Souta olhava para o chão do corredor.  

O brilho das tochas dançava nas pedras frias do castelo.  

Punhos cerrados.  

Marcados pelo esforço inútil de enfrentar dois goblins.  

Seu orgulho estava tão ferido quanto o corpo.

Os cochichos dos outros heróis ecoavam em sua mente:  

*“Ele sequer deveria estar aqui…”*  

*“Sem sistema, ele é só um peso.”*

Perdido nos próprios pensamentos, não percebeu a aproximação.  

Gabriel Gaiden.  

O Herói da Espada.  

Presença imponente.  

Olhar firme, mas sem julgamento.

— Souta, podemos conversar?

A voz era calma.  

Mas carregava autoridade.

Souta soltou um riso sarcástico.  

— Claro, por que não?  

— Afinal, não tenho outra coisa pra fazer além de limpar armaduras e quase morrer.

Gabriel não respondeu.  

Fez apenas um gesto.  

Souta o seguiu, relutante.  

Sentia os olhares em suas costas.

Chegaram a uma sala afastada.  

Silêncio.  

Gabriel fechou a porta.

Encostou-se à mesa de madeira.  

— O que você fez hoje foi loucura.  

— Poderia ter morrido enfrentando aqueles goblins.

Souta cruzou os braços.  

Sarcasmo ainda queimando.

— Bem, obrigado por salvar minha pele.  

— Posso te pagar com uma sessão extra de limpeza?

Gabriel interrompeu.  

Tom firme, sem agressividade.

— Não estou aqui pra te desprezar.  

— Mas também não posso te reconhecer como herói.  

— Não ainda.  

— Você está sem sistema, Souta.  

— Isso te coloca em desvantagem.  

— E eu não quero que você morra.

Souta desviou o olhar.  

As sombras das tochas dançavam na parede.  

Havia algo dolorosamente honesto nas palavras de Gabriel.

Após um longo silêncio, murmurou:

— E o que você quer que eu faça?  

— Que me esconda atrás dos outros?  

— Que fuja enquanto vocês lutam?

Gabriel suspirou.  

Expressão suave, mas resoluta.

— Sim, se for necessário.  

— É melhor se esconder e sobreviver do que morrer e ser esquecido.

Fez uma pausa.  

Parecia escolher bem as próximas palavras.

— Você parece ser uma pessoa boa.  

— Mas bondade não basta pra enfrentar o Rei Demônio.

Souta apertou os punhos.  

— Fácil pra você falar.  

— Você tem tudo.  

— Poder, habilidade… até essa maldita armadura dourada.

Gabriel balançou a cabeça.

— Você acha que minha vida é perfeita?  

— Perdi meus pais aos 12.  

— Não tenho família no meu mundo.  

— Tudo o que me resta… é essa missão.

A voz suavizou.

— Eu sei como é carregar um vazio.  

— Mas você ainda está aqui.  

— Ainda pode encontrar algo pelo qual lutar.  

— Mesmo que leve tempo.

Souta ficou quieto.  

As palavras do Herói da Espada carregavam uma verdade desconfortável.

Gabriel se virou para sair.  

Antes de fechar a porta, lançou um último olhar:

— Pensa nisso, Souta.  

— Não tenha vergonha de se esconder ou fugir, se for necessário.  

— A vergonha está em desperdiçar uma chance de sobreviver.

A porta se fechou.  

Souta suspirou.  

Sério.  

Mas não resistiu ao comentário:

— Então… o Herói da Espada também tem cicatrizes.

E pela primeira vez, sentiu algo estranho.  

Não era vergonha.  

Era uma semente.  

Pequena.  

De determinação.