Jake observava Erin enquanto ela escolhia os vegetais, suas mãos ágeis vasculhando entre os sacos de alface. Uma expressão de concentração cruzava seu rosto enquanto avaliava cada folha meticulosamente. Seus lábios se moviam, enquanto ela decidia entre os pacotes.
— Ela poderia ter vindo sem mim — murmurou. Tudo que ele fazia era empurrar o carrinho enquanto ela escolhia os legumes, frutas e verduras da lista.
Após jogar a alface da mão direita no carrinho, Erin seguiu para o corredor dos frios. Uma senhora passou por eles e a cumprimentou com um sorriso, que Erin retribuiu prontamente. Jake arqueou as sobrancelhas e se esgueirou por trás dela.
— Conhecida sua? — sussurrou no ouvido dela.
Erin encolheu os ombros, o rosto ruborizando. Ele apertou os lábios, reprimindo o sorriso que lutava para pintar sua face naquele momento. Não podia negar: as reações dela a sua proximidade lhe trazia uma boa dose de satisfação.
— Algumas pessoas só são muito simpáticas e quando encontramos com elas, devemos retribuir. Pode parecer difícil para você, já que não é assim.
— Assim você fere meus sentimentos, cara pálida.
Erin suspirou, balançando a cabeça. Estava prestes a respondê-lo e, de repente, seus olhos brilharam ao avistar uma prateleira de barras de cereais.
— Posso levar esses? — ela perguntou, seus olhos se iluminando enquanto exibia os pacotes de barrinhas de cereal, um com sabor Petit Gateau e outro de tortinhas de limão. — Quando voltarmos para casa te dou o dinheiro.
Jake piscou, surpreso com a mudança repentina no humor dela.
— Claro — ele respondeu, jogando mais alguns pacotes no carrinho.
— Isso é exagero! — Ela tirou os pacotes e colocou de volta na prateleira, mas ele voltou a colocar no carrinho. — Jake! — Erin lançou-lhe um olhar de censura, pondo as mãos na cintura.
— E se os outros quiserem também? Vamos levar tudo.
Ela soltou um suspiro resignado, porém não se opôs.
Os dois continuaram a fazer compras, conversando enquanto procuravam pelos últimos itens da lista. Quando perceberam que não conseguiriam encontrar tudo no mercado, Jake sugeriu que tentassem uma pequena mercearia nas proximidades. Ao saírem, foram recebidos pelo calor do sol do meio-dia. Um dos relógios digitais daquele lado da rua mostrava que a temperatura já estava beirando os 38 °C.
Erin inclinou a cabeça para trás, fechando os olhos e sorrindo para o sol banhando sua pele. Jake contemplou-a em silêncio por um momento.
— Que dia maravilhoso! — ela murmurou, virando-se para ele com um sorriso radiante. — Obrigada, Jake.
Ele franziu as sobrancelhas, os lábios levemente enrugados.
— Pelo quê?
— Por me obrigar a vir. — Erin abriu uma das sacolas com as barras de cereal, que teimosamente insistiu em carregar, e abriu um pacote, oferecendo uma para ele, que recusou balançando a cabeça.
— Não está mais com raiva de mim? — Ele perguntou, abaixando a aba do chapéu e cobrindo o rosto dela numa vã tentativa de acalmar o coração agitado.
— Não sei. — Ela deu de ombros. — Só decidi que se vamos passar quarenta e cinco dias juntos, é melhor sermos amigáveis um com o outro — confessou com um sorriso tímido. — Principalmente se vamos fingir estar apaixonados e nisso você estava certo, preciso melhorar meu comportamento. Viu como seus amigos se comportaram? — suas bochechas ganharam um tom vermelho carmesim.
Jake concordou com um aceno. Nenhum deles tinha receio de demonstrar seu afeto e paixão calorosa com gestos e palavras.
— Só nós não agimos como um casal. — Ela continuou. — A gente não faz nem o simples, como segurar as mãos. Você fez bem hoje cedo. Temos que fazer isso na frente deles — ponderou, mordendo um pedaço da barra de chocolate. — Como diria Iúna, fazer birra e virar a cara para você não vai mudar nada. No fim, estamos juntos nessa. Você me ajudou e eu devo retribuir como combinamos.
Ele a encarou com os olhos arregalados, a surpresa pincelada em cada linha de seu rosto.
— Você aceitou isso melhor e mais rápido do que eu esperava, cara pálida.
Erin revirou os olhos.
— Se não pode contra ele, junte-se a ele. É o que dizem, né? Além disso, essa é minha primeira viagem desde que entrei na faculdade e minhas amigas estão felizes, portanto, estou feliz também!
— Lembro que você e seu irmão costumavam viajar com seus pais em feriados e nas férias escolares. Não vão mais?
Jake a sondou, a olhando para ela de lado, enquanto caminhavam. O que o pai dele havia dito sobre o Sr. Lee ter se casado outra vez continuava martelando a mente dele com perguntas e dúvidas e aquela havia sido a abertura perfeita para descobrir o que havia mudado na vida dela — e que James não havia contado a ele —, considerando que não eram mais amigos e que não podia perguntar descaradamente.
Mas suas esperanças de obter uma resposta se desfizeram quando o semblante de Erin se contraiu e sua boca se moveu inquieta. Uma sombra de desconforto pairou sobre ela e quando seus olhos avistaram a mercearia do outro lado da rua, ela forçou um sorriso e disse:
— Aquele é o lugar que você falou? Parece estar vazio, vamos logo!
Jake concordou com um aceno, engolindo um suspiro enquanto a seguia até o estabelecimento. Talvez, no fim das contas, a maneira mais rápida de obter as respostas que procurava fosse por meio de James.
Mas, ainda que negasse para si, enquanto Erin estivesse ao seu lado, ele desejava poder ouvi-las diretamente dela.
★
Uma mensagem de um número desconhecido chegou no celular de Jake assim que entraram na fila do caixa. Pedia para levarem uma garrafa de tequila prata e licor de laranja para preparar Margaritas. No fim do texto descobriu se tratar de Siena, e que seu pedido se devia ao fato de ela não beber cerveja nem vodca.
Ele suspirou profundamente, enquanto escrevia uma resposta.
— Você pode ficar na fila? Preciso pegar umas coisas que Siena pediu.
Quando Erin assentiu, ele lhe passou o carrinho e marchou até as prateleiras, onde garrafas coloridas cintilavam sob as luzes do mercado. Ele segurou a superfície fria e lisa de uma das garrafas contra a palma com cuidado. O licor ao lado parecia a escolha óbvia, por isso pegou ambos. Os líquidos balançaram nos recipientes enquanto ele corria de volta à fila com o aroma forte e familiar da tequila invadindo suas narinas, misturado ao cheiro doce e cítrico do licor.
Quando alcançou a fila, o som abafado dos murmúrios da multidão foi substituído pelo silêncio tenso que emanava de Erin, que continuava no mesmo lugar em que ele a havia deixado. Ela estava de braços cruzados, os lábios comprimidos em uma linha fina, o olhar fixo em um ponto distante.
— O que foi? — sussurrou ele, inclinando-se para perto dela. — Aconteceu algo?
Erin encolheu-se ligeiramente, evitando o olhar dele.
— Nada — respondeu, a voz tensa.
Jake passou os dedos pelos cabelos. O tempo na fila se arrastou. Ele observava as pessoas ao redor, tentando entender o que havia causado a mudança repentina no humor dela outra vez. Mas só quando saíram e se dirigiram ao ponto de táxi, ela voltou a olhar para ele.
— Você… — começou ela, porém logo seus lábios se curvaram num sorriso amargo. — Esquece.
— O que foi? Pode me perguntar qualquer coisa — garantiu com um aceno, a preocupação evidente em sua voz.
— Isso não me diz respeito — murmurou ela, desviando o olhar.
Uma inquietação febril consumiu Jake, suas mãos tremeram e sua mente girou num vórtice de pensamentos sombrios.
— Porra, Erin. Fala logo o que quer!
Ela colocou uma mecha do cabelo ondulado atrás da orelha, seus olhos acobreados encontrando os dele com uma intensidade gelada.
— Quem você beijou ou deixou de beijar, ou se ela te trocou pelo Chase, ou se vocês curtem trocar namoradas, nada disso me diz respeito, Jake.
As palavras dela caíram sobre ele num único golpe, drenando a cor de seu rosto.
— Quê? — Um vinco profundo marcou o espaço entre as sobrancelhas de Jake. — Eu nunca namorei, e se tá falando da Siena…
— Você não me deve satisfações. Isso tudo é uma farsa e só precisamos manter a farsa para os seus amigos. — O olhar de Erin era tão frio que por um momento ele esqueceu que estavam no verão.
— O que você…
— Olha, Jake — o interrompeu —, agora entendo por que me pediu para fazer isso. Fica mais fácil assim, a gente só tem que fingir, então, se fingimos, tudo fica bem, não é? Quero dizer, seus amigos nem precisam saber de nada, porque quem se importa, né? Eu não me importo, e você também não, porque, no fim das contas, é tudo uma questão de manter as aparências. Então, se mantivermos as aparências, tudo fica bem, tudo se resolve e ninguém sai machucado, porque, bom, não tem nem por que alguém sair machucado…
Jake sentiu as têmporas latejarem enquanto as palavras dela se misturavam num zumbido, num fluxo rápido, desordenado e sem sentido. Ele tentou acompanhar, mas seus pensamentos se embaralharam, as emoções conflitantes dentro dele se agitaram numa maré prestes a transbordar, suas mãos voltando a tremer.
— Erin…
— … e, sabe, é melhor assim, na verdade, porque se fosse de outro jeito seria muito mais complicado. Mas, claro, não tem por que ser complicado, né? Só vamos seguir o plano, e vai ser fácil, porque sou boa em fingir…
— Vou te beijar se não parar de falar! — Ele explodiu.
Erin parou bruscamente, os olhos arregalados, piscando como se estivesse tentando processar o que ele dissera. Então, suas bochechas coraram de repente, e sua mão voou até à boca, enquanto recuava um passo.
— Q-Quê? Tá doido?
— Tô e a culpa é sua. Continua falando besteira, se duvida do que tô falando — Jake ergueu os cantos da boca num sorriso que não alcançou seus olhos, mas exibia os dentes numa expressão que parecia mais uma careta. — Só que agora fale com clareza e devagar. Sei que acha que Siena e eu temos um lance secreto e traímos o Chase.
Os lábios dela se comprimiram numa linha fina, os músculos da mandíbula se destacando sob a pele.
— Eu não disse isso, disse?
— Mas pensou. Sei que pensou. Você pode até acreditar que sabe tudo sobre mim, mas você não sabe de nada, Erin. — A voz dele tremeu ligeiramente, embora o sorriso erguendo o canto de sua boca gotejasse desprezo.
— E nem preciso saber — ela respondeu entre dentes cerrados, dando um passo para trás. — Acho que já temos tudo que a Uana pediu. — Ao ver um táxi se aproximando, ergueu a mão e deu as costas a ele.
Sem esperar para ver se ele a acompanhava, Erin entrou no carro assim que o motorista parou. Jake quase riu, mas a careta em seu rosto se intensificou.
— Que porra é essa? Ela acha que tem direito de ficar com raiva de mim? — Logo após insinuar o mesmo que o amiguinho dela? E de sequer deixá-lo falar?
Argh! Por que ele continuava perdendo tempo tentando convencer os outros quando não queriam ouvi-lo?
— É a última vez. — Ele dobrou os nós dos dedos, sentindo a frustração borbulhar dentro de si.
O taxista saiu do carro, para o ajudar a colocar as compras no bagageiro e com os músculos faciais rígidos, Jake forçou um sorriso de agradecimento ao homem. Em seguida, sentou-se ao lado de Erin, taciturno, os ombros tensos. O motorista ligou o rádio para preencher o silêncio ensurdecedor que pairava no automóvel e Jake desviou o olhar para a janela, contemplando a paisagem através dos vidros abaixados.
O sol brilhava na superfície da água, as aves voavam em círculos, grasnando sobre o mar azul… e apesar de Erin estar ao lado dele, a distância entre os dois era tão profunda quanto o oceano que ele observava.
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