Amira se virou para o Sacerdote. Pelo menos?
Talvez ele não entendesse a gravidade do problema que Amira enfrentara, de como era sofrer incansavelmente pela sua própria mente, nunca poder confiar em seus pensamentos e seus sentidos, ser enganada pela sua própria cabeça e não poder se firmar pela mente de mais ninguém. Aquele assunto era um problema sério para a família de Amira, ela era sempre vista como uma inválida e com extrema desconfiança, ninguém confiava nela, os de fora jamais poderiam saber, o segredo era guardado a sete chaves, o que sempre levava um muro na construção de qualquer relacionamento, porque não podia contar por decreto real.
Amira vivia sobre estigmas e prisões pesadas, só que não eram prisões físicas, mas sim mentais, que atrapalhavam seu pensamento e raciocínio lógico.
Depois da morte do pai o problema ficou pior, as alucinações, as vozes, a confusão mental, tudo veio mais forte e mais frequente, o que deixou o restante da família real ainda mais estressada já que tinham acabado de perder um membro querido, e o líder de uma nação.
Amira não tinha cura, ninguém sabia o que era, ninguém sabia tratar, ela não tinha resposta e nem descanso.
Mas, sim, pelo menos a doença ficava só em sua cabeça.
- Sua maneira de pensar é singular, Sacerdote. – Ela falou entredentes, não querendo desrespeitar alguém importante para o reino, mas cheia de raiva por palavras tão insensíveis. – Mas, o senhor está totalmente equivocado. O fato da doença se manter presa em minha mente não a deixa mais leve, senão me atormenta ainda mais.
O Sacerdote arregalou os olhos surpresos, seu tom de pele ficou mais pálido e começou a balançar a cabeça.
-Não, não, princesa. Não foi isso que quis dizer.
O rosto de Amira tinha deixado de lado a suavidade e seus olhos ficaram mais duros. O Sacerdote parou de falar e em vez de começar a se explicar, ele simplesmente fez uma pequena reverência.
-Me perdoe, Amira. – Ele falou. – Minhas palavras foram insensatas, e de maneira nenhuma quis minimizar qualquer dor que a Alteza sinta. Espero que me perdoe pela insensibilidade.
Amira desviou o olhar e engoliu seco. Ela não queria perdoar, mas já não sentia mais raiva, Amira não guardava rancor e o Sacerdote mesmo já tinha se desculpado, não havia motivos para Amira guardar qualquer ressentimento ou raiva. Mas ela odiava perdoar com tanta facilidade.
-Está perdoado. Até os mais sábios cometem atos impensados.
O Sacerdote sorriu.
-Sua bondade deveria ser motivo de canções, Alteza. E também sua maturidade. - Ele desviou o olhar de Amira para algo atrás dela. E então, ele fez uma reverência ainda mais demorada, mais bem feita.
Amira se virou, mas já sabia quem se encontrava atrás dela, o Sacerdote não se mostraria tão aberto dessa forma com a mãe, e só tinha mais uma pessoa que ele poderia se dirigir.
-Sacerdote. – Sahim cumprimentou.
-Vossa Majestade. Fiquei muitíssimo feliz com sua visita hoje.
Sahim sorriu e se aproximou de Amira, ele a abraçou apenas com um dos braços e a puxou para perto.
- Viemos prostrar nossas homenagens como sempre. Espero que o senhor esteja preparado para o começo dos rituais na semana que vem.
O Sacerdote levantou as sobrancelhas.
-Não é o primeiro ritual de coroação que participo, tenho certeza que tudo dará certo.
Sahim sorriu, seu rosto se virou para Amira.
-Nossa mãe tem chamado. Está na hora de partimos.
Amira assentiu, ela se virou para o Sacerdote que deu um passo em direção a ela. Ele se aproximou muito, chegou perto de sua orelha e sussurrou algo em seu ouvido, algo que Sahim não tinha escutado, ele franziu as sobrancelhas, mas depois Amira assentiu e se afastou junto com ele para fora da Abadia.
Antes de chegarem até a mãe, Sahim se virou para Amira.
-O que ele te disse? – Perguntou curioso. Amira sorriu de lado para Sahim.
-Se ele quisesse que você escutasse, acredito que teria falado em voz alta.
Sahim sorriu.
-É assim mesmo, Amira? – Ele perguntou achando graça. Amira deu de ombros sorrindo, depois ela entrelaçou o braço com o do irmão mais velho.
-Ele me disse que qualquer problema, qualquer coisa incomum, eu poderia chama-lo, e disse também, para eu reconsiderar sua proposta, sobre eu me juntar ao Sacerdócio da Abadia. Me tornar totalmente devota.
Sahim bufou.
-Lá vem ele com essa história de novo. – Ele disse, depois se virou para Amira. –Nem pense em aceitar.
Amira semicerrou os olhos.
-Na verdade, agora, a proposta me pareceu bem tentadora. – Amira provocou o irmão.
-Você não pode ir. – Sahim disse. – Vai ficar comigo para sempre.
Amira suspirou com um sorriso.
-Falaremos sobre isso depois. – Quando se aproximaram da mãe.
Ela era a rainha de Astoria, suas vestes estavam nada mais que impecáveis, ela usava azul royal, a cor da família Yasima, uma coroa trançada prata com pedras azuis escuras, completamente linda.
Ela olhou para seus filhos, e aquele olhar triste e pesado, o semblante sombrio, suavizou, se substituiu por um sorriso discreto, o amor pelos seus filhos aliviando um pouco da dor do luto. Ela passou a mão pelo rosto dos dois, analisando cada face.
-Prontos? – Ela sussurrou. Ambos assentiram. Então, tomaram seus postos.
Apesar das horas passadas na Abadia, ainda era manhã, e normalmente naquele horário a Abadia estaria cheia de devotos fazendo suas prestes, contudo, a igreja tinha sido fechada justamente pela presença da família real no local.
O lugar estava vazio, havia apenas soldados, guardas, e outros bispos responsáveis pela a Abadia.
Sahim se colocou no meio das duas mulheres. A rainha Mara a sua direita alguns passos atrás, e Amira, a princesa, esquerda na mesma linha que sua mãe.
Então, nessa posição, os guardas abriram as grandes postar de madeira.
O som atingiu Amira de imediato, gritos, milhares de gritos foram ouvidos por elas, as pessoas gritavam simplesmente animados demais por ver o futuro rei de Astoria.
Eles começaram a se mover, Sahim como o herdeiro na frente, eles andaram pelo corredor que separa o grande número de pessoas, os cidadãos da capital apenas não atingiam a família real porque o grande número de guardas os segurava no meio da grande euforia.
O rosto dos três era impassivo, Amira foi ensinada desde muito cedo como se comportar naquelas situações, ela não podia ter alguma se aproximar e cumprimentar as pessoas, ela tinha que se manter reta, seguir as ordens de decoro.
A multidão continuava descontrolada, aproveitando cada momento de ver aqueles seres que eram uma classe superior, eram a família de reis e rainhas, uma linhagem poderosa e abençoada pelos deuses.
Sim, eles estavam indo a loucura, depois de vários metros andados, os três finalmente chegaram as carruagens reais.
O guardas os cercando para os proteger. Eles entraram na grande locomoção, e voltaram para o Palácio, para casa.
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