— Sim, mãe. Eu já entendi, não é para voltar tarde. -Tayná falou em tom de reclamação.
— Vê se você se enxuga direito quando sair do clube. Não quero você resfriada.
— Okay, mãe!
Tayná já estava saindo pela porta quando a mãe a parou e mandou ela voltar.
“De novo isso.”, a garota voltou para dentro de casa. Parou em frente a mãe já esperando pela correção na vestimenta. A mãe mandou ela tirar o casaco e o amarrou na cintura da filha.
— Agora você pode ir.
— Até mais tarde!
Assim que chegou na calçada, desamarrou o casaco e colocou de volta na parte superior do corpo. Raramente Tayná sai com o short esportivo colado no corpo sem a calça de moletom por cima.
“Quando eu estou com pressa e resolvo não me arrumar direito, ela me atrasa com essas bobeiras.”, a raiva chiou dentro da menina, “Várias outras pessoas saem assim, por que eu não posso?”.
A mãe de Tayná é religiosa, do tipo quase totalmente tradicional. Ela acha que as roupas da filha podem atrair coisas perigosas para si, além de considerar meio ofensivo e exibidas as roupas que ela usa para a natação.
A garota chegou ao Sesi sem muitos problemas, o instrutor tentou falar com ela para dizer algumas dicas do que ela poderia fazer e a garota o ignorou totalmente, apenas se preparando para entrar na piscina.
Ela nadou por cerca de uma hora depois ficou apenas boiando na água por bastante tempo. Ali no Sesi quase não tem ninguém a essa hora que ela vai e também no frio que tem feito, então a piscina é quase toda dela.
Tayná tem altos objetivos a cerca da natação, então ela treina todos os dias para poder alcançá-los e, também, porque ela considera isso melhor do que ter que estudar, então usa do esporte como uma desculpa para ficar mais tempo longe dos livros e a mãe acaba aceitando por ser algo bom de se fazer também.
Chegando em casa, a garota evitou a cozinha para não ter que falar com a mãe, com o pai ou com um dos irmãos e foi direto para o quarto dela, se espichou na cama e colocou os fones para assistir Bocchi The Rock, um anime que ela achou recentemente que é bem tranquilo e gostoso de assistir.
Ela é do tipo de adolescente que entrou de cabeça no mundo dos desenhos japoneses, até mesmo aprendendo uma ou outra palavra da língua e pesquisando mais sobre a cultura do local.
O quarto dela é cheia de pôsteres de anime e commissions que fez com alguns artistas que ela conhece do twitter. Desenhos como da Dyo (dyonisian_), quacknifico e _MiniMu. Ela encomendou tanto artes de shipps de animes que ela gosta quanto arte de personagem próprio.
Só depois de terminar dois episódios do anime, ela ouviu a mãe.
— Tayná Coelho Coutinho, se você não vier já aqui para jantar, eu juro que vou no teu quarto e te arranco daí a chineladas.
— Já vou mãe. - Tayná gritou em resposta e correu para a cozinha.
As jantas são feitas sempre me família na casa de Deolinda. Para ela é de suma importância ter esses momentos em reunião para que a família se sinta conectada.
Tayná chegou sob os olhos de julgamento dos dois irmãos mais velhos. O do meio cochichou algo para o mais velho e riu, isso depois de olhar para Tayná. Já o mais velho, olhou para ele com uma certa cara de julgamento.
— Tayná, senta aqui. - O irmão mais velho, Luiz, ofereceu o assento perto de si.
— Obrigada!
Apesar de Tayná achar irritante esses momentos com a família, o cheiro do ambiente por causa da comida da mãe, o pai falando de como foi no trabalho enquanto o irmão mais velho serve a comida para todo mundo e, até mesmo, em certa parte a implicância do irmão do meio com ela faz com que o ambiente seja no mínimo uma representação de segurança para a garota.
Hoje, em especial, o clima daquela copa está acolhedor, Deolinda fez lasanha e Tayná já sabe que vai reprovar o irmão mais velho e a mãe por colocar feijão nela. Mas, só de imaginar a cara de indignação do irmão do meio vendo os parentes fazerem isso, ela já quase morre de rir, porque parece que ele sempre esquece desse hábito.
— Você viram aquela cena da novela? - Deolinda perguntou.
— Qual? - Joaquim, pai de Tayná, indagou.
— Aquela feia das duas mulheres se beijando. Não precisava mostrar essas coisas.
— Mãe! Se a senhora acha beijo de um homem com uma mulher normal, então esses beijos também são normais. - defendeu Tayná.
— É diferente, filha.
— Diferente como?
— Não é normal.
— Também acho que não é normal. - O irmão do meio, João, ajudou a mãe.
Após falar isso, o irmão recebeu um olhar de fuzilamento da irmã mais nova do tipo “Eu vou te matar se você repetir isso.”, olhar que ela não pode dar para a mãe, mas que pode direcionar ao irmão por ele ser um babaca.
A janta seguiu com mais alguns estranhamento da não tão perfeita família comercial de margarina. Fazendo uma Tayná muito frustrada com João e Deolinda ir para o quarto irritada.
Algumas horas depois, o pai de Tayná, Alberto, bateu na porta do quarto dela, segurando uma caneca de chá de camomila e uns biscoitos de coco.
— Quem é?
— Seu pai.
— Entra.
— Com licença. - Alberto disse entrando pela porta tomando cuidado para não derrubar qualquer coisa no quarto da filha.
O homem se sentou na cama do lado da cadeira da filha, que fica na mesa de escritório, colocou o chá e os biscoitos em cima da mesa e apontou para eles com a cabeça.
— Obrigada!
— Por nada.
— O que o senhor quer?
— Eu só queria dizer para você tentar não ficar chateada com tua mãe, ela é meio cabeça fechada, mas é uma boa mulher.
— Não sei porque o senhor está dizendo isso.
— Por causa do que ela disse, que te afeta.
— Não me afeta, eu só acho errado julgar assim. - Tayná tentou disfarçar porque não é assumida e não quer ser forçada a sair do armário.
— Sei.
— E eu sei que mamãe já é velha, com seus cinquenta anos. Além de ser católica fervorosa, então eu só questiono para ver se ela entende. Mas quem me irrita mesmo é o João.
— Imagino.
— Como ele cresceu desse jeito?! Um jovem de vinte anos e tão mente fechada?!
— Eu não sei.
Os dois ficaram em silêncio por uns cinco minutos, então o pai de Tayná se levantou, colocou uma mão no ombro dela, apertou de leve e saiu do quarto fechando a porta como a filha pediu que ele fizesse toda a vez que fosse sair de lá.
A garota fez a mesma coisa que faz todo dia no resto dos dias da semana. Foi para a escola, depois para o Sesi e depois para casa. Mas no restante dos dias até chegar na sexta-feira, ela escolheu ficar quieta durante os jantares para não criar mais atrito com a mãe, então ficou escutando os absurdos de Deolinda e João sem fazer um único comentário.
Sexta-feira está sendo um dia tranquilo para Tayná. Como sempre, ninguém na escola falou com ela, no clube todo mundo passou meio longe dela.
De alguma forma, a garota conseguiu afastar todo mundo no ano que ela repetiu. Além da forma como ela age que às vezes assusta as pessoas em volta. Ela é muito decidida em suas ações, não gosta de muitos rodeios, na turma dela, espantou todo mundo por causa de conflitos em trabalho em grupo e fora da sala de aula, não interagiu com ninguém desde que entrou na escola.
A expressão que ela tem ao andar, a forma como ela fala diretamente tudo, faz com que as pessoas tenham receio de se aproximar. Mas Tayná não acha isso totalmente ruim, porque quer dizer que ela não tem que lidar selecionando pessoas boas e ruins de sua vida.
A garota nunca teve amigos, nem no fundamental. Nessa época as pessoas achavam ela estranha porque falava sozinha sobre personagens originais dela e ficava conversando e teorizando sozinha sobre desenhos que ela via. Isso fez um dos colegas dela espalhar um rumor estranho sobre ela e todos da época ficaram com receio de se aproximar dela.
Depois da aula, como todos os dias, a garota foi para o Sesi, nadar sempre a acalma depois de um dia de aula e a prepara para a janta em família e o estudo antes de dormir. Então virou um hábito diário.
Tayná passou muito tempo na piscina, percebendo que já está ficando tarde. Por volta de umas seis horas, ela decidiu ir embora. A família perfeitinha, não tão perfeita assim, não gosta que a filha de quinze anos fique fora de casa até depois das oito da noite, apesar da casa dela ser bem perto do Sesi, ela preferiu ir embora por volta do horário em que percebeu o tempo para a mãe não brigar por ela sumir por tanto tempo de novo.
Apesar de duas horas serem mais que o suficiente para chegar em casa, a garota sabe que vai se distrair com cada pedra que encontrar no caminho, ela sempre foi assim, então já está acostumada. Teve uma época em que ela começou a fazer uma coleção de pedras das que encontrava em sua frente por onde passava, mas a mãe a fez se livrar delas, porque não é coisa de garota juntar pedras, além da sujeira de terra que faziam, pelo menos foi o que a garota achou. A verdade é que a mãe mandou ela se livrar daquilo porque a menina queria arrancar paralelepipedos da rua para sua coleção e vendo que poderia virar um problema, a mãe cortou direto o mal pela raiz.
No caminho para casa, andando distraída enquanto olha para as casas com suas luzes noturnas já sendo acendidas, os postes se iluminando de acordo com que vai ficando escuro a cidade de Santa Mônica. Uma coisa que ela sempre achou uma charme dessa cidadezinha é que ela é relativamente grande, para os conceitos da garota. Tem tudo que ela precisa: cinema, Sesi, um shopping (ou pelo menos o que os moradores chamam de shopping, mas que alguém de uma cidade maior falaria que definitivamente não é), lojas de karaokê, lojas geeks, entre outras coisas que ela acha agradável.
Em uma área em que os postes ainda não tinham se iluminado direito, mas já estava escuro, ela viu uma luz forte se acender na rua, ainda não sabe o que é. A luz é do tipo que chama a pessoa para ir até ela.
O cérebro de adolescente muito ligada ao anime e que espera a todo momento sua oportunidade de virar uma super-heroína já gritou “É agora, nosso momento!”. Então reunindo toda a coragem e resto de energia do corpo depois de nadar por muito tempo, ela correu em direção à luz.
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