Me devolva!

 

Rastros do Passado

Sachiko recuou com o susto, por pouco ela não chutou a coisa que saia do arbusto por instinto.

-Uh...oi?-

A coisa... Na verdade se tratava de uma criança de vestido cor de rosa que parecia estar tão confusa quanto ela. Ambas se encararam até a garotinha finalmente falar.

-Aaaah! Pessoa errada!- Ela apontou o indicador para a mulher mais velha e então tapou a própria boca com as mãos, falando por entre os dedos de forma abafada - Não posso falar com estranhos!- Dizendo isso ela se escondeu de novo dentro do arbusto.

Sachiko sorriu feliz por não a ter chutado.

-Eu ainda estou te vendo, sabia?- Ela provocou, mas a menina continuava agachada no meio das folhas com as duas mãos tampando a própria boca, ignorando-a.

-Vamos, saia daí... As empregadas estão te procurando. – Ela disse se agachando no chão.

-Eu não falo com estranhos!- A criança repetiu com as duas mãos na boca, Sachiko respirou fundo procurando por paciência para continuar com essa conversa quando uma das empregadas uniformizadas que estava passando por ali a viu agachada no quintal.

-Murakami san? O que a senhorita esta faz...?- Então a empregada viu que ela estava próxima à criança e tomou um susto. – Aiko sama!!! – A empregada foi correndo em direção as duas.

- Ai está você!- Ela disse recuperando o fôlego com um tom de alivio.

-Hm!- A criança então levantou os braços, pedindo colo, a empregada sorriu e a retirou do arbusto. –Olhe só para você! Toda suja desse jeito com seu vestido novo... –

-Estranha!- A criança disse enquanto apontou pra Sachiko.

-Quem é a pirralha?-

Foi então que uma voz familiar às interrompeu - A “pirralha”... É minha filha. – Sachiko olhou para traz e se deparou com Naomi, indo em direção as três de salto alto enquanto Sachiko ficou imóvel, sentindo o gosto da gafe.

-Aiko, eu já te falei para não causar problemas para as empregadas do turno da noite. - Ela disse no mesmo tom de voz de sempre, mas acompanhado de um olhar severo para a criança, que sentiu na hora que estava encrencada.

-Mas mamãe... – Aiko disse com os olhos cheios d’água.

-Sem mas, você vai para o quarto.- Naomi disse dando um sinal para a empregada, que se retirou rapidamente levando a criança nos braços.

-Me desculpe por isso, isso não era pra acontecer... - A mulher mais velha suspirou. –Ela não costuma desobedecer assim. Não sei o que deu nela hoje. –

Sachiko ainda perplexa com a situação apenas respondeu nervosamente

-Não, não. Tudo bem... Eu... Acho... -

-Vamos, eu te explico melhor quando chegarmos no meu quarto.-

-Sim senhora... –

Naomi foi à frente, guiando-a pelos corredores da mansão até chegar a seu quarto, chegando lá e fechando a porta, ela começou a desabotoar a camisa da mulher mais nova imediatamente, deixando Sachiko desconcertada.

-Espera... Eu pensei que... - Naomi então a calou, colocando o dedo indicador sob os lábios de Sachiko. – Depois, Murakami san. Agora eu não quero pensar mais em nada, alem de você. Vamos fazer conforme o combinado, sim? Depois coversamos sobre isso. Hoje eu quero passar a noite inteira com você. –

Mesmo se sentindo desconfortável, Sachiko concordou com a cabeça.

-Ótimo. - Naomi sorriu, beijando-a nos lábios.

 

 

 

...

 

 

 

No dia seguinte, sutiãs e roupas estavam espalhados pelo chão do quarto escuro de mármore branco. Sachiko dormia tranquilamente na cama gigante de casal enquanto Naomi acariciava sua cabeça com um sorriso de satisfação, acordando-a gentilmente.

-Bom dia, minha gatinha de rua. –

A noite havia sido intensa, fazendo com que ela dormisse por mais tempo do que o normal para recuperar suas energias. Ainda sonolenta a mulher mais nova acordou lentamente, rolando na direção de Naomi que já estava sentada na cama.

-Hm... Bom dia. -Era a primeira vez que Sachiko havia ficado até o dia seguinte com Naomi em seu quarto, então ela deu uma olhada em volta.

-Quatro meses. - Naomi disse, ainda acariciando os longos cabelos da mulher mais nova- O tempo passa rápido não é?- Ela beijou-a na testa e se levantou da cama, indo nua em direção ao frigobar. – Hoje é um dia de se comemorar. -

-Comemorar o que?- Sachiko disse enquanto esfregava os olhos.

-Ontem minha filha fez quatro anos ao mesmo tempo em que faz quatro meses que você trabalha para mim. Quatro é o meu numero da sorte. – Naomi riu para ela enquanto pegava uma garrafa de vinho. - Não vou deixar essa data passar em branco. Venha beber comigo. –

Sachiko se sentou na cama e se espreguiçou. -Então, eu também ganho presente?- Ela provocou.

-Claro que sim! Afinal, Você também merece uma recompensa. – Naomi disse se aproximando da cama com duas taças de vinho. Ambas brindaram e começaram a beber.

-Eu... Não fazia ideia que você tinha uma filha. – Sachiko admitiu. –Você nunca mencionou nada. -

Naomi apenas deu de ombros e respondeu. – Uma das suas melhores qualidades é não fazer muitas perguntas. -

A mulher mais nova ficou em silencio e depois disse. – E sobre minha recompensa?-

Naomi levantou uma sobrancelha, surpresa. – Oh. Você quer um presente? Normalmente eu não concordaria com isso, mas, considerando que estamos comemorando, pode pedir! –

- Então eu quero que me fale sobre seu marido. O que aconteceu com ele?-

Os olhos de Naomi se tornaram frios, sua postura mudou e ela se levantou da cama novamente.

- Eu... Preferia não tocar nesse assunto, mas, se você insiste... - Ela se levantou e foi procurar um cigarro. – Preste bem atenção que eu vou te falar daquele imprestável apenas uma vez. -

Naomi se sentou na cabeceira e começou a fumar.

-Eu vim de uma família de ricos falidos, para pagar as contas atrasadas meus pais me ofereceram em casamento pro chefe do clan que comandava as coisas por aqui. Eu não tive escolha se não casar com o desgraçado do Takuya, se não eles iriam matar os meus pais. -

Naomi disse com ódio no olhar mas sem alterar o tom de voz ela continuou.

-Eu era jovem e inocente... Apenas ajudava com as finanças, de resto, eu era como uma dona de casa comum, a única diferença era que eu não sabia se meu marido chegaria vivo em casa toda a noite. Eu achava que Takuya era diferente dos outros, que ele me amava, mas depois de pouco tempo eu descobri que ele tinha o costume de sair com varias mulheres... –

 Naomi parou para dar mais uma tragada- Isso obviamente foi um choque. Mas não foi a pior coisa que ele me fez... Depois de um tempo cansada de aturar aquele bêbado. Eu sai para fazer compras e acabei encontrando alguém especial por puro acaso.-

Os olhos de Naomi começaram a brilhar a partir desse ponto. Sachiko não sabia dizer se de raiva ou por outro motivo.

-Ela era alta, parecia com você. O que começou como uma tentativa de dar o troco no meu marido acabou se tornando algo a mais e... Mantivemos um caso por dois anos sem aquele idiota notar, mas quando ele notou, tudo veio abaixo da pior forma possivel. –

Naomi franziu a testa com desgosto ao mesmo tempo em que bateu com o punho na cabeceira.

-Ela morreu com 15 tiros na minha frente. E eu não pude fazer nada. –

Sachiko a olhou com pena, sem saber que palavras usar para conforta-la.

-Não me olhe assim... No fim, ele teve o que merecia. Depois desse ponto eu não conseguia nem mais olhar pra ele. –

-Então o que falaram sobre você era verdade?-

Naomi sorriu maliciosamente- Bem... Dizem muitas coisas sobre mim por ai, mas nem todas são verdade. Mas se você quer saber, eu achei bastante engraçado o fato de ele ter morrido afogado. Encontraram o corpo dele cheio de buracos em um rio, se me lembro bem foi no dia que eu descobri minha gravidez do desgraçado. –

-Eu sinto muito. - Sachiko disse. - ...Eu não imaginava que você havia passado por tudo isso. –

-Tudo bem. Não é como se eu estivesse contando algo que ninguem sabe.- Naomi suspirou e deu de ombros. 

- Espero ter saciado sua curiosidade.-