Um jovem rapaz de cabelos de cor turquesa vibrante estava em um estado de crescente nervosismo enquanto vasculhava sua mochila abarrotada de pergaminhos e livros. Ele usava a fatídica túnica cinza de estudante do seu curso de Pergaminhos Encantados (o nome é bem longo, então vamos deixar assim) e um brinco de flor colorida na orelha esquerda. Pelo olhar de desolação e desespero transparecidos através de seus olhos de cor rosa vívido, ele deveria ter esquecido alguma coisa muito importante e rezava para encontrá-la no meio daquela bagunça.
Absorto em sua busca, ele só percebeu que alguém se aproximou pois chamaram seu nome.
“WOLTZ!!” alguém chamou e Woltz se virou para a pessoa.
Era ninguém mais, ninguém menos que...
“MINE!” Woltz sorriu largamente, mas parecia que Mine não estava sorrindo desde a primeira vez que o chamou.
“EU QUERO MATAR VOCÊ,” Mine fez uma postura tal qual dos bonecos de King of Fighters e saiu correndo na direção de Woltz, que não conseguiu sair do lugar pois seu sapato patinou no piso liso.
Desafortunado, Woltz aceitou o belo puxão de cabelos que seu queridíssimo amigo deu de modo muito carinhoso, carinhosíssimo! Ele era um doce mesmo...
“AHHHH!!! TENHA MISERICÓRDIA!!” Woltz lamentou-se, mas parecia que suas palavras não atingiam seu queridíssimo amigo de olhos avermelhados e luminosos.
“COMO VOCÊ ME IGNORA E AINDA APARECE ASSIM DE CARA LAVADA?!” e Mine continuou dando seus afagos carinhosos no cabelo de seu amigo, que, já acostumado, começou a recitar todos os textos de budismo que ele ouviu de seu colega de classe durante o caminho para a universidade.
“ME PERDOA! ME PERDOAA!!” e Woltz gritou tal qual Carminha gritou naquela famigerada novela.
Aquilo parecia ter tocado no coração bondoso de Mine, que fitou seu amiguinho que implorava por misericórdia e soltou seus cabelos. Woltz suspirou aliviado e arrumou os fios que ficaram bagunçados e fez a posição máxima de perdão: se ajoelhou e encostou a testa no chão.
“Eu errei, fui moleque,” Woltz disse, ainda com a testa no chão.
“...” Mine cruzou os braços e agachou-se também. “Vou te perdoar dessa vez. Na próxima vez eu vou te deixar careca,” ameaçou, mas Woltz parecia só ter ouvido a primeira frase e deu aquele abraço em seu amigo, que foi pego de surpresa.
“Senti tanta a sua falta!!!!” Woltz abraçou Mine mais ainda e Mine, mesmo ainda um pouco emburrado, o abraçou de volta na mesma intensidade.
Apesar do momento de reencontro a la filme de comédia, a mochila de Woltz se espatifando no chão assustou a dupla, que teve que catar pergaminho por pergaminho e livro do chão. Mine colocou alguns pergaminhos dentro da mochila de Woltz, resmungando sobre o quão descuidado Woltz foi ao esquecer sua varinha e ele apenas concordava (bem, ele não tinha escolha).
O primeiro sinal tocou. Woltz e Mine aceleraram a catação de materiais do chão.
Outro sinal. Mine ajudou Woltz a ajustar sua túnica e tirou o pó dela e arrumou a franja dele.
“Pegou tudo?” Mine perguntou, arrumando a alça da mochila nas costas de Woltz.
“Acho que sim,” Woltz deu uma breve sacolejada na mochila em suas costas e sentiu o mesmo peso de antes.
“Então vai logo senão o inspetor de corredor vai te deixar fora da sala de práticas,” Mine espiou além deles e viu que no corredor alunos andavam apressadamente e já entravam em suas respectivas salas. Porém, Woltz continuou encarando Mine, como se estivesse caçando palavras. “O que foi?”
“Bora almoçar juntos!” Woltz sorriu. “Sei que você tem muitas aulas... mas... se tiver um tempinho...” começou a se complicar.
Mine sorriu e colocou a mão no ombro de Woltz. “Se você não me convidasse, eu ia te arrastar de qualquer forma,” riu.
Infelizmente o terceiro sinal atrapalhou o abraço dos dois, já que Woltz saiu correndo para sua sala enquanto Mine o encorajava para correr mais rápido. Woltz tirou um pergaminho dos bolsos e colou um deles em um pingente de urso que se transformou em um grande urso de pelúcia com diversos pontos de costura. Mine riu quando seu amigo foi carregado pelo urso que correu bem mais rápido que ele.
Uma carona improvável, mas bem útil.
Woltz colocou o agora pingente de ursinho de pelúcia dentro da mochila novamente e o pergaminho se transformou em cinzas. A sala de aula estava barulhenta e fazia um bom tempo que ele não a via tão cheia assim, mas o que chamava a sua atenção não era nem o fato da lotação da sala, mas sim de uma tal conversa de seus colegas de classe na fileira de trás.
“Você ouviu falar sobre o Poço dos Desejos?” Uma garota loira e alegre perguntou à amiga, cujas sobrancelhas franziram com o quão boba a pergunta soou.
“É o quê?” A amiga perguntou, confusa e com tons de ceticismo em sua voz.
“Eles estão dizendo que tem um Poço dos Desejos perto do prédio principal,” ela sussurrou, mas alto o suficiente para Woltz e as pessoas em volta ouvirem. “Eu fiz um desejo e minha varinha foi consertada!”
Um estudante esnobe chegou perto da dupla e, tal qual Draco Malfoy faria, ergueu as sobrancelhas e bufou em desaprovação. Ele repousou a mão na cintura, exibindo um grande broche com detalhes dourados em seu peito.
“Vocês não têm ambição,” ele tirou a poeira invisível da mesa mais próxima. “Eu desejei que um professor não desse provas e a Sra. Blanche sumiu.”
A menina loira suspirou em espanto e franziu o nariz. “Isso é assustador e terrível.”
“O professor Ajal está procurando por ela em todos os lugares e até me deixou como monitor de suas disciplinas,” e ele exibiu o broche em seu peito. “Ela é uma das pessoas desaparecidas desde que o poço apareceu.”
“Ah!” A aluna loira exclamou em curiosidade. “Então realmente tá acontecendo alguma coisa-”
“Silêncio,” uma voz suave e profunda ressoou na sala, interrompendo a conversa.
Woltz levantou a cabeça para ver a origem de tal voz aveludadíssima, e o professor apareceu vestindo uma camisa preta de mangas longas, ela parecia confortabilíssima e muito macia... e era possível ver alguns delineados do físico do professor – pontuação importantíssima, segundo Woltz. O professor colocou seus finos óculos e pegou um pedaço de giz, já fazendo-o deslizar sob o quadro negro.
Sua caligrafia era clara e limpa, muito agradável de ver. Ele desenhou uma forma que parecia com um círculo e adicionou escrituras pequenas ao redor dele. Quando ele terminou de desenhar o que quer que estivesse desenhando, o símbolo de formato estranho brilhou e uma criatura caiu do portal que se abriu.
Todos os alunos exasperaram e alguns começaram a entrar em pânico, mas o professor levantou a sua varinha e a criatura ficou paradinha na frente do quadro. “É apenas um diabrete, não se preocupem,” o professor disse e o diabrete grunhiu. “Meu nome é Addai Lee-Hobb, acredito que nos veremos em muitas aulas pois serei o novo professor da disciplina de Criaturas Demoníacas e Miasma de vocês,” ele disse e o diabrete acompanhou sua rota na frente do quadro.
“Uau...” Woltz disse bem baixinho – não se sabe se era para destinado ao professor ou para o diabrete, mas enfim.
Woltz sacudiu a cabeça. Ele precisava prestar atenção na aula!
“Diabretes são demônios de nível mais baixo no inferno,” Addai começou e levitou o diabrete, colocando-o sob a mesa. “Usamos sua essência para muitas poções e feitiços. Seus chifres são excelentes materiais para varinhas de corpo mais duro, cujos detentores são limitados pois o instrumento é imprevisível-”
Não importa o grau de escolaridade. Sempre vai ter um ou outro que distrai a turma e o professor.
“Prof., o Sr. Já ouviu falar sobre o Poço dos Desejos?” um aluno perguntou, com um tom de "lá vem conversa paralela". Woltz e mais alguns alunos da turma reviraram seus olhos, já preparando o plano B para caso uma conversa paralela quase interminável acontecesse.
Addai virou-se lentamente na direção do aluno e abaixou os óculos um pouco, colocando o giz sob a mesa – bem do lado do diabrete – e cruzou os braços.
“É um conto de fadas. Esqueça isso e foque na aula,” disse bem curto e grosso.
Quando Woltz olhou para o Diabrete – que estava gostando da atenção recebida – ele viu que a sombra de Addai não tinha forma e estremeceu um pouco. Então, como se nada tivesse acontecido, a sombra projetou perfeitamente a silhueta de Addai.
Woltz não estava maluco, bem, ainda não. Talvez ele só precisasse de um frasco de elixir.
“Prof. Addai, eu vi no livro do Sr. Oliver que Diabretes eram usados como escravos por humanos... é verdade?” um outro aluno perguntou.
“Finalmente uma pergunta decente,” Addai disse e Woltz arregalou os olhos brevemente. “Perfeitamente. Inclusive, recentemente atendi a uma urgência sobre um contrato malicioso que um Diabrete fez com alguém. Lembrem-se que seus contratos são valiosos para eles porque com isso podem ganhar troféus do caos com suas ações,” ele explicou enquanto o Diabrete posava com orgulho.
“Parece... desleixado...” Woltz murmurou, mas Addai ouviu perfeitamente.
“Precisamente, Sr. Woltz,” Addai riu baixinho e os alunos arregalaram os olhos. “Mas é só para simplificar as coisas. Troféus do caos são pontos do inferno, assim como os pontos de pureza do Reino dos Céus. Quando se tem um certo número de pontos, a hierarquia pode aumentar ou diminuir,” ele explicou calmamente e os alunos pareciam hipnotizados pelo tom e calma em sua voz que já foi mais tensa que aquilo não fazia nem poucos minutos atrás.
“O-oh...” Woltz disse baixinho.
“Então, preciso que vocês prestem atenção na postura dele,” Addai acenou para o Diabrete, que saltou da mesa e fez mais uma pose orgulhosa. “Esse saco sujo de ossos não está aqui para entretenimento.”
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