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Fatalismo - Livro Um - A Era Dos Lobos

Capítulo 04

Capítulo 04

Jan 25, 2023

― É assim que você o quer amarrado, pai?
― Pode afrouxar um pouco essa fivela no braço dele, caso contrário será difícil de a dose ministrada circular melhor no sangue. Você bloqueou os acessos de ar vindos de fora? Está muito frio nesta sala, Henrico.

O braço afivelado treme e tenta se mover bruscamente ao ser tocado e manejado pelo que parece ser uma mão pesada.

― Calma! Eu só estou tentando ajudar. As janelas já estão bloqueadas, pai, mas como viemos às pressas para a sala de operação, deve levar um tempo até o equalizador climático estabilizar a temperatura.

O corpo ensanguentado na maca se debate, gritos ecoam.

― Ele não te ouvirá, Henrico, preste atenção aos sintomas enquanto me preparo aqui, que leitura você me dá?
― Eu vejo lesões e lacerações no abdômen, face e membros inferiores. Ele apresenta muita dor e perdeu muito sangue.
― Sim, filho, isso é o óbvio que vemos. Diga-me mais do que isso, eu quero todos os indícios de intoxicação dele. 

Ele está parado diante do corpo, seus olhos começam a brilhar, um som começa a ser emitido e ecoa em volume baixo e constante, assemelhando-se a uma frequência sonora de rádio.

― Apesar das manchas de sangue que cobrem sessenta por cento do corpo, nota-se úlceras decorrentes de alguma infecção ou edema. Possível consequência do envenenamento, que colapsou o sistema imunológico dele, dificultando a cicatrização da derme.

― Muito bom, Rico, mais o quê?

Enquanto um homem continua de costas manuseando papéis e ferramentas cirúrgicas, a pessoa na maca libera outro grito de dor alto e furioso.

― Pai! Ele está fazendo muito barulho, assim a nossa localização pode ficar comprometida.
― Tudo bem, está ocorrendo uma chuva ácida muito intensa lá fora, possivelmente não terá pessoas nem infratores circulando pelos arredores, estão escondidos, se abrigando. Por garantia, me faça um favor, administre essa dose de sedativo para ele, será necessário para o procedimento de hoje.

Uma mão pesada de metal é esticada até a ampola segurada pelo homem.

― Não me diga que você terminou o seu relatório, filho, me diga mais, finalize. Enquanto manipula o sedativo, retorna a falar.
― Além das úlceras, pode-se notar que o paciente está com dificuldade de verbalizar o que sente. Parte disso em decorrência da dor sentida pelos ferimentos, mas também de um possível estágio inicial de degeneração do córtex, área de broca, ocasionada pelo veneno. O paciente também apresenta alto nível de desidratação.
― O soro já está sendo finalizado filho, não se esqueça dos sintomas mais comuns que lhe falei.

Apoiado em uma bengala de madeira, o homem se aproxima da maca e se posiciona próximo às suas ferramentas. 

Ele veste calças largas cuja bainha quase arrasta no chão. Seus pés estão protegidos apenas por duas meias grossas e sujas, e está calçando um par de chinelos desgastados, semelhantes a uma pantufa. Apesar do vapor de sua respiração indicar que o ambiente está frio, ele retira o manto que lhe cobria, colocando-o numa cadeira quebrada próxima.

É difícil fazer movimentos delicados e ser ágil com o corpo muito coberto. O ambiente é mal iluminado, com poucas luzes direcionadas onde estão.

Pela incidência da luz é possível notar rugas de expressão de idade em seu rosto.

― O senhor me ensinou que, se os olhos estiverem totalmente vermelhos, é sinal de que o indivíduo está alcançando o estágio máximo de intoxicação.
― Os dele estão?
― Não estão, pai, apesar dos indícios de pequenos vasos rompidos na retina.
― Pois bem. Por favor, Rico já terminou de preparar o ambiente para nós? Eu também vou precisar que você separe uma bandeja de coleta, há indícios de cálculos se formando em pontos específicos do corpo dele.
― É seguro removê-los mesmo que ele já tenha perdido sangue pelos ferimentos?
― Esses cálculos são resquícios dessa merda de droga que esse povo toma. Quanto mais eles se espalharem e aumentarem de tamanho, pior é para o corpo. Ele manuseia um alicate no ponto onde abrira um corte com o bisturi. Dura poucos segundos, e com leves movimentos, retira de dentro do abdômen do paciente, um cálculo do tamanho de um botão, muito semelhante a uma pedra rara, lustrosa e azulada.
― Eu tentarei ser rápido e retirar apenas as que apresentam perigo para o estado atual do corpo, as pedras restantes podem ser dissolvidas com a medicação que aplicaremos a longo prazo nele.

Já é de noite. O ambiente muito escuro se torna iluminado apropriadamente na direção em que está a maca. Ele retira mais uma, duas, até quatro pedras semelhantes à anterior de dentro do corpo. Um antigo aparelho de rádio é ligado pelo ajudante. A única estação sintonizada é a oficial da nação onde é transmitido o noticiário.

― Eu não sei por que você gosta de ouvi-los, pai.
― Há muita coisa nesse mundo além do que gostamos de fazer, Henrico.
― O senhor quer dizer que não gosta do que falam, mas quer sempre ouvi-los?
― Filho, você acha que a população gosta de viver como vivem?
― Mas, pai, eles o exilaram.
― Corrigindo, Rico, para eles eu já fui dado como morto. Por favor, me passe aquele material de primeiros socorros. ― Diz, enquanto manuseia o indivíduo na maca, finalizando alguns pontos e se preparando para limpar os ferimentos restantes.
― Eu não ouço essa transmissão porque gosto, mas porque preciso. Nossas vidas têm de estar sintonizadas às deles, gostando ou não. Elas se cruzam de alguma forma e estamos sempre nos afetando.
― Precisa de ajuda para suturar esse ferimento aqui?
― Sim, meu filho, obrigado. Eu sei que o ser humano pode ser confuso para você às vezes, Henrico, mas tente acompanhar o meu raciocínio.

O homem que operava então deixa de lado as ferramentas que acabara de usar e, enquanto verifica alguns dos sinais vitais na pessoa acamada, continua sua fala, dirigindo as palavras para seu ajudante.

― Fazer apenas o que se quer pode ser interpretado como amor próprio, assim como não fazer algo necessário para o outro, somente porque não gosta, é julgado como egoísmo. No âmbito das possibilidades de ações humanas, nós temos “quero fazer”, “posso fazer”, “devo fazer”, “preciso fazer”, “não quero fazer”, “não posso fazer”, “não devo fazer” e “não preciso fazer”. No dia a dia, o ser humano às vezes usa essas palavras como se tivessem o mesmo significado, mas não têm.
― Acho que estou entendendo. Então a minha pergunta do porquê você os ouve, mesmo não gostando, está dentro de uma dessas possibilidades?
― Sim, filho. Eu não gosto de ouvir, mas eu quero que essa merda continue tocando no rádio porque eu preciso. No meu lugar, o que você faria se esse rapaz na maca fosse um lobo?
― O que eu aprendi sobre a Alcateia faz com que eu não os aprove, mas mesmo não gostando deles, se é uma vida que precisa ser salva, eu me sentiria no dever de ajudar.
― Pois é, aparentemente seguros e escondidos aqui, nós ainda podemos ouvir o que os inimigos fazem. Eu não gosto dos valores deles, porém devo saber quais são, como agem e pensam. Eu ouço rotineiramente esse rádio porque ainda quero fazer algo contra aqueles que falam por intermédio dele. É meu dever, dentro das minhas possibilidades, continuar agindo por quem precisa. Esse rapaz praticamente caiu ou foi jogado quase morto à nossa porta, ele é alguém que precisa.

O senhor se afastou da maca, retirou as luvas ensanguentadas e pegou um pequeno gravador, próximo à bancada.

― Aqui é o doutor Eric Lopes falando, e dando início ao procedimento teste de número 187, primeiro relatório: paciente do sexo masculino, aparentemente jovem, chegou ao meu laboratório apresentando sintomas de escala três de envenenamento por MG.N.8 e marcas acentuadas de violência física e sexual pelo corpo. Os edemas e lacerações decorrentes de uma possível agressão ocasionaram uma forte hemorragia que desestabiliza e dificulta o processo de aplicação do remédio teste, que deverá ocorrer em frações, para evitar possível colapso nas taxas de anticorpos e níveis metabólicos. Apesar da perda de sangue pregressa, o quadro de hemorragia foi contido e o paciente permanecerá sedado por um longo período, em observação, enquanto recebe a aplicação do remédio teste. Além dos procedimentos cirúrgicos e de primeiros socorros, também foram retirados do paciente cálculos residuais da droga conhecida como Bluebird. A permanência desses cálculos no organismo poderia dificultar a reação do sistema imunológico ao tratamento proposto. Acreditamos que os sintomas de intoxicação de escala três apenas se manifestaram devido ao quadro de baixa imunidade e hemorragia consequente dos ferimentos pelo corpo. O único pertence material do paciente é a roupa do corpo, que aparenta ser de algum uniforme escolar. Ele foi encontrado sem lente de registro ou qualquer outro meio de identificação e comprovação de documentos. Esse foi o primeiro relatório do experimento 187, desligando.

O médico desliga o gravador, pega um pano próximo às ferramentas para secar o suor da testa, fortemente iluminada pela luz focal.

― Agora só nos resta esperar, Henrico. Será que dessa vez conseguimos?
― Seguindo os protocolos de avaliação, averiguando no meu banco de dados as informações a respeito dos sintomas mais comuns e confrontando esses dados com o que foi atestado hoje, há um prognóstico positivo, assim como o sangue dele também indicou um nível de desintoxicação da droga, não apresentando a coloração roxa decorrente do consumo. Ele está limpo, há chance de cura, pai.
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