Ashi se aprofundou nas entranhas da floresta com passos silenciosos, ela seguia seus ouvidos sensíveis, em direção a um som que a deixou inquieta. Era como uma leve marcha, pisoteando a grama e as folhas no chão. Ela seguiu o instinto e decidiu resolver esse problema sozinha, deixando pra trás Sentoki, escondido entre as raízes de uma árvore. A cada passo os sons aumentavam, e logo Ashi se viu na entrada de um grande declive, onde as árvores não cresciam mais, o lugar se parecia com um salão a céu aberto. Nesse declive encontrou a origem do barulho que escutara, cerca de quinze goblins estavam amontoados no lugar, comendo alguns coelhos azarados e discutindo, ela decidiu ouvir a conversa deles, enquanto se mantinha escondida na sombra das árvores. 

- Malditos, é o que eu digo, malditos! - Grunhia um deles, furioso - Isso não teria acontecido se estivessem de vigia!

- Chefe não se irrite - chorava outro - Nós vimos a mulher vir nessa direção, acompanhada do nosso prisioneiro, eles escaparam e mataram nossos irmãos, mas vamos encontrá-los ainda hoje...

- Certo, porque se não encontrarmos, vou matar todos vocês! 

Ashi percebeu que conversavam sobre ela, “malditos, então alguns deles conseguiram sobreviver ao meu ataque” ela pensou. Fez uma análise visual, tentando ver como poderia enfrentar todos eles, apesar de serem muitos, ela tinha o fator surpresa e sua habilidade de Hi Ken. Focou sua energia por alguns segundos e então estava preparada pra usar suas habilidades, preparou-se para dar um salto no meio do declive, sentia a energia natural da alma fluir pelo seu corpo, energia usada pelos monges para desferir golpes superpoderosos. Mas antes que pudesse dar seu salto, foi agarrada pelos ombros por mãos enormes, sua mente congelou e ela tentou desferir algum golpe no monstro que a pegou, mas foi pega de surpresa e perdeu a concentração. As grandes mãos ergueram o corpo de Ashi e então ela gemeu de dor ao sentir o forte aperto em seus ombros, em seguida ela se viu no ar, pois foi lançada em direção ao declive, caindo no meio dos goblins e assustando todos eles, muitos gritos e xingamentos foram lançados. Ashi teve dificuldade de se levantar devido a dor que sentia no corpo, mas conseguiu, e então se viu rodeada por goblins, mas estava preparada pro combate. Da sombra das árvores saiu um grande vulto de um homem, de cerca de dois metros de altura, quando a luz da lua iluminou sua silhueta, Ashi percebeu que era um orc, monstros das trevas, verdes como goblins, porém muito mais altos, fortes e perigosos. Ele vestia apenas panos velhos e imundos, e carregava amarrado na cintura um tipo de martelo primitivo feito de madeira e pedra. Todos permaneceram imóveis, os goblins pareciam ter medo do grande orc tanto quanto a ninfa, e o monstro tinha noção disso. Ele deu um passo à frente, e Ashi começou a sentir um terror descomunal, tentou se focar apesar da dificuldade. 

- Quem é você? - Perguntou o orc com uma voz bestial, Ashi se manteve em silêncio. 

- Vou repetir. Quem é você? - Perguntou novamente, dessa vez sua mão tocou no martelo de combate em sua cintura, e prevendo a atitude violenta a garota respondeu. 

- Sou Ashi Totsuzenshi, filha de Raimugi, ancião e mestre da vila Chui. 

- E então, pequenos, foi ela? - O orc mudou o foco e agora perguntava aos goblins 

- Sim ó grande mestre Khantug – disseram os goblins, em coro. 

- Senhora Totsuzenshi - O orc voltou sua atenção pra jovem. - Vou lhe dizer o que está acontecendo aqui, esses pequeninos compraram meus serviços, pediram que eu os ajudasse a vingar alguns pequenos da família deles que a senhora matou a sangue frio, entenda é claro que isso não é pessoal, e se dependesse de mim não mataria uma mulher tão bela quanto a senhora, claro eu teria usos melhores pra uma mulher como você. - Ele abriu um sorriso imundo e Ashi sentiu nojo daquele rosto asqueroso e doentio. - Mas como as coisas são, terei que fazer meu serviço. - Ele puxou o martelo de guerra da cintura e então balançou ele algumas vezes.

Ele começou a se aproximar, dando passos lentos, e então Ashi usou a oportunidade pra usar suas habilidades de Hi Ken. Com um movimento rápido e preciso sua perna acertou em cheio a cabeça de um goblin próximo, em seguida deu um salto enquanto girava, sua perna acertou mais três, e todos os acertados por seus golpes caíram, sem vida. Todos os goblins saltaram em cima dela, todos com porretes ou adagas, ela acertou um por um, parecia estar em um estado de frenesi, com sua velocidade e força ampliadas, desviou de todos os golpes e acertou uma combinação de chutes, derrubando mais oito goblins. Os quatro goblins sobreviventes começaram a se afastar, assustados, e o orc ficou paralisado enquanto assistia a tudo. Ashi deu um chute direto, no ar, e a energia do seu corpo foi disparada, como um golpe invisível em direção a cabeça de um dos goblins restantes, que explodiu em sangue verde. 

- E-Ela é uma bruxa! Fujam! - Gritou um dos goblins, e então os três sobreviventes correram, entrando novamente na floresta e desaparecendo na escuridão. 

- Bravo, oh bravo! - Disse o orc, batendo palmas – Agora que os pequenos foram embora posso te fazer uma proposta, se ainda quiser viver permito que se torne minha esposa! - Ele sorriu e estendeu a mão, e então num piscar de olhos Ashi saltou até os pés do monstro e deu um chute alto, fazendo um corte perfeito e lançando a mão decapitada do orc pra longe e fazendo seu sangue verde jorrar. 

- Argh! Sua Maldita! - Ele deu um golpe com o martelo, que Ashi desviou, mas antes que pudesse reagir o orc acertou um golpe com o pulso da mão decepada na sua cara, lançando-a no chão. - Você acha que pode derrotar o grandioso Khantug? Esse é seu fim, e vou começar com suas pernas perigosas. - Com um balanço rápido ele acertou a perna esquerda da jovem no chão, e um som alto de ossos quebrando pode ser ouvido. 

- Argh! - Ashi gritou de dor - Seu verme, você vai morrer! 

- Calada, isso é pela minha mão. Morra! 

Os três goblins corriam pela floresta, em direção ao Sul, fugiam da bruxa que acabaram de ver dizimar o resto de seus irmãos, apesar dessas criaturas serem imundas ainda tinham amor à própria vida. Não conseguiam raciocinar direito e nem tinham motivo pra isso, apenas esperavam que o orc lá atrás pudesse segurar a mulher demônio o suficiente pra que fugissem de lá. Correram e correram, e então o goblin que estava na frente esbarrou em algo na escuridão enquanto olhava pra trás, ele se levantou rapidamente e deu de cara com um jovem humano muito furioso, que carregava na mão um bastão curto. Era Sentoki, que despertou e saiu a procura de Ashi. O goblin à sua frente mal teve tempo de reagir e então sentiu o impacto do bastão em sua cabeça dura, seguido de um chute na cara. Ele saiu voando e caiu inconsciente na grama, e então os outros se prepararam pra lutar. 

- Tch é aquele humano imundo que nossos irmãos capturaram - Disse um dos goblins - Vamos matá-lo aqui e agora, ele é fraco.

- Fraco é? - Sentoki sorriu – Venham então!

Ambos os goblins pularam pra cima de Sentoki, prontos para golpear ele até a morte, mas o jovem desviou facilmente da investida. Ele puxou rapidamente da cintura uma corda grossa e chicoteou um dos goblins nas costas, um chiado de dor foi ouvido. 

- Ainda não sei usar esse bastão como arma, mas não é tão difícil usar uma corda de chicote! - E então outra chicotada foi dada, e então o segundo goblin gemeu de dor. - E tomem isso! - E na terceira chicotada ele acertou uma árvore, fazendo o chicote rebater e voltar na própria cara – Argh! Que dor! - Seu rosto ardia com a dor do próprio chicote.

Os goblins saltaram novamente, Sentoki tentou desviar, mas não conseguiu, ambos goblins derrubaram o jovem, e começaram a socar ele e enforcá-lo. O jovem se debatia, mas não conseguia se soltar das mãos imundas dos goblins, tentou acertá-los com o bastão de Dorobou, mas não teve efeito nenhum. Sua visão já estava perdendo o foco e sua vida estava se esvaindo, “como ativo isso, vou morrer!” pensava, “não! Não posso morrer agora!”, e então num esforço final de desespero ele empunhou o bastão e tentou atacar os goblins com ele, uma luz forte emanou do bastão e então os goblins saltaram pra trás surpresos. Jorravam sangue verde do peito, de um corte terrivelmente profundo, Sentoki se levantou e então viu em sua mão, o pequeno bastão se transformou em uma das lâminas curtas que os goblins usaram para torturá-lo na caverna. Saltou como um lince e terminou de matar os dois goblins, dando golpes precisos com sua nova lâmina, então respirou aliviado depois de tê-los matado. 

- Ufa... Finalmente esse maldito bastão funcionou, agora não consigo desativar... - Tentou mexer na lâmina e vê-la de ângulos diferentes, mas nada mudou. - Tenho que encontrar a Ashi... - E então ele voltou a caminhar pela floresta escura, sem rumo, em busca da sua companheira. 

O grande Orc ria enquanto erguia a jovem Ashi pelo pescoço, o monstro sentia prazer em fazer os outros sofrerem. A ninfa já se encontrava a beira de perder os sentidos, pois o orc havia quebrado suas duas pernas e seus braços, não tinha mais forças pra sequer gritar. 

- O que foi menina? O gato comeu sua língua? - O orc sorria, mostrando os dentes podres e amarelados, e expelindo um bafo imundo e seboso. - Parece que mal tem força pra chorar ou gritar de dor, então vou terminar de brincar e matar você logo, heheheh...  

Enquanto o monstro estava prestes a apertar o pescoço da jovem e acabar com sua agonia, alguém ouviu os barulhos, Sentoki, surgiu da floresta por trás do orc, saltou sem pensar duas vezes e fez um enorme corte nas costas do monstro, que berrando de dor, largou Ashi no chão e se virou pra encarar seu atacante. 

- Ah! Quem é você? Seu porco imundo! - O orc rugiu furioso e empunhou seu martelo de guerra. 

- Tsc, você a machucou bastante... Primeiro vou matar você! - E então ele correu em direção ao monstro raivoso, que já se preparava pra acertá-lo com o martelo. 

- Morra! Palma do trovão negro! - O monstro balançou o martelo e acertou em cheio nas costelas de Sentoki, uma luz forte iluminou a área e um som ensurdecedor foi ouvido por toda a floresta, como uma explosão dos céus. Sentoki foi lançado no ar e parou quando bateu de costas numa árvore. 

- Ah! - Ele gritou, cuspindo sangue e sentindo dor pelo corpo todo. 

- Agora... - O orc disse, enquanto se aproximava do rapaz – Agora você vai aprender, vou matar você e devorar a carcaça! 

O monstro começou a se aproximar e então chutou Sentoki no estômago. Ergueu seu martelo e estava determinado, concentrando toda sua força num golpe final. 

- Pare! - Uma voz firme e poderosa ordenou o comando, e então o orc congelou todos os músculos. Essa voz era de Ashi, que ainda caída no chão conseguiu focar o suficiente pra usar algum tipo de magia. - Agora... – Disse com dificuldade – Mate-o agora Sentoki... - E então seus olhos fecharam e ela desmaiou. 

Sentoki se ergueu, podia ver que os olhos do monstro ainda se moviam, e de perto, seus músculos pareciam estar tentando se mover, mas uma força inominável o impedia. Ergueu a lâmina e então cortou seu pescoço, arrancando a cabeça do orc de vez, o corpo caiu em seguida, já sem vida, como se a magia que segurava os músculos no lugar tivesse se desfeito. 

Sentoki foi até onde Ashi estava deitada, com dificuldade por causa de alguns ossos quebrados, ela estava inconsciente e muito fraca, mas ainda estava viva. Pegou o último frasco de poção que tinha na sua bolsa, e tentou despejar na boca da ninfa desmaiada. Ela logo abriu os olhos, não sentia mais dores, mas estava  extremamente exausta, ele bebeu as poucas gotas que sobraram do frasco e sentiu-se melhor das dores no corpo também. 

- Sen... Sentoki... - Ela acordou e percebeu que estava com a cabeça apoiada no colo dele, logo ficou corada e se levantou – Ora, mas o que é isso? 

- Conseguimos – Ele sorriu – Vencemos os monstros heheh. 

- Entendo... E vejo que você aprendeu a usar a magia do seu bastão. 

- Sim, não sei bem como fiz isso, mas agora tenho uma boa arma. 

- Acho melhor irmos andando, evitamos um perigo complicado e talvez outros monstros surjam aqui depois dessa barulheira.

- Vamos! - E então ele se levantou. 

Ambos estavam cansados e com vontade de dormir, mas continuaram pela floresta por mais alguns quilômetros Norte. Sentoki não conseguia parar de pensar na noite turbulenta que tiveram, mas não compartilharam mais palavras enquanto durou o escuro da noite. Alcançaram o fim da floresta dando pro Norte e então viram ao longe um pequeno vilarejo, menor ainda que a vila Chui. Segundo Ashi disse mais tarde, aquele era um vilarejo abandonado, chamado de vila Barhum, o local foi abandonado devido ao aumento de ataques de goblins nos últimos anos, mas como atualmente não tem mais ninguém na vila, os goblins não tem motivo pra atacar, e o lugar se tornou um ponto seguro pra viajantes descansarem. Ambos seguiram em frente e então entraram em uma das primeiras casas na vila, elas eram todas feitas de tijolos, bem simples e tinham um aspecto abandonado. Deitaram-se no chão limpo e dormiram assim mesmo. Sentoki não teve dificuldade pra dormir, mas Ashi teve dificuldades, sentia a respiração pesada, um cansaço mental, e insegurança sobre a jornada a sua frente e o que ela teria de enfrentar.