"Então… o trampo era esse: 'Mate o Demônio Buer que assola os viajantes na Floresta'. E, pelo visto, vocês cumpriram a missão. Qual o problema, Jay?"
"Pois é. Mas dá uma olhada nesse cristal. Olha bem."
Jay empurra o cristal para as mãos de Derek Firandr, o excêntrico mestre de guilda, um homem humano grande, de pele avermelhada e cabelos ruivos, lisos como uma cascata de fogo, que caem por um lado de sua cabeça, como uma juba selvagem e exuberante. No entanto, do outro lado, um corte mais ousado: uma área raspada , completamente sem cabelo, um contraste intrigante para sua abundante cabeleira flamejante.
Derek pega o cristal e olha de perto, usando um tipo de monóculo de lente vermelha e aro prateado.
"Hm… Realmente, parece diferente. Qual o tamanho que você disse que a criatura tinha, mesmo?"
"Pouco mais de seis metros. Talvez menos. Não fiquei medindo… mas, definitivamente, não é o que tá no folheto: 'aproximadamente dois metros de pura maldade e patas rodopiantes'."
"É, de fato. Aguenta aí. Me dá uns minutinhos que vou levar pro artífice analisar melhor e já volto."
"Beleza. Me paga um café pela espera, Derek, que tá de boa, hehe."
"Malandro… hahaha. Bob, traz outro café pro “pala" aqui."
Bastante extravagante, leal e justo, Derek Firandr é um velho conhecido de Jay. Um antigo aventureiro que assumiu o manto de mestre da guilda Febre Esmeralda, após eventos traumáticos que quase levaram ao fim várias guildas do reino.
Depois de algum tempo, Derek volta com o cristal em mãos, dizendo:
"Ok, Jay. Já falei com o artífice. De fato, a criatura era bem mais poderosa do que a informação que nos foi passada… Justo é justo, certo é certo. Vou te pagar quinhentos Auras a mais pela missão. Tá legal pra você, meu caro?"
"Hm… esperava um pouco mais, mas tá valendo. Não é uma grana ruim. Ficamos combinados assim então: esses quinhentos Auras a mais e café de graça aqui na taverna da guilda, fechou?"
"Hahaha. Adoro essa sua espiritualidade, Jay. Pode ser isso sim. Assim espero mais visitas suas, então."
"Boa, Derek, combinado! A Julie vai ficar felizona com minhas visitas mais frequentes, hehe."
"Não só a Julie, Jayzito."
Derek diz, olhando Jay com um sorriso malicioso. Jay olha sério para ele, mas logo deixa escapar uma risada leve, depois vira mais um gole de café.
"Você não mudou nada, não é Derek?"
Assim, os dois riem bastante e começam a conversar sobre o paradeiro do antigo grupo dos dois, até que são interrompidos pela entrada súbita de um estranho homem de manto negro na sede da guilda. Derek, então, vai até ele se perguntando o que o estranho homem poderia querer logo tão cedo.
"Bom dia, meu caro. Ainda estamos organizando a casa, mas sente-se. Vou pedir para lhe trazerem um café fresco."
No que o homem responde de forma ríspida e nenhum pouco amigável.
"Não quero! Estou aqui procurando algo que me foi roubado."
Ao ouvir essas palavras, Derek esconde rapidamente o cristal e Jay, sentindo as intenções malignas do homem, já procura em sua memória alguma prece para uma situação de urgência.
"E o que lhe foi roubado, meu caro bruxo?"
O bruxo, então puxa sua túnica um pouco para baixo, revelando uma abertura no meio do peito, dizendo:
"Parece que falta algo aqui, cavaleiro?"
"Hm… seu coração, talvez? Ou uma costela?"
"Não tente me fazer de tolo, cavaleiro. Você sabe o que nós bruxos fazemos para nos manter vivos. Cadê a criança? O cristal da minha besta está em seu bolso. Agora, me fale onde ela está que eu vou embora."
Jay percebe que o bruxo usou alguma magia de localização com o cristal, mas pelo visto não sabe o que houve na floresta.
Sendo assim, o paladino levanta-se de e vai até próximo de Derek, interferindo na conversa.
"Você sabia que bruxos não são bem-vindos no mesmo recinto de um paladino? Sugiro que pegue esse seu rombo do peito e vá embora daqui."
"Essa conversa aqui não lhe diz respeito, cruzado."
O homem olha fixamente para Jay, que o encara de volta, percebendo cada detalhe de seu rosto decrépito: a falta do nariz, os olhos negros e fundos, pústulas e feridas aparentes. Características que indicam que esse homem pode ser um bruxo muito antigo.
"A que nível vocês desceram agora, bruxo? Como um arauto da justiça, não posso deixar você sair impune, caso esteja fazendo algo nefasto!"
"Jay… relaxa, cara. Deixa que eu converso com ele… Conflitos são proibidos na cidade, esqueceu? Deixa quieto, senão vai dar ruim pra guilda."
Enquanto o encara, Jay teve certeza de ter visto um verme cair de dentro de uma das feridas do bruxo. Mesmo assim, continuou olhando-no firmemente.
"Hrm… Estarei de olho em vocês… Agora que conheço seus rostos."
Com essas palavras, o bruxo dá as costas, atrevessa a porta e segue andando até sumir da vista dos dois.
Jay e Derek se entreolham e Derek pega o cristal de seu bolso, dizendo:
"Tenho que despachar essa birosca logo. Esse bruxo não vai sair da nossa cola…"
"É. Não imaginava que ia acabar te trazendo problemas, Derek. Como os bruxos se tornaram aliados do Rei, tem bem pouca coisa que podemos fazer…"
"Pelo visto, esse demônio Buer era uma egrégora desse cara. Agora… De que raio de criança ele tava falando? Era da Layla? Ela não é uma criança até onde sei…"
"Layla… Céus!!! Melhor voltar pra casa já… Ela pode estar em perigo! Até mais, Derek!"
"Ei! Esp…"
Assim, Jay, sem pensar duas vezes, sai em disparada, conjurando seu fiel corcel de batalha, saltando sobre o animal em movimento. Puxando as rédeas com força ele dá um giro, usando uma de suas Bençãos para localizar qualquer mal próximo. Não avistando nada, ele dá outro puxão nas rédeas do animal e segue correndo de volta ao casebre.
…
Pouco antes de chegar próximo ao refúgio, Jay dispensa sua montaria e entra correndo afoito, encontrando Layla mordiscando a orelha da pequena elvanen, que ainda dormia profundamente.
"Mas quê p…?"
"Miaaaaau!! Que susto!!! E-eu posso explicar!"
"Não temos tempo pra isso… Depois você conta dessa tara estranha por morder orelhas de pessoas dormindo. Agora vamos vazar daqui, porque o bruxo que tava com ela me achou."
"Quê???"
"Vai, pega tudo o que puder e coloca aqui dentro da mochila, rápido! Vou pegar as armas, poções e o que mais tiver pra ajudar a gente. Esse bruxo é antigo, vai dar um trampo acabar com ele e não vai poder ser aqui perto da cidade."
"Miau!! Acho que não dá mais tempo…"
"Hein?"
Jay olha lentamente para trás, mas, antes mesmo de ver do que se trata, já sentia a presença do bruxo dentro de seu casebre, exalando uma energia sombria e vertiginosa.
"Você pensou que podia me enganar, cruzado? Aqui está sua punição por tentar fazer Eldreet de tolo! AARUMA LORANIR TORIS! Sintam a DISTORÇÃO ALUCINATÓRIA!"
Em um instante, todo o casebre começa a se distorcer estranhamente: suas janelas começam a expelir uma grande quantidade de chamas roxas. A única porta se tornou uma mancha disforme e todas as paredes parecem ter ganhado vida, movendo-se de forma quase orgânica.
Layla, não pôde se conter, caindo de joelhos enquanto vomitava sem controle. Jay se põe a frente dela e da pequena elvanen adormecida, olhando firmemente para o bruxo.
"Que olhar mais decidido, cruzado. Ninguém vai poder ouvi-los daqui de dentro. Pode gritar o quanto quiser… Isso me dará um imenso prazer, hahahahaha!!"
"Ninguém vai poder ouvir nada daqui de dentro… Muito bom. Eldreet, não é? Ótimo! Para que você não seja punido sem saber quem foi o responsável por sua penitência, sou Jay e… Isso é tudo que você tem que saber!"
Traçando oito selos, enquanto entoa um cântico sagrado, Jay conjura um solo sagrado sob os pés de todos ali, que rapidamente começa a subjugar o poder alucinatório de Eldreet. Em seguida, antes que o bruxo pudesse se recompor, ele traça mais doze selos, conjurando mandalas douradas ao redor de Eldreet.
"Eldreet, alegrai-vos! A luz radiante de Gram[1] cairá sobre ti e todos os males encrostados em vosso ser serão expurgados! OSURII GRAM DASTARAERA ERIR SUR! (BENÇÃO RADIANTE DO SUSSURRAR DE GRAM, O GUARDIÃO DA LUZ)"
A magia de Jay surpreende Eldreet, que subestimava o poder do paladino.
"Não é possível! As bençãos de um cruzado de tão baixo nível não deveriam expurgar minhas maldições! Arrghhh!
Mesmo sofrendo uma dor imensa, Eldreet amaldiçoa Jay com uma prece sombria, reagindo às bençãos do paladino, enquanto puxa um pergaminho feito do couro de um rosto humano, cujas feições são de extremo terror.
"Foi um golpe de sorte, cruzado. Não mais perderei meu tempo economizando meus melhores feitiços… Vocês dois terão uma morte terrível e suas almas alimentarão meu soma[2]!"
Jay mal tem tempo de se mover, quando é subjugado por uma forte onda vermelha, que cai sobre Layla também. A massa viscosa vermelha queima a carne e causa uma terrível dor. Encarando o bruxo, Jay procura em sua memoria algum feitiço sagrado que possa subjulgar discretamente essa maldição, mas...
... de súbito, uma forte luz violeta brilha sobre eles, limpando todo o lodo vermelho que os cobria. Jay cai sobre um de seus joelhos e olha para frente, vendo a garota elvanen levitando com uma grande espada se materializando de suas costas.
A luz atinge em cheio Eldreet que, parecendo entender o que aconteceu, grita de fúria:
"Não, não, não!!! Maldita feiticeira!!! Você não deveria se manifestar! Ela é minha! Eu terei minha vida eterna de volta! Queira você ou não!"
A luz violeta toma conta de todo o cômodo, limpando o terreno, e livrando completamente Jay e Layla da poderosa magia de Eldreet.
Porém, aproveitando enquanto Jay e Layla se recompunham, percebendo que não poderia fazer mais nada, Eldreet decepa sua própria mão esquerda, teleportando-se imediatamente. Sua mão morta vira cinzas no exato momento em que ele desaparece, trazendo tudo de volta ao normal, com alguns poucos estragos internos.
Ao se recompor totalmente, Jay olha para a pequena elvanen, que acabava de cair de volta na cama nesse exato momento. Layla se recobra e corre verificar se a elvanen está bem. Felizmente, a garota parecia não ter um arranhão sequer e continuava dormindo profundamente.
Porém, agora havia uma imensa espada flutuando no centro da casa, emanando uma aura violeta muito intensa.
❖
- Gram é conhecido como o Miríade da Luz, patrono dos paladinos, clérigos e outras classes que usam magia sagrada.
- Soma é a energia responsável pela magia em Final Adventure. Todo ser vivo possui soma e, algumas dessas criaturas, conseguem usar o soma para ativar magias e feitiços.
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