Por um momento, minhas pálpebras se recusaram a abrir, mas logo cederam, revelando o ambiente: uma espécie de tenda escura. Tentei me mover, mas meu corpo estava fraco demais. Só conseguia mover a cabeça para a esquerda e para a direita.
À minha esquerda, havia uma bolsa de viagem e, à direita, o fim do colchão em que eu estava deitado. Apesar da pouca iluminação, que dava ao ambiente um tom frio e azul acinzentado, uma satisfação genuína de escapar daquele reino vazio preencheu minhas primeiras impressões deste mundo.
Eu estava com aquela árvore e, de repente, fui jogado nesse novo corpo, com duas escolhas: encerrar minha vida definitivamente ou 'viver até o fim de verdade'. Tudo que eu sempre quis realmente está ao meu alcance. Posso descansar, para sempre.
Todo o tempo que passei indo e voltando daquele lugar escuro será esquecido por todos, e eu alcançarei a verdadeira liberdade: a inexistência.
A felicidade me envolvia só de pensar que nunca mais testemunharia um reino pós-morte ou sentiria a sensação da morte desgastando minha sanidade repetidamente. Era reconfortante saber disso. Comecei a notar meu corpo e sentir suas partes, desde membros infantis como o braço até coisas mais subjetivas como a pele tocando o tecido, o peso dos meus membros, a temperatura fria do lugar... E também o som da minha respiração.
A sensação do ar penetrando meus pulmões.
Tenho uma ideia de como finalizar esse ciclo...
Cessar a respiração.
Decidido e com um objetivo claro em mente, suspirei uma última vez antes de prender a respiração.
Qualquer pensamento seria irrelevante assim que isso estivesse terminado, pensei.
1. 2. 3. 4. 5. 6.
No 7º segundo, uma sensação de aperto no meu peito começou.
A sensação de aperto no peito se intensificou nos próximos segundos, como se meu corpo estivesse lutando contra a falta de ar, clamando pelo fim daquela loucura.
Cada vez mais, a necessidade desesperada de respirar se tornava palpável enquanto minha visão turvava e meus sentidos vacilavam. Era como se duas partes de mim lutassem entre si: minha alma tentava sobrepujar a consciência corporal que lutava para se manter viva, enviando todo e qualquer estímulo para parar aquele absurdo. Meu sistema nervoso mexia-se severamente, tentando impedir a todo custo, seja me derrubando em inconsciência ou me fazendo sentir uma dor excruciante e medo até parar.
Meu instinto de sobrevivência dizia que algo estava muito errado, que eu devia parar. Embora eu o tenha negado, ele cresceu ao ponto de me fazer questionar aquela loucura, tornando-se agonizante e desesperador. Então, liberei a trava e inspirei o ar com uma voracidade insaciável — como se estivesse em um deserto escaldante diante de um copo de água fria, drenando-o desesperadamente para evitar a morte pela sede insuportável.
"Cof! Cof..." Tossi desenfreadamente enquanto o ar entrava no meu corpo e aliviava minha carne, ao mesmo tempo que minha mente se preenchia de uma sensação agridoce.
Meu fracasso era flagrante; eu poderia ter terminado com tudo! Nunca mais teria que enfrentar nada semelhante; tudo isso poderia simplesmente desaparecer, e eu alcançaria o descanso eterno. Uma confusão avassaladora invadiu minha mente, enquanto meu corpo teimava em lutar pela sobrevivência, impedindo-me de continuar. Minha vontade deveria ter sido mais forte. A frustração me engoliu, misturada com um profundo sentimento de culpa. Enquanto isso, o ar retornava ao meu sangue, restaurando a normalidade das funções corporais.
Em conflito mental, raciocinei.
Era isso que eu mais queria...
Então por quê? Então por quê?
Por que eu não consegui? As dúvidas me atormentavam, lançando-me em um turbilhão de raiva direcionada a mim mesmo por fracassar. A sensação de derrota era esmagadora, uma sombra pesada pairando sobre minha consciência. Eu ansiava desesperadamente pela paz que a não existência prometia, mas agora, diante do meu próprio fracasso, tudo o que me restava era a amarga realidade da sobrevivência contínua. Como poderia enfrentar o próximo momento sabendo que falhei até mesmo em alcançar o fim que desejava tão ardentemente?
Minhas dúvidas foram interrompidas quando o tecido que separava o interior do local onde eu estava do exterior começou a se abrir lentamente, revelando a silhueta de uma mulher jovem, pálida como prata. Seu rosto alegre, sorrindo para mim, estava quase invisível, obscurecido pela luz intensa que invadiu o ambiente rapidamente, ofuscando minha visão sensível. Antes que eu pudesse enxergar claramente, ela estendeu os braços e me pegou.
Como um anjo, ela me resgatou daquela situação deplorável em que eu me encontrava, fazendo-me esquecer, mesmo que momentaneamente, da solidão que afundava meu coração. Seus braços envolviam-me com uma ternura reconfortante, no momento em que eu tanto precisava, mesmo sendo ela uma desconhecida, naquele momento eu precisava daquilo.
Meu corpo tomou a melhor sobre minha razão, relaxou no vento forte e frio que soprava nos meus ouvidos do lado de fora.
Enquanto ela me carregava em seus braços, eu me escondia, mantendo os olhos fechados para impedir que ela visse minhas lágrimas. Evitei olhar para seu rosto e apenas escutei sua cantoria leve e amável, absorvendo o som reconfortante de sua voz e sentindo o ritmo suave de seus passos por alguns segundos.
Decidi, finalmente, me recompor e olhar.
Para ser surpreendido pela visão magnífica.
Os céus do planeta eram um espetáculo: uma miríade de gases azuis se espalhava pelo além da atmosfera deste mundo ao qual fui levado, enquanto a poeira cósmica tentava obscurecer um gigante planeta gasoso com três luas orbitando-o, tão próximo que parecia ao alcance da mão, evocando um ar de poder e grandeza. No entanto, o que mais capturou minha atenção foram os olhos da mulher, fixos nos meus.
"Finalmente pude te olhar nos olhos, filho", disse a mulher com seus lindos olhos azul-celestes, cuja íris brilhava exibindo estrelas brancas hipnotizantes em meio a uma textura cósmica azulada. Contudo, suas palavras ressoaram incompreensíveis para mim, não entendi sua língua.
Desviando meus olhos novamente para o céu, reparei melhor, desde os astros às camadas de gás densas, numa noite que era bastante iluminada. Porém, esse céu invejável carecia de algo...
Não havia estrelas.
Desde os primórdios que minha memória de reencarnações consegue lembrar, elas sempre estavam lá, mesmo nas noites mais escuras. Sua ausência agora me deixa desconfortável com o significado por trás disso, mesmo assim, esta visão é memorável.
"É belo, não é?", ela disse com grande contentamento, ressoando, novamente, intangível para meu raciocínio.
Ela estava sentada, comigo sobre seu colo. Sou o bebê dela? Se sim, significa que esta vida é realmente diferente nesse ponto.
Como cria de um ser senciente? Isso é novo.
Desviando meu olhar do dela, observei as redondezas através do véu tênue da noite. Percebi várias cadeias montanhosas majestosas com cumes cobertos de neve, divididas por um vale magnífico que se estendia até uma planície distante. Ao nordeste, no sopé das montanhas, havia uma pequena vila, situada ao lado de um rio congelado que serpenteava pelo centro do vale. Aos pés de uma colossal estrutura negra em espiral, semelhante a uma torre, cujo aspecto metálico refletia a luz da noite. Contudo, não era apenas essa luz que brilhava; luzes turquesas contornavam a superfície da estrutura, ascendendo desde a base até o topo, criando uma espiral de pontos luminosos ao longo de seu caminho.
Além das montanhas, por trás da estrutura, um deserto que fugia para fora da minha vista pela sua extensão repousava imperturbável na noite silenciosa em que só o vento podia ser ouvido, sentido, junto ao aroma de coníferas que adentrava meu olfato.
O som de passos, atrás de nós, chamou minha atenção. Olhei para ver tangenciar minha vista um homem loiro de olhos dourados carregando madeira e vestindo um agasalho pesado.
"Oh, você chegou!", falou a mulher se animando, na língua que desconheço, direcionando-se ao homem que chegara.
O homem jovem adulto exibiu um semblante cansado enquanto largava a madeira, aproximando-se com cautela. Seus passos eram vigilantes, como se estivesse me avaliando. Ao chegar perto da beira do penhasco, ele se ajoelhou e, abraçando a mulher por trás, proferiu com ternura: "Ele tem os seus olhos, querida". Sua voz carregava um misto de admiração e emoção, enquanto seus olhos dourados se perdiam no horizonte.
Após a demonstração afetuosa, o homem se dirigiu até a pilha de madeira com passos curtos e começou a empilhá-la. Começou pelos pedaços maiores e, em seguida, colocou os menores convergindo para o centro do maior e mais grosso, organizando-os numa forma que lembrava um tronco de cone.
Repentinamente, assim que ele terminou de organizar, uma labareda de chamas emergiu de suas mãos iluminando o ambiente e dançando ao vento forte da montanha. O fogo foi rapidamente se espalhando pelos galhos robustos de uma forma claramente antinatural, alojando-se na madeira e fazendo-a ser consumida aos poucos. Depois, ele afastou o braço em chamas que não sofria queimaduras enquanto mantinha o outro estendido para a fogueira, parecendo querer manter o fogo.
Enquanto observava a habilidade impressionante do homem em controlar o fogo, percebi estar diante de algo extraordinário. Aquela cena, iluminada pelas chamas dançantes, criava uma atmosfera mágica, quase surreal. É com certeza uma espécie de poder? Magia? Seja o que for, sinto que quero saber. Irônico, algo despertar meu interesse, é algo novo em muito tempo, afinal.
Enquanto eu tentava processar o que estava acontecendo diante dos meus olhos, a mulher permanecia me segurando, emanando uma aura de serenidade e confiança. Seus olhos azul-celestes brilhavam com uma intensidade única, como se contivessem segredos que eu mal podia compreender. Naquele momento, ela parecia estar pensando em algo muito além do que seus olhos refletiam.
Talvez, só talvez, viver mais um pouco para saber mais sobre esse mundo não seja tão ruim. Mas ainda quero que seja breve, esse mundo novo é de fato bastante peculiar.
Enquanto as chamas do fogo crepitavam, ela rompeu o silêncio com um sorriso no rosto: "Você não vai querer segurar seu filho, Aidan?"
"Sempre apressada", respondeu ele alegre, aproximando-se.
Ela se levantou e me entregou nos braços dele com cuidado excessivo. Ele me segurou bem na frente do seu rosto com os braços estendidos, com algum tipo de timidez.
Ele ficou mais tímido e sem graça quando encarei ele nos olhos, tirando um riso sem som e desajeitado dele, que também retirou minha sólida expressão, vacilei e soltei um riso torto pelo momento inusitado sem som, apenas expressão. De fato, me diverti com um senciente que mal sabe o que realmente é sua criança.
"pftt, haha"
O som da risada suave da mulher chamou meu foco, fazendo-me virar a cabeça para encontrá-la. Seus cabelos longos, quase brancos, cor de lavanda, vibravam ao vento enquanto ela tentava conter o riso com uma mão delicada.
Com um brilho travesso nos olhos, ela quebrou o silêncio: "Esperava mais dessa introdução entre vocês dois."
Ele franziu levemente a testa e rebateu: "Me perdoe se não fui digno de suas expectativas, senhorita Ari", disse, assumindo um tom alegre e debochado.
Logo ela levantou os braços na direção do homem, praticamente me solicitando nos seus braços de novo. Assim que fui devolvido, ela se aproximou levemente do fogo, fazendo-me sentir o calor confortável do fogo penetrando parte da minha pele que estava exposta, contrastando com o vento gelado que assolava todo o local.
"Vamos dormir?", ela disse, olhando para o homem que se sentou muito perto da fogueira.
"Acabei de ascender o fogo, depois eu vou. Vá na frente", respondeu o homem, mexendo no seu cabelo loiro médio sem se expressar fortemente.
Balançando a cabeça suavemente, ela caminhou, segurando-me com uma das mãos. Parou e virou-se, acenando com o braço livre na direção dele. A alguns metros de distância da fogueira, avistava-se uma barraca de 'camping', o lugar onde despertei neste mundo.
Chegando nela, agachou-se e, com sua mão livre, abriu a porta de tecido, direcionando um... Cadeado? Botão? Seja o que for, isso fez a tenda abrir quando levado para baixo.
Adentrando, ela fechou por dentro aquele item e suspirou, deitando no tecido de dormir e me posicionando sobre sua barriga.
Ela olhou nos meus olhos, assumindo uma expressão cansada e melancólica, e começou a alisar minha bochecha por um momento.
Então, ela falou:
"Você sabe que mamãe te ama, né?"
"Espero que você nunca cresça e continue sendo adorável assim para mim, para sempre, sempre mesmo."
"Mas sei que isso não vai acontecer. O tempo passa, mesmo contra nossa vontade, mas nosso amor vai sobreviver a isso."
"Espero que o passado seja apenas passado. Meu caminho até ter você, concebê-lo, aqui, foi difícil. Passei por muitas provações. Então quero que cada momento nosso seja inesquecível... Toda a luta até aqui me trouxe a este momento. A vida é curta. Posso durar mais alguns milênios, mas seu pai não. Mesmo assim, somos uma família. Cedo ou tarde, sobrará só você. Então vamos aproveitar cada momento que nos resta daqui em diante, ok?"
"Bem-vindo à vida, Kiel."
Deixando para trás sua tristeza palpável enquanto discursava, agora rindo e olhando com sinceridade nos meus olhos, ela acariciou minhas bochechas novamente e afagou meu cabelo. Apesar de sua linguagem não ser familiar para mim, eu escutei com atenção o que parecia um desabafo. Senti o que ela sentiu, como se uma conexão se projetasse entre nós. Entendi, não as palavras, mas suas emoções.
"Vamos? Vamos comer, filho?" Sons que ressoavam indecifráveis nos meus ouvidos não me avisaram de suas intenções. Ela me trouxe para junto dela com um sorriso simpático. Afagando meu cabelo com afável compreensão de seu dever materno, ela arriou sua camisola.
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