(Inspirado na música "First Love" por BTS)
Quando se trata de memória, de infância, a primeira coisa que vem a minha mente é o piano marrom. Muito maior que eu, ele ficava no canto da minha sala. Eu sentia que poderia passar horas admirando, e ansiava para tocá-lo. Meus pequenos dedos passavam por todas suas teclas antes de serem realmente tocadas. Era o momento mais feliz do meu dia, aprender as notas e melodias. Lembro que sempre dizia a mamãe que eu me sentia bem quando as notas soavam. Mas eu ainda não sabia o quão importante aquilo era para mim.
Com o tempo, passei a te negligenciar. Quando minha altura já passava a sua, havia muito tempo que eu não te tocava. Eu olhava de longe a poeira acumulando, as teclas brancas que já não brilhavam mais e eu ainda não sabia sua importância. Embora eu me sentisse mal por isso às vezes e parecesse um final, algo em mim, dizia para eu não sentir assim, e aquilo não era o fim, porque nos veríamos novamente. Não importando como ambos estivessem.
A memória daquela criança pequena, tímida, chegando perto do que parecia um piano enorme, aquece minha alma. Eu ainda não sabia, mas foi a sua memória que me manteve aqui por tanto tempo. Pensar em voltar para você foi o que manteve meu coração batendo.
Foi estranho passar minha mão em você de novo após tanto tempo. Foi ainda na adolescência, quando me sentei de frente a você e, sem repulsa, sem medo, nós nos aceitamos de volta. Passei anos longe do grande piano marrom, mas estar com ele novamente, foi como reviver. Uma onda de calor, como um abraço caloroso de um velho amigo.
Quando as notas saiam, faziam eu sentir-me flutuando, mas leve que uma nuvem. Foi nesse momento que percebi que eu jamais te soltaria, jamais te deixaria ir. Eu precisava de você, porque mesmo depois de tudo. Mesmo após te machucar, você ainda estava ali comigo, em todo amanhecer e anoitecer. Quando eu me sentia só, quando eu chorava e até quando ria, era com você que eu estava, era você que me confortava, você que me fazia flutuar e esquecer o mundo cruel ao lado de fora.
Agora, nessa cama de hospital, depois de um acidente, sinto como se tudo tivesse acabado de novo. Os ossos quebrados, do meu corpo, dizem para eu desistir, mas você esteve comigo todas as outras vezes que tentei e parecia abraçar-me, motivando-me a seguir em frente.
Nesse momento minha memória volta para quando te vi pela primeira vez, e como aquilo foi extasiante para mim. Lembro como ficava feliz apenas em te olhar, mesmo de longe, porque você esteve lá mesmo quando te afastei e estive no meu pior.
Estou novamente, no fundo do poço, como quando estive alguns anos atrás e você estava ao meu lado, jamais me soltando. Então não me solte agora para que eu não o faça também, porque prometi não soltar nunca mais.
Aquele piano marrom no canto da minha casa de infância, o mesmo que agora levo comigo para o meu novo lar, foi, e sempre será, tão importante para mim e agora sei disso. Ele mudou minha vida, fez quem eu sou hoje. Esteve comigo nos meus momentos de solidão, nos de tristeza, e nos de felicidade.
O piano marrom no canto da minha nova casa permanece nas minhas memórias, e me mantém aqui, porque ele sempre esteve comigo e vai continuar estando, até o fim, porque esse piano marrom foi meu primeiro amor.
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