Luzes deslumbrantes, as tonalidades de azul descaradamente cobrindo as cores avermelhadas esparsas, o violeta violentamente estapeando a íris dos espectadores e o rosa lutando com o azul.

Os cheiros de suor salgado, do perfume doce enjoativo e dos cigarros combinados com o ácido das bebidas alcóolicas pairavam no ar como nuvem densa e entorpecente.

A conversa interminável foi abafada por uma música hipnotizante que começou a tocar, enfeitiçando qualquer ouvinte a balançar o corpo involuntariamente. Quando a primeira batida tocou, as luzes, antes cada qual com sua harmonia própria, resolveram conversar entre elas e a seguir o ritmo da melodia alta.

A plateia foi virando-se para o palco, onde as cortinas se abriram lentamente, revelando a dançarina da noite.

A dançarina caminhou até o meio do palco, seguindo as curvas que as notas faziam na partitura invisível. Ela vestia uma fantasia sensual e deslumbrante de coelhinha e quando a multidão viu a artista, palmas, gritos, assobios e palavrões se misturaram à música alta.

Ela era extraordinária.

Dançando e seguindo alegremente a música, ela fazia as pessoas arrepiarem com seus movimentos ousados, esticando as pernas e curvando as costas em posições provocantes. Seu suor quente e salgado escorria pelo seu rosto e corpo. Aquela estrela da noite não era tímida e seu brilho era mais forte do que o sol.

Ela adorava o palco e dava seu sangue, suor e lágrimas.

– O show foi um arraso! – um elfo bateu palmas, seguido por mais mulheres que também aplaudiram alegremente a pessoa que acabou de entrar na sala.

– Não é mesmo chefe?! Oh, ensina a gente a dobrar assim!! – uma mulher de cabelos azuis fitou a estrela da noite com olhos brilhantes e ávidos.

– Dê espaço pra ele, Meeva – uma mulher alta de fantasia rosa de látex disse – Você arrasou hoje, hein – sorriu e fitou a dançarina.

A dançarina tirou a peruca que parecia arrancar seu couro cabeludo e sorriu descontraidamente.

– Obrigado Talia – sorriu mais um pouco e colocou a peruca na mesa – É uma pena que talvez seja meu último ano aqui.

Por mais que seus cabelos verdes acinzentados estavam dentro da touca de proteção, eles estavam tão suados quanto a peruca. Suas bochechas também estavam tão coradas quanto o rosa de sua fantasia e até seu batom parecia ter visto aplicações melhores.

– É realmente uma pena, porque você tá indo muito bem – Talia encostou-se na cadeira mais próxima e cruzou os braços – Você pega geral, então acho que vamos ter mais trabalho daqui em diante... ah, antes de cê ir, ensina seus charmes e tal, né, Younri?

– Já chega, Talia – o elfo chamado Younri riu baixinho e abriu seu leque – Mine, querido, vá terminar de se limpar e vamos conversar depois – abanou o leque e Mine assentiu.

Talia riu e afagou a cabeça de Mine antes de ir terminar sua maquiagem. Younri, por sua vez, foi monitorar o restante das prostitutas, principalmente as mais jovens que chegaram recentemente como Meeva.

O camarim era bastante espaçoso. Tinha uma cama dobrável e três sofás almofadados. As penteadeiras estavam abarrotadas de estojos de maquiagem etiquetados, todos impecavelmente arrumados. Atrás da porta, cerca de seis mochilas das mais diversas cores e modelos estavam no chão. Nas paredes havia seis armários (estilo colegial), abarrotados de pertences pessoais das prostitutas que ali trabalhavam.

Mine tinha acabado de limpar o rosto com o demaquilante em lenços e seu chefe se aproximou com um copo de água em mãos e um sorriso sereno no rosto.

– Obrigado Younri – Mine sorriu e bebeu um pouco da água – Sobre o que você queria falar comigo?

– Que você deveria ter mais cuidado com certas pessoas da plateia. Um quase te levou à força hoje! – Younri sentou-se no banquinho mais próximo – Além disso, você precisa descansar! Já!

– Ok chefe... – Mine riu e levantou-se – Ah, e hoje não vou fazer extras, não se preocupe.

Antes que Mine pudesse dar mais detalhes, Younri lhe deu um tapa em sua bunda.

– É bom mesmo! – Younri bufou e abriu o leque dramaticamente – Bom, já que as meninas não precisam de mim... vou para o bar – sorriu e afagou a cabeça de Mine.

– Vamos, Vanessa – uma mulher ruiva e deslumbrante suspirou e chamou a sua parceira, que veio o mais rápido que pôde – Vejo vocês mais tarde~

– Tomem cuidado e bom trabalho! – Mine e Younri acenaram.

– E bora pra casa meninas – Talia chamou o restante do grupo, que já foi pegando cada qual sua respectiva mochila – Mine, a gostosa vem hoje, né?

– Sim, ela vem sim – Mine sorriu e rapidamente verificou seu telefone.

– Tudo bem. Se acontecer alguma coisa, liga pra gente ganhar um dinheiro extra – Talia piscou e o grupo deixou Mine sozinho no quarto espaçoso.

Mine soltou seus cabelos da touca e massageou o couro cabeludo já cansado da pressão da peruca. O cansaço começou a percorrer por todo o seu corpo, entorpecendo suas pernas e braços, mas ele precisava se manter firme! Ele estava cansado e talvez cansado demais para voltar para casa.

Antes de deitar-se no sofá para descansar, Mine ouviu um barulho alto vindo de fora do camarim. Era como se alguém tivesse tropeçado várias vezes e quase caído e então essa tal pessoa abriu a porta quase a arrancando.

– MINE!! TÔ ATRASADA?!! – a mulher perguntou, coberta de suor.

– Nah, você chegou bem na hora, Lydia – Mine riu e pegou uma das cadeiras para a mulher – Vem, sente-se aqui. Vou te ajudar com a sua maquiagem.

– Ó céus, quase estraguei tudo hoje! – Lydia despencou na cadeira oferecida por Mine – Eu tava dormindo tão bem depois da aula... quando Younri me ligou. Só deu tempo de tomar banho.

– Amiga, seu show não era um pouco mais tarde hoje? Então não esquenta – Mine pegou um lenço umedecido – Você vai fazer extras hoje? – deslizou o lencinho no rosto de Lydia, limpando o pouco do suor que ainda restava.

– Nah, hoje estou de boa. É muito cansativo – Lydia reclamou e bebeu um pouco da água da garrafinha que trouxe – Você também deveria parar com os extras, cê tem trabalhado muito – recomendou, dando um tapa na bunda de Mine.

Apesar de resmungar, Mine sabia que Lydia estava certa.

Ele tinha que cuidar dos trabalhos da Universidade e do Pub e, mesmo que ele gostasse dos shows, no dia seguinte suas pernas desaprendiam a andar de tanta cãibra independentemente do quanto ele se alongava antes dos shows. Na pior das hipóteses, ele desmaiaria repentinamente em qualquer lugar.

Ele adorava o palco e precisava do dinheiro. Apesar da sensação de liberdade, Mine sempre se lembrava que ele ainda tinha correntes que o prendiam das quais não cabem ser ditas aqui ainda, já que ele quase que passou a sombra errada nos olhos de Lydia.

Foco, ele precisava de foco.

– Ei Mine, cê lembra de quando a gente se conheceu aqui pela primeira vez? – Lydia sentiu-se nostálgica enquanto observava os quadros pendurados no camarim.

Mine riu e deu algumas batidinhas com a esponjinha de maquiagem nas bochechas de Lydia, uniformizando a base.

– Lógico que lembro, você tentou fugir de mim na universidade!

– Então... a Sra. Lydia vai só fazer pole dance hoje, né? – Younri apareceu, carregando uma bandeja de lanches.

– Sim, chefe! – Lydia sorriu e as mãos já miraram na bandeja assim como Mine – Obrigada chefinho, isso aqui tá uma delícia!

– Vocês dois são realmente uma figura – Younri riu baixinho – Vou deixar isso aqui pra vocês e vou voltar para o bar. Se precisarem de alguma coisa, me liguem – sorriu e acenou para a dupla.

A noite passava lentamente enquanto o pole dance fervia lá fora.

Mine ainda estava descansando no camarim. Ele tirou uma bela soneca de alguns bons minutos depois do banho enquanto Lydia foi para o palco suar até a alma! Antes de ir verificar as horas em seu celular, percebeu que algumas mensagens tinham acabado de chegar. Quando ele foi verificar quem que estava mandando mensagens naquele horário, Mine rolou para o lado da cama e quase caiu dela ao ver que quem estava digitando era ninguém mais, ninguém menos...

... do que Addai.

É. Ele mesmo.

Mine decidiu, sabiamente, ignorar as mensagens, pois não queria lê-las enquanto Addai estivesse online..., mas a curiosidade corrói o ser humano, e isso aconteceu com Mine que, por mais que até se corroesse de curiosidade, se recusou a ver a mensagem.

Mas uma espiadinha na barra de notificações não faz mal, né?

[Addai-Uni - 1:20 a.m.] Você tem tempo amanhã? Eu ainda quero um duelo com você.

– É o quê? Os alvos não foram o suficiente pra você? – Mine resmungou e sentou-se.

[Addai-Uni - 1:21 a.m.] Se você não quiser, tudo bem, mas se você ganhar… vou comprar um docinho pra você (๑˘︶˘๑)

No ponto fraco. Isso era covardia!

Mine afundou a cabeça no travesseiro e suspirou profundamente antes de encarar as mensagens. Ele ia ignorar mais um pouco, mas...

[Mine - 1:23 a.m.] Tá bom, reserve a arena.

[Addai-Uni - 1:24 a.m.] Oba! Até amanhã então ;)

Mine tinha se prometido de não alongar a conversa.

Ele tinha-

[Mine - 1:25 a.m.] O que você tá fazendo acordado a essa hora?

[Addai-Uni - 1:27 a.m.] Estou vendo algumas coisas antes de dormir, nada demais. *[imagem anexada]*

Mine clicou na imagem anexada e era uma foto da mesa de Addai. Estava cheia de livros, papéis e os óculos de Addai descansando no topo de uma pilha de livros. Ele deu zoom na foto para ver a letra INVEJÁVEL do seu novato antes de responder.

[Mine - 1:30 a.m.] Quem diria que uma cobra seria tão diligente assim.

[Addai-Uni - 1:31 a.m.] Acho que ‘raposa’ combinaria melhor comigo ;)

Mine bufou e pensou por alguns poucos segundos.

É, realmente a raposa combinava melhor.

– Ele é tão...

– ... gostoso – Lydia completou, assustando Mine que quase derrubou seu celular – HAHAHA!!! ASSUSTADO!!

– Não teve graça! – Mine resmungou, de bochechas coradas e o celular no chão.

– Cara... tô morta! E você aí conversando com o novato gostosão a essa hora da noite hein? – Lydia deu um sorrisinho.

– Não é o que você está pensando – Mine sentiu suas bochechas ficarem um pouco mais vermelhas – Agora vai tomar banho, vai! – jogou uma toalha na cara de Lydia.

– Ok~ – Lydia abriu um largo sorriso.

– Lydia, vou ficar na sua casa, tá? Tô muito morto pra ir sozinho pra minha agora e... – Mine parecia um pouco inquieto.

Lydia aproximou-se de Mine e sorriu calorosamente.

– Sem problemas, carinha – ela segurou a mão de Mine e ele assentiu, aliviado.