“Um, dois… três!” gritei, jogando uma mistura de borato de sódio e cloreto de cobre dos fios que joguei no sal e dos produtos químicos que fiz reagir.
Com uma piscadela e um movimento bacana, olhei para Evelyn antes de lançar a pequena bolsa com os materiais o mais alto que consegui. Ao ordenar a Energia primordial, forcei uma reação química que resultou numa explosão de cores brilhantes ao meu redor. Faíscas verdes e azuis dançavam pelo céu, pipocando em um caos perigoso de fogo e pequenas explosões que rapidamente fugiram do meu controle.
Evelyn assistia encantada o espetáculo flamejante, com um sorriso tão largo que mostrava sua genuína graça infantil. A mistura fervia e crepitava, liberando uma nuvem de fumaça que se espalhou rapidamente. Senti imediatamente o resultado das minhas transgressões e do pequeno espetáculo perigoso. Isso é inacreditável, estava tudo calculado até uma brisa soprar no exato momento, quebrando a expectativa e demonstrando a crua realidade de uma criança brincando com fogo.
“Merda,” sussurrei com desânimo, “isso é ruim.” O fogo desviou e veio na minha direção. Só pude sorrir em desdém enquanto via o ânimo da minha irmã sumir do rosto dela. Usei desesperadamente os braços para me defender. As brasas e faíscas começaram a cair sobre mim, castigando minha pele com queimaduras dolorosas que ardiam ferrenhamente, causando uma dor suportável, embora inconveniente.
Os néfos se aproximaram para observar o espetáculo químico. Seus olhos brilhavam de fascínio e alguns até soltaram guinchos de alegria. Os aldeões, por outro lado, especialmente os mais velhos, perceberam imediatamente o perigo.
“Kieeeel! Olha o que você FEZ!” Rugiu Nelco, vendo impotente as explosões queimarem a grama e causarem desespero entre os néfos presentes, que correram para proteger as crianças. “Você destruiu a grama, maninho, queimou os tecidos da festa, se machucou e preocupou a todos! Reprovado!” falou em voz alta, puxando seu chapéu redondo para cima.
Ofegante e sentindo o ardor das queimaduras, fui até Evelyn e segurei suas mãos pequenas e trêmulas. Seus olhos estavam cheios de preocupação e medo devido às explosões. “Eu estou bem, Evelyn,” murmurei, tentando soar confiante apesar da dor. “Foi um erro, mas estou bem.”
Os néfos ao redor ainda estavam inquietos, suas vozes em tons agudos discutindo o que havia acontecido. Alguns tentavam apagar os pequenos focos de incêndio, enquanto outros ajudavam a acalmar as crianças assustadas. Nelco, o "líder" entre os néfos, aproximou-se de mim com um olhar severo.
“Kiel! Olha só o estado do gramado! A festa de ano novo é hoje à noite e você fez questão de torrar toda a nossa arrumação com essa sua irresponsabilidade. Vou chamar a sua mãe para te dar mais educação. Você passou de todos os limites! Vários dias roubando e usando coisas perigosas por aí, e no que deu? Óbvio, no desastre que você está vendo.”
Baixei a cabeça, sentindo medo de encarar uma reclamação da minha mãe. “Por favor, não diga para ela. Eu prometo nunca mais pegar os produtos químicos da vila para experimentos.”
Nelco suspirou, seu rosto suavizando um pouco. “Me poupe das suas justificativas!” respondeu rude. “Por favor, tio Nelco, perdoe meu irmão. Ele errou, mas não vai acontecer de novo.” Disse Evelyn, demonstrando sua fofura de criança compreensiva.
“Oh! Evelyn, vou fazer isso, não vou dizer, mas se acontecer de novo…” concluiu o senhor. “Saiam daqui por enquanto,” disse muito mais calmo agora.
Isso, você me salvou, Evelyn! E não é a primeira vez. Nos saímos e fomos até o pagode, subindo a escadaria e sentando no meio do caminho.
“O que você estava tentando fazer, Kiel?”
“Queria criar um show de luzes para você,” respondi, rindo inconsequentemente. “Algo bonito para te fazer sorrir e dizer que sou muito legal.”
Ela apertou minha mão e sorriu sarcasticamente. “Foi bonito, mas você não precisa se machucar para me fazer feliz.”
Aquelas palavras simples, mas profundas, ecoaram em minha mente. Evelyn tinha razão. Olhei novamente escadaria abaixo para ver os néfos preparando uma fogueira e mesas enquanto Poente, o sol, descia no horizonte, lançando uma miríade de gases extraplanetários e refletindo em um espetacular crepúsculo verde-azulado.
Sim, sinto-me satisfeito agora. Mesmo que minha alma não esteja curada das mazelas do tempo em que fiquei sujeito aos efeitos nocivos do ciclo, estou feliz por estar vivo: as coisas realmente são diferentes e o rumo das coisas é muito prazeroso.
"Eve, o que você acha disso? Desse mundo?" questionei, olhando satisfeito o horizonte que denunciava o começo da noite.
Ela não respondeu… "Eve!" chamei, procurando ao redor após notar seu desaparecimento repentino. "Eu tô aqui! Vi Nene brincando e quis brincar também," disse ela com a voz distante. Olhei para trás e vi ambas ao lado de um Jenga, sentadas na entrada do santuário néfo. Ela acenou com a mão direita, e Nene fez o mesmo.
Retiro tudo que disse… minha irmã me abandonou e essa vida é horrível, sinceramente. Que seja!
Desci as escadas com cuidado, sentindo o calor residual das queimaduras em minha pele. Cada passo me lembrava da pequena catástrofe que havia causado, percebendo também a minha cicatrização assustadora: as queimaduras haviam quase desaparecido em meia hora.
Ao me aproximar da área do evento, a agitação dos preparativos da festa de ano novo começou a ser audível, trazendo uma mistura de aromas, sons e visões que eram, ao mesmo tempo, familiares e únicas ao nosso mundo. Todos os anos, esse evento acontece, afinal.
As barracas de madeira rústica, decoradas com tecidos coloridos e flores locais, estavam espalhadas ao redor da praça principal. Os néfos trabalhavam juntos, colocando os toques finais em suas respectivas tarefas. Pequenas lanternas feitas de vidro soprado pendiam de cordas, cada uma emitindo uma luz suave e cintilante que começava a se destacar contra o céu que escurecia.
Os aromas das comidas tradicionais flutuavam no ar, me fazendo esquecer momentaneamente a dor das queimaduras. Em uma das barracas, um néfo mais velho, com mãos habilidosas, moldava massa de pão em formas intricadas antes de colocá-las no forno a lenha. O cheiro de pão fresco misturado com especiarias e ervas era até chamativo, mas minha preferência por carne é unânime. Outra barraca apresentava um caldeirão grande, de onde vinha o cheiro apimentado e reconfortante de uma sopa rica em legumes e pedaços de carne — infelizmente, não gosto de sopa. Mais adiante, uma mesa estava repleta de frutas brilhantes e frescas, colhidas das árvores frutíferas que cresciam ao redor da vila.
As decorações eram um espetáculo à parte. Remos pintados à mão, símbolo da ligação deles com o rio Alvim, que sustenta a fama de separar Loura e Florem ao mesmo tempo que é essencial para a manutenção da vida dessas pessoas, estavam dispostos ornamentalmente ao longo do caminho principal. Estatuetas de criaturas locais, várias de puppins, esculpidas em madeira e pedra, adornavam os cantos da praça, cada uma contando uma história. Bandeirolas feitas de tecidos trançados com cores vibrantes balançavam suavemente com a brisa, dando uma sensação de movimento contínuo, alavancando a bandeira de Florem — três flores amarelas no canto superior esquerdo postas em um azul-real.
As pessoas, vestidas em suas melhores roupas devido à ocasião, riam e conversavam enquanto trabalhavam. Crianças corriam ao redor, brincando com pequenos brinquedos feitos à mão, enquanto os adultos se concentravam em garantir que tudo estivesse perfeito para a celebração. Havia um sentimento palpável de comunidade e união, algo que sempre me tocava profundamente. Como eles conseguem se unir tão fortemente em prol de uma causa que não seja relativa ao indivíduo? Eu sou o antiquado aqui? Que vê isso como algo irreverente e irreal à nossa natureza? Está aí, um dos pontos que eu realmente não vou mudar — Eu aceito minha família como pessoas agradáveis agora, mas não me vejo colocando eles acima de mim.
Mas a família é uma comunidade? São realmente laços de sangue a questão? Ou o pertencimento? Que complicado… Digo, é um misto dos dois, tenho 50% do sangue dos meus pais, de 37% a 61%, entre esses extremos o da minha irmã. Talvez ela seja o mais semelhante a mim nesse mundo ou menos que meus pais, palomemos. Mas amar alguém não se restringe apenas a isso… Eu não consigo dizer que preferiria um dos 3.
Kiel, bote na sua mente: se for para se sacrificar por alguém, siga a norma da natureza, procure manter seus genes, essa é a verdade, quer passar adiante seu dever natural, faça isso!
No entanto… se eu tive diferentes genes nas diferentes vidas, mesmo que fosse em animais… Então não faz sentido, isso vai além do físico e chega no metafísico! Então…
Já sei, vou fazer o que for de minha vontade.
Questão resolvida.
Me aproximei de uma das mesas de preparação, onde uma mulher mais velha estava arrumando pratos de sobremesas finamente decoradas. Ela me olhou e sorriu gentilmente, oferecendo-me um pedaço de bolo coberto com uma camada brilhante de glacê.
"Você fez um grande alvoroço hoje, Kiel," disse ela, seus olhos cheios de compreensão. "Aproveite a festa, pode aproveitar esse bolinho."
Agradeci e peguei o pedaço de bolo, sentindo um calor reconfortante se espalhar dentro de mim. Enquanto mordia o bolo doce e macio, olhei ao redor e vi Evelyn brincando feliz com Nene, seu sorriso espontâneo no rosto.
Devo ter demorado muito na minha reflexão…
Os preparativos estavam quase completos, e a expectativa para a celebração crescia. O som de música começava a encher o ar, instrumentos tradicionais tocados entraram nos holofotes.
Sentei-me em uma mesa, saboreando meu pedaço de bolo e observando o desenrolar da festa. A cada momento, mais pessoas se juntavam à celebração, e o ar se enchia de risos e conversas animadas.
Enquanto estava perdido em meus pensamentos, senti uma presença ao meu lado. Virei-me num susto e vi Aidam sentando-se de forma inesperada. “Precisamos ter uma conversa séria, mocinho,” disse ele com um rosto seríssimo, me assustando com sua súbita aparição.
Meu coração disparou, temendo uma bronca iminente. Mas antes que eu pudesse responder, ele continuou, seu olhar curioso contrastando com o tom sério. “Sério, desde quando você aprendeu a usar magia? Me disseram que você fez fogo de várias cores! Como aprendeu isso?”
Antes que eu pudesse formular uma resposta, minha mãe, Ari, surgiu de repente, interrompendo a conversa. “Kiel!” ela exclamou, sua voz carregada de preocupação e raiva saliente, visivelmente demostrando com suas expressões faciais. “O que você estava pensando? Brincando com produtos químicos perigosos! Causando um incêndio...E você, Aidam, deveria ter mais responsabilidade e falar que ele errou e corrigí-lo! Não deveria permitir que ele fizesse algo tão arriscado e nem ser conivente com esse tipo de atitude!”
Ela puxou o cabelo de Aidam, que fez uma careta de dor. “Você foi conivente com o problema que Kiel causou,” continuou minha mãe, com um tom severo.
Virando-se de costas, ainda com raiva, ela disse “Agora, vou chamar Evelyn para jantarmos juntos.” saindo andando, com uma roupa lustrosa que ela só usa nesse tipo de ocasião que deixava-a elegante até quando estressada. “Essa conversa ainda não terminou” concluiu.
Enquanto minha mãe se afastava para chamar Evelyn, Aidam esfregava a cabeça onde tinha sido puxado, olhando para mim com um misto de alívio e curiosidade. “Então, como você conseguiu fazer aquela magia?” perguntou ele, ainda interessado na minha resposta.
Meu pai passa muito pano para devaneios adrenalinicos do seu filho, se ele fosse pai solo de outra família teria criado muitos deliquentes...
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