mágicas. — O olhar do mago já não estava em Hadria, e sim nos outros integrantes do Conselho. Seu discurso era para eles. Ele não queria só questioná-la, mas rebaixá-la e expô-la. Sorria debochadamente enquanto argumentava, e a feiticeira apertou as mãos com ainda mais força. — Você é jovem, e quando somos jovens, às vezes fazemos de tudo para ganhar reconhecimento. Pode ser desde uma demonstração de poder até talvez algo mais drástico, como por exemplo, digamos, convocar todo o Conselho e fazer um alarde dizendo que a magia vai acabar. — Agora, ele enfim se virava para ela, aguardando uma resposta. Hadria controlava a respiração, tentando se manter o mais calma possível, ou ao menos demonstrar isso.
Ela encarou os outros membros, e alguns assentiam com a cabeça, enquanto outros pareciam ponderar sobre o assunto. De fato, a grande maioria se mostrava inclinada para a versão de Cello da história. Nem mesmo Edna aparentava duvidar tanto do que ele dizia, e isso doeu no coração da feiticeira.
— Não é isso. — Foi tudo que conseguiu falar no primeiro momento. O sorriso do representante da família Sonus se tornava ainda maior, como se tivesse acabado de fazer uma grande jogada no xadrez. Hadria precisava se defender. — Em minha visão, o grande salão era preenchido por chamas, e Draco era morto por uma grande serpente.
Um novo burburinho surgiu. Draco era o primeiro dragão, reconhecido como entidade e pai da magia. Para um bom entendedor, uma visão que mostrasse sua morte em um salão incendiado poderia significar o fim dos tempos para todo habitante das Terras Mágicas. E a serpente, é claro, representava uma traição.
— Prove — sibilou Cello, após alguns segundos. — Não teve testemunha alguma da sua visão, além de si própria, estou certo? Então prove que foi isso que viu.
— Eu posso provar — declarou Hadria, no impulso, atraindo o olhar de todos e fazendo os murmúrios cessarem. Ela mesma estava surpresa com a própria resposta, mas não queria ceder. O sorriso do feiticeiro se desfez pela primeira vez desde que havia começado a questioná-la. — E assim o farei.
— E como pretende fazer isso? — indagou Cello, legitimamente surpreso.
— É bem simples — respondeu, já começando a se arrepender. — Terei a visão de novo. Aqui e agora.
Autoria: Pedro Peixoto
Revisão e preparação: Luisa Peixoto
Título tipografado: Pedro Peixoto
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